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OPINIÃO

Esperança para quem precisa

A história se repete todos os dias. Na verdade, se multiplica. Por diversão, curiosidade e até mesmo desilusão, alguém se entrega ao perverso mundo das drogas e do álcool. E as consequências são devastadoras. Em função da dependência, que surge rapidamente como no caso do crack (variação mais barata da cocaína), o usuário oscila entre a depressão e a agressividade, chegando a ficar paranóico e podendo até mesmo desenvolver sérios problemas mentais. Perde-se a dignidade, a moral, os valores e o amor por si mesmo e pelo outro.

Quando o consumo chega a um padrão compulsivo, o indivíduo passa a ter graves problemas econômicos, o que o leva a roubar seus familiares, agravando ainda mais os conflitos dentro de casa. O próximo passo todo mundo já conhece. Aliás, está estampado nas ruas das grandes cidades. É impossível circular pelos bairros centrais de Goiânia, por exemplo, sem se deparar com um usuário de droga. Alguns mais se parecem com zumbis, jogados nas calçadas ou vagando pelas ruas, extremamente mal tratados e subnutridos.

O fato é que o crack se tornou uma epidemia, portanto, uma questão de saúde pública. Pesquisa do Lenad (Levantamento Nacional de Álcool e Drogas), realizada em 2012 pela Unifesp, aponta que, no País, mais de dois milhões de pessoas já usaram a droga. Só o Brasil representa 20% do consumo mundial do crack e é o maior mercado do entorpecente no mundo. Hoje, 98% dos municípios brasileiros declaram possuir algum dependente da droga. Isso demonstra que o crack não é uma exclusividade dos grandes centros urbanos. Pelo contrário, marca presença nas cidades do interior e até mesmo nas comunidades indígenas.

Outro recente estudo da Fiocruz revela que 80% dos usuários de crack no País são homens, não brancos (negros ou pardos), sem ensino médio e sem emprego ou renda fixa. Ou seja, em flagrante situação de marginalização social. A pesquisa, realizada com 30 mil pessoas, em 26 capitais, indica ainda que 40% dos usuários estão em situação de rua, 60% são solteiros, e geralmente sem vínculo familiar, com média de 28 anos e que metade já esteve preso. Entre as mulheres, metade tem filhos ou se prostitui.

A situação é angustiante, principalmente para a família do dependente químico, que se sente perdida, adoecida e sem saber a quem recorrer. Aquelas que têm condições financeiras, buscam tratamento para o usuário na rede particular seja por meio de planos de saúde ou via pagamento integral das despesas. Mas e as que não têm recursos? Essas, que representam a maioria, pedem socorro ao Sistema Único de Saúde (SUS), cuja porta de entrada são os Centros de Atenção Psicossocial (Caps), onde é realizado acompanhamento diário dos dependentes com quadro clínico considerado menos grave. Contudo, há apenas 67 unidades espalhadas pelos 246 municípios de Goiás.

Os casos mais graves são encaminhados para clínicas e hospitais da rede conveniada. Mas os leitos de internação são insuficientes para atender a demanda crescente. Calcula-se que Goiás disponha de 1.014 leitos do SUS, porém estes não são exclusivos para usuários de álcool e drogas. A solução para o problema da fila de espera por vagas pode estar nos Centros de Referência e Excelência em Dependência Química (Credeqs), do governo estadual. Contudo, eles ainda não foram entregues.

É nesse cenário que se destaca a atuação das entidades sem fins lucrativos, ligadas ou não a instituições religiosas. A Fazenda da Esperança, por exemplo, faz um trabalho excepcional. Ela oferece tratamento gratuito para dependentes químicos, o qual dura em média um ano. Sua ação se baseia no tripé: convivência em família, trabalho como processo pedagógico e espiritualidade para encontrar um sentido na vida. O projeto, criado pelo missionário Nelson Rosendo Giovanelli (Nelsinho) e Frei Hans Stapel, franciscano de origem alemã, conta hoje com 101 unidades no mundo, sendo 71 no Brasil. Em Goiás, está presente nos municípios de Aurilândia e São Luis de Montes Belos.

Em Redenção, no Pará, a Fazenda da Esperança, inaugurada no final de 2014, também já virou referência. Com capacidade para 20 internos, acolhe pessoas com idade entre 15 e 45 anos que desejam, livremente, se recuperar de drogas, álcool e outros vícios. Os internos realizam várias atividades, dentre elas criação de porcos, galinhas, peixes; além do plantio de milho. A produção de bolos e biscoitos, entre outros produtos, também fazem parte da rotina dos dependentes e voluntários. A produção é vendida para os visitantes da comunidade terapêutica e pelos familiares dos internos.

Entretanto, para que essa oportunidade de reabilitação se tornasse realidade por lá, foi necessário o empenho de outros atores da sociedade. Primeiramente, veio a Buriti Empreendimentos, que acreditou no projeto e doou um terreno de dois alqueires para a implantação da comunidade terapêutica. Já a estrutura foi erguida através de doações e trabalhos voluntários. Essa experiência sinaliza que, com boa vontade, podemos contribuir no combate às drogas e na recuperação dos dependentes. Se cada um fizer a sua parte, sem jogo de “empurra-empurra”, é possível sim oferecer esperança para quem precisa. Afinal de contas, essa responsabilidade é de todos nós!

(Moisés Carvalho Pereira é diretor da Buriti Empreendimentos)

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