Os primeiros habitantes do Brasil
Diário da Manhã
Publicado em 17 de abril de 2016 às 02:23 | Atualizado há 9 anos“São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.” (Caput do artigo 231 da Constituição)
É tradição nas escolas comemorar o “Dia do Índio” todo dia 19 de abril. Mas você já parou pra se perguntar o porquê da data? A ideia é simples: preservar a memória das diversas tribos indígenas que já viveram, e ainda vivem, em nosso país. A ideia de se criar um Dia do Índio surgiu lá nos anos 1940, data em que representantes de várias etnias de países como o Chile e o México se reuniram no Primeiro Congresso Indigenista Interamericano. A reunião tinha o propósito de discutir várias pautas a respeito da situação dos povos indígenas após séculos de colonização.
Essa data é lembrada no Brasil e em vários outros países do continente americano. No caso do Brasil, o Dia do Índio foi instituído via decreto-lei, em 1943, pelo então presidente Getúlio Vargas, no chamado Estado Novo. Havia também, no contexto do Estado Novo, a forte influência de sertanistas e estudiosos de comunidades indígenas, como o Marechal Cândido Rondon. A história cruel em que vivem os nossos índios é resultado de um histórico que perpassa pelo capitalismo desde o século XV e XVI através do mercantilismo, seguido da Revolução Industrial. No início, o colonizador precisando de um guia, tinha no índio um apoiador para desbravar a mata. Porém, quando o índio não se deixou escravizar passou ao mito do mau selvagem, ou um ser sem lei, sem rei e sem alma. Esses índios resistem a tudo, preservando sua língua e sua identidade cultural, mesmo morando nas cidades atualmente. Os confrontos de identidade cultural dos indígenas, dos primeiros tempos, persistem hoje em proporções muito maiores e desumanas, tendo em vista que, evadidos de suas terras, não têm outro caminho a não ser o da cidade. Ali eles se esmolam, são marginalizados e até queimados por seres que se dizem socializados. Talvez, por terem sido colocados à margem por serem minoria são discriminados e excluídos. No Estado de Mato Grosso do Sul, segundo dados, existe um alto índice de morte por suicídios de indos por falta do seu habitat natural. Com a Declaração Universal dos Povos Indígenas, declarada pela ONU e, ratificada por 143 países, começa a se delinear uma nova realidade, com muita luta e resistência que conta com o apoio de vários indígenas. Eles são advogados, antropólogos, educadores, psicólogos, que sabem a importância de se manterem na luta por seus direitos.
Parece utopia querer preservar a população indígena que, apesar de protegida por muitas leis, foi amplamente exterminada pelos conquistadores de nossas terras e pelas doenças que eles trouxeram, cujo número de habitantes caiu de cerca de 3 milhões para cerca de 150 mil em meados do século XX, quando continuava caindo. Apenas na década de 1980 essa população passou a crescer em um ritmo sólido. A partir de 1991, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) incluiu a categoria “indígena” no Censo. Desde então, a política nativa brasileira cresceu 150%, passando de 330 mil pessoas em 1995 para quase 820 mil em 2010. Muitos brasileiros se autodeclararam indígenas, embora milhões de outros que tenham algum sangue índio em suas veias, sabe-se que ainda sobrevivem isolados sem contato com a civilização. É com respaldo nestes dados que não podemos nos eximir do compromisso com um povo que foi brutalmente arrancado de seu habitat natural, com todos os seus costumes, suas leis, seu jeito de vida e levado para uma cultura da qual o homem índio nunca se acomodou. Dessa forma, a celebração do Dia do Índio tem propósitos bem maiores e mais significativos do que apenas ser uma data para se comemorar nas escolas e Instituições públicas, ou mesmo servir de tema para reflexão crítica nas universidades, escolas e demais instituições semelhantes. O dever das autoridades e representantes do poder público é o de buscar meios e formas concretas de resgatar o espaço e a dignidade do povo indígena. O resgate dos povos indígenas no âmbito do Direito Internacional, como sujeito de direitos, conta com lideranças mundiais que lutam pelo direito ao direito, no caso, direito Indígena. A ONU, os ativistas, os ambientalistas e os observadores da causa, têm sido parceiros do reconhecimento dos direitos dos índios, mas o resgate da dignidade é alicerçado pela acomodação no espaço geográfico, com suas terras, suas moradias. O conflito pela demarcação continua a existir e parece que não terá solução a curto prazo, não porque seja impossível, mas por absoluta falta de interesse do Governo. Enquanto isso, produtores e indígenas continuam sendo prejudicados e mais que isso, ante uma situação de absoluta insegurança jurídica que se reflete na economia do Estado, deixando esses povos sem condições de sobrevivência, vivendo em condições de extrema pobreza e miséria em algumas aldeias ou à beira de rodovias, como tem reiteradamente mostrado a mídia. Urge, portanto, que o Governo assuma seu papel e cumpra o que o constituinte de 1988 ordenou.
Quero externar aos povos indígenas, minha admiração e meu respeito, sobretudo por serem nossos irmãos, que têm seus valores, suas crenças, seus sentimentos e por pertencermos, todos, a um mesmo Pai: nosso Deus.
(Célia Valadão é cantora, bacharel em Direito e vereadora)