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Entre comemorações e crise: um baixo-astral foi instaurado no Brasil

Por Cristian de Paula Sales Moreira JuniorEspecial para Opinião

O Brasil está meio triste. Há um baixo-astral que parece ser generalizado. As pessoas perderam o ânimo. Uma crise sanitária provocada por uma pandemia que, além do incalculável custo humano de mais de 200 mil mortos, está “casada” com uma crise econômica que já se arrasta por alguns anos - e parece que não vai ter fim - deixa meio incerto o dia de amanhã.

Os trabalhadores, que arriscam suas vidas indo ao trabalho sem as condições de proteção necessárias para a execução de sua função, não sabem se seus empregos resistirão a um possível próximo decreto de restrições de circulação. A tendência é que não. Os informais, que já ultrapassaram a marca dos 30 milhões, perderam as esperanças de se formalizarem, contribuindo com o INSS para seguridade social e, um dia, se aposentar. Aliás, minto. A aposentadoria já está fora do horizonte de expectativa há muito. O que resta é trabalhar, trabalhar, trabalhar. Até que se esvair o fôlego vital.

As pequenas empresas, coitadas, endividadas até o pescoço, também têm incertezas quanto ao futuro. Não sabem se conseguirão pagar os empréstimos, as folhas de pagamento, comprar os materiais que revendem. Terão que demitir funcionários, mesmo sem possuírem o capital para pagarem os acertos. Empréstimos para pagar empréstimos. O que mais se vê, andando pelas ruas, são placas de “vende-se” ou “aluga-se” por cima de fachadas de negócios locais.

Não está fácil pra ninguém. Todos foram atingidos em cheio. Ou melhor, todos menos alguns. Os “alguns” são esses que já conhecemos. Como um pesadelo disforme, o qual sabemos que nos aterroriza mas não o identificamos. Me refiro à uma camada privilegiada, à elite política que, enquanto todos nós estamos com os bolsos agonizados, promovem uma festa de arromba com dinheiro do fundo partidário -isto é, com dinheiro público- para comemorar a vitória na eleição presidencial da Câmara. Com dinheiro que eu, tu, nós, pagamos. E vamos focar neles, agora, esquecendo a elite financeira que os financia, para não potencializar nossas frustrações.

Observando as imagens na imprensa, e pelas redes sociais, ficamos todos abismados. Não existe pandemia. Não pra eles. Eles provavelmente têm recursos para se recuperarem, caso se contaminem com o vírus, enquanto muita gente no Brasil morre por falta de oxigênio. Comes e bebes de primeiríssima qualidade, tudo à vontade para que deputados e deputadas aglomerados, sem distanciamento social algum -aliás, como se isso nunca houvesse existido- pudessem se embriagar. E cantavam, e dançavam. À contraste dos vinhos, espumantes e sobremesas de excelente aspecto, músicas de última categoria. Se abraçavam, se beijavam, se parabenizavam. Mas não respeitaram a História. E é pra isso que estamos nós aqui, conversando.

Quem são eles? Quais os seus nomes? Não sabemos, a não ser que ocupem um ou outro cargo, uma ou outra função. Esporadicamente. O chamado “centrão” é isso. Gente que vive de puro fisiologismo, que não aparece falando na imprensa (prego que se destaca é o primeiro a levar martelada), que não tem doutrina política. Simplesmente vivem ali. Não têm projeto de Brasil, não têm planos a longo prazo. Aprovam e reprovam pautas de acordo com a vantagem política do momento. Estiveram com o PT, estiveram com Temer, e agora estão com Bolsonaro. Sua única ideologia é a grana. É com ela que fazem obras superfaturadas nas suas bases eleitorais, em acordos com prefeitos, para se enriquecerem e garantirem a próxima eleição. E fazem isso para continuarem ali, do mesmo jeito, da mesma forma. É um ciclo vicioso. Alguns até votaram no Baleia Rossi, mas ali estavam presentes para fazer uma “boquinha”.

É deles que depende o nosso futuro nos próximos dias. A longo prazo, se haverá impeachment. A curto prazo, se haverá prorrogação do auxílio emergencial. Para que possamos fazer, nós também, uma festa de arromba? Não. Para conseguirmos comprar arroz e carne, para alimentar nossos filhos. Para conseguirmos comprar materiais de construção para terminar um “puxadinho” inacabado. Para pagar a dívida com a mercearia da esquina. Afinal, vivemos em um Brasil real, duro, concreto. Um Brasil em que, no descanso, carregamos pedras. Esse outro Brasil aí, é ilusão. Devaneio coletivo. Um pesadelo do gigante sonâmbulo, que pensávamos ter acordado, mas continua dormindo.

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