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OPINIÃO

A quem interessa o poder paralelo no Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia?

Para não soar conveniência denunciar as acomodações e a alimentação recebidas pelos reeducados do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, uma vez que desnecessária, por ser uma situação visível e de conhecimento de toda a população, afirmo que em relação a mazelas desse tipo, familiares e os próprios detentos já se conformaram.

Muitos advogados e a justiça sabem como funcionam as leis do Sistema Prisional dentro das detenções por contato com os detentos ou por denuncias. Mas como aceitar e se calar para fatos onde os Agentes do Sistema Prisional ajudam o cometimento de ilícitos, e a direção do Sistema os institucionalizando-os? Transcrevo para conhecimento público, ao MP/Go e a CDH da OAB/ Goiás algumas regras que institucionalizam crimes no Sistema supracitado.

“Função de Cela”

Esse é o nome dado a primeira obrigação que o detento é submetido. Trata-se de pagar para o “Dono” da cela uma quantia em dinheiro que varia de R$50.00 a R$100.00 por semana, dependendo da condição do detento. Como o detento chega ao Complexo prisional, especificamente na Triagem, sem nada, o primeiro pagamento geralmente é feito em contas em nome de pessoas do lado de fora, ou em espécie via quantias repassadas por advogados aos clientes.  Como o tempo na triagem é curto, cerca de 30 dias, ao ser transferido para CPP (Casa de Prisão Provisória), a entrega do dinheiro é permitida e regularizada pelo Sistema Prisional através dos seus agentes, passando a ser em espécie para os próprios lideres das Alas.  Aquele detento que não tem família, não possui condições de pagar ou até mesmo se negar a realizar esses pagamentos é dado a escolha de lavar roupas para os outros detentos, apanhar cotidianamente ou fazer as chamadas correrias para o chefe da prisão: cobrar dividas, entregar drogas, cumprir castigos aos companheiros.

“Cobal”

Semanalmente, todas as quintas-feiras, familiares de detentos retiram uma senha online que os credenciam entregar a chamada “Cobal”. Em referencia a cesta básica doada pelo governo décadas atrás, Cobal é a entrega de alimentos, remédios, cigarros e dinheiro aos detentos. Os familiares passam de duas a quatro horas nas filas para conseguir seu objetivo. O que chama atenção neste procedimento é um guinche com agentes prisionais recebendo dinheiro para repassar aos detentos. Antes a quantia liberada para esses “depósitos” eram de até um salário mínimo, há pouco tempo o valor estabelecido passou para R$350.00. Para que serve esse dinheiro senão para corromper, pagar “Função de Cela” e comprar ilícitos, inclusive drogas?

Compra de Água

O pior atentado contra os direitos humanos dentro do Complexo Prisional de Aparecida de Goiânia, especificamente na CPP, é o racionamento proposital de água para a compra de água mineral dos agentes prisionais. O líder da Ala encomenda a água, repassa aos detentos e junto com os custos via Função de Cela. Menciono água por ser um bem essencial à sobrevivência, mas tudo que os chefes das Alas encomendam chegam dentro da CPP: sorvete, bebida, drogas e como apresentados nos meios de comunicação, até prostitutas, no caso da POG (Penitenciaria Odenir Guimarães) que também dica dentro do complexo.

O Castigo institucional

Todos os detentos que por ventura não se adaptarem as regras impostos na CPP, sofrem castigos a mando dos lideres das Alas e da própria direção. Quando um advogado a pedido da família denuncia ao diretor do presídio que o detento não possui condição de convivência junto aos demais por não conseguir cumprir com as obrigações impostas: pagamento da função e contribuição com o trafico de drogas nas Alas o castigo recai sobre o denunciante. Ao invés de procedimentos contra o líder da Ala, retiram o detento denunciante do local onde estava e o transferem para celas especiais onde, diferentes dos demais presos da CPP, passam cumprir pena em instalações piores, com maior numero de reeducando, e maiores privações.

“Dia da droga”

Todos os dias há consumo de drogas na CPP, mas há um dia especifico ela entra nas dependências e seu consumo é mais intenso. Pela grande quantidade de consumo é sabido pelo diretor que esses ilícitos não entram escondidos na chamada Cobal. Mesmo que escape aos procedimentos minuciosos dos agentes responsáveis por vistoriar a entrega de alimentos, a quantidade enorme de drogas consumida e comercializada na CPP e na Colônia Agroindustrial – Semiaberto leva a crer que não podem ser transportadas e distribuídas sem ajuda sistemática dos agentes públicos que trabalham no sistema prisional.

Colônia Agroindustrial – Semiaberto

Onde o Estado e o Sistema Prisional é menos presente são nas instalações do regime Semi Aberto. Até os mais perigosos condenados temem o regime. Para além dos acontecimentos que ilustram as paginas dos jornais, neste local o detendo perde o direito de cumprir sua pena.  Na ultima quinzena foram registrados mais de 40 fugas, e nos primeiros 05 meses do ano mais de 10 mortes. Brigas e tentativas de homicídio são regras no semiaberto. O reeducando do semiaberto além de estar submetido a todas as regras e praticas relatada anteriormente, são escalados e obrigados a fugir para cumprir o plano de fuga estabelecido pelos lideres do sistema. Assim como acontece na CPP, o Castigo Institucional só recai sobre o preso comum, sem liderança dentro do complexo, que quando não se torna um foragido obrigado, tem que conviver com a entrada do Policia, apanhar, e perder seus pertences como colchões, cobertas, remédios, roupas etc...

Com o crescimento da onda de violência dos últimos anos, e com ineficácia do sistema prisional comprovada nos índices de reincidência de crimes, a regra que esta valendo para muitos setores da sociedade é de “bandido bom é bandido morto”. Não importam com as consequências da corrupção na política de Segurança Publica e na prevenção de crimes. A condição dada a um criminoso para o cumprimento da pena nunca oferecera chances desse individuo se regenerar, quando não os tornam piorem ou mais comprometidos com o crime. Um reeducando não pode custar R$2.000.00 ao erário. Ouso dizer que sem direito sequer de um analgésico para conter dor devido ferimentos causados na penitenciaria, ou de um e toda falta de estrutura denunciada pela mídia, não custa 30% desse valor, que já é muito.  Qualquer valor gasto para garantir punição aos condenados pela justiça é demasiado alto quando se devolve esses indivíduos para sociedade mais violento e propensos a crimes. O olhar sobre esses fatos demonstra que há omissão e conveniência do Estado nos crimes cometidos no Complexo Penitenciário e isto não implica custos, mas gestão. Omissão pelo despreparo em solucionar problemas ligados ao poder paralelo no Complexo, conveniência em justificar que para se operar um sistema eficaz são necessários mais recursos, argumento que os livra da responsabilidade humana, social e de agentes públicos.

Se considerarmos esses episódios, fica evidente que correlação de forças entre “as leis da cadeia” e o Sistema Prisional serve muito mais aos interesses dos corruptos ligados aos lideres da CPP e Semiaberto, que criminoso comum que formam a maioria da população penitenciaria.  Talvez por isso a população não sente os efeitos da intervenção do poder publico na execução penal.

(Gildete Damascena Junior, historiador)

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