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OPINIÃO

A insignificância do nu

Admito. Levei um susto quando soube que a Play Boy vai sair de circulação. E a edição americana deixou de publicar fotos de mulheres despidas. Nocaute. O nu, concluí, após refletir sobre a notícia, não atrai publicidade nem venda. Se pararmos para pensar, durante a ditadura militar, as revistas de nu foram severamente censuradas. Nas capas podiam-se mostrar um seio apenas. Dois, jamais. Imagine a cabeça do sujeito que criou essa regra. Mais tarde, o nu ganhou espaço no Cinema (com os Pornochanchadas, que ao contrário do que dizia a ditadura, são, aos olhos de hoje, extremamente comportadas). A série Magnifica 70 – que foi estrelada pelo ator Paulo César Pereio – mostrou os bastidores das produções cinematográficas da época. Antes não existia photoshop. Era preciso marcar “os defeitos” com caneta. E em seguida um profissional raspava com lâmina, até a foto ficar lisa. Os leitores deveriam babar.

– Nessa idade, e gata – diziam.

– Eu comia – complementavam, no bar.

Mas não estavam perfeitas. Eram os recursos tecnológicos que começavam a despontar.

Hoje, basta um clique para assistir um vídeo de pornografia pesada. Existem sites “especializados” em prostituição. A vida moderna exige que sejamos expostos. Só assim seremos normais. Às vezes, acesso o Instragram e vejo mulheres com 100, 200, 300 curtidas. Reconheço: elas eram lindas. Sensualíssimas. Pareciam terem sidas esculpidas a dedo. Com suas belezas, estão se tornando celebridades da internet. Simples, ora.

Os pais expõem seus filhos, no facebook. Nas fotos, milhares de curtidas e comentários. Depois divulgam para os outros seu sucesso artificial. Não vi nenhum artista ou intelectual com fama nas redes sociais. Peladas, sim. Vi-as bastante. Uma colega de trabalho disse que tem medo de os ladrões levaram seu celular. Eu fitei-a, e falei:

– Querida, antes eles levarem seu celular do que fazerem outra coisa. Celular é só um aparelho.

– Mas eu paguei 1.500 nele.

Ela era linda. Pequenina. Cabelo negro cintilante. Bochecha viva. Voz rouca e suave. Se Deus existe, Ele deve tê-la desenhada com carinho e cuidado.

Parece que é status andar com um dispositivo de mil reais, postando foto do Instagram sexta à noite. Todo mundo quer 15 minutos de fama. As convivências artificias prejudicam as habilidades de comunicação dos adolescentes do século XXI. Eles não sabem como, nem o quê conversar com uma garota. Decerto fiam pensando nas diabólicas cenas que viram nos sites pornográficos, à tarde, enquanto os pais trabalhavam. Por isso o nu virou algo banal. Ninguém consegue deleitar uma imagem de Alessandra Negrini, na Play Boy. Ou uma frase de Bukowski, em Mulheres. A vida moderna não quer criar imagens, fantasias e sonhos. Quer logo o contato carnal. Não há como os pais fiscalizarem o quê os filhos veem na internet. Um adolescente mais esperto que os pais vai descobrir os sites e entrar neles. Simples assim.

Um conhecido, que faz Gestão da Informação, disse que há uma “internet sombria”. Nem tive curiosidade de acessá-la. Se já acho que há muita merda na internet comum, imagine na sombria...

– Disse que há uns negócios sinistro lá. Não entre.

Seguei o conselho.

Daqui uns anos, não terá mais graça ver uma mulher pelada. Ninguém saberá como contemplar. É fato que os censores da ditadura se enganaram. O nu aconteceu – e muito – e a família brasileira continua aí.

A única coisa que me deixa encabulado é por que as pessoas se preocupam com o nu. Gênio foi Nelson Rodrigues, em Toda nudez será castigada. Ele criticou a hipocrisia dos costumes burgueses, que tratam o corpo humano como algo proibido e não prazeroso.

Claro que é.

(Marcus Vinícius Beck, escritor e corintiano)

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