A estranha nomeação de Jacqueline Adorno, que tomou a vaga da OAB
Diário da Manhã
Publicado em 6 de julho de 2017 às 00:30 | Atualizado há 8 anosAté a vigência da Lei Complementar Estadual nº 34/2002, o quadro do Tribunal de Justiça do Tocantins manteve-se com onze desembargadores. Com o advento da re-ferida lei complementar, foi criada nova vaga, desaguando no provimento da 3ª vaga pelo quinto constitucional.
Antes da formação da lista tríplice pelo Tribunal, o governador Siqueira Campos chamou, um a um, os desembargadores (à exceção de Amado Cilton e Antônio Félix, que não seguiam a orientação de nós outros), e “recomendou” que votássemos nos procuradores Alcir Raineri Filho, Jacqueline Adorno e José Omar de Almeida Júnior para a formação da lista, e antes mesmo de chegar a lista ao Tribunal, o governador sabia, e já corria nos corredores a notícia de que a escolhida seria Jacqueline, a pedido da esposa do governador, Drª Mariluce Uchoa, promotora de Justiça (que após o casamento nunca mais trabalhou, mas era remunerada) e amiga íntima da futura desembargadora.
O Tribunal de Justiça do Tocantins, por ato arbitrário e informal do então presidente, desembargador Luiz Gadotti, em 11/11/02, “deu” ao MPE a 12ª vaga da Lei Comple-mentar nº 34, com a qual a Corte alcançou doze integrantes. Também informalmente, isto é, sem convocação e sem candidaturas, conforme registro da ata própria, em 12/11/02, portanto em um dia, o MP fez a lista sêxtupla, que resultou na nomeação da então procuradora-geral da Justiça, Jacqueline Adorno de la Cruz Barbosa, em 14/11/02, por ato do governador do Estado do Tocantins, este também questionado.
A injustificada informalidade da presidência do TJ/TO confirma-se pela ausência de resposta ao ofício enviado pelo Presidente da OAB/TO, Dr. Luciano Ayres da Silva, àquela Corte, no qual foi solicitado o ato decisório do Tribunal Pleno quanto à destinação da terceira vaga do quinto constitucional a integrante do MPE. Até hoje a OAB deve estar aguardando a resposta.
O presidente à época, desembargador Luiz Aparecido Gadotti, retirou do Colegiado a decisão que a este competia, conforme exsurge da interpretação combinada dos incisos VI, IX, ‘a’ e XII, do artigo 7º do Regimento Interno daquela Corte. Houve descumprimento de preceito fundamental, pois não se tratava de decisão discricionária, mas colegiada. E o presidente mandou a lista tríplice ao governador como se tivesse sido escolhida pelo Pleno.
Um parêntese: na escolha de Gadotti, mencionada em matéria anterior, o desembargador Amado Cilton pediu vista para analisar a escolha, mas o presidente, Des. João Alves, negou o pedido, como consta na ata da sessão.
Assim, às escâncaras e com a agilidade que os atos irregulares costumam ocorrer, consolidou-se a “doação” pelo presidente do TJ/TO de uma vaga de desembargador ao Ministério Público do Estado do Tocantins. Isto porque a lei é bastante clara ao estabelecer que os representantes da OAB e do Ministério Público ocupam a vaga dentro do princípio da alternância, ou seja, não podem ser nomeados seguidamente dois representantes do mesmo quinto constitucional.
Desse modo arbitrário, a composição do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins passou de onze para doze desembargadores, sendo três delas ocupadas por desembargadores provenientes da OAB e do MP. O primeiro proveniente da OAB e os dois outros do “Parquet” estadual. A última vaga, todavia, foi provida em frontal desrespeito ao princípio da alternância: se o primeiro nomeado fora Antônio Félix (OAB) e o segundo, Amado Cilton Rosa (MP), era lógico e evidente que a próxima vaga seria da OAB.
Assim, não havia que se falar em preferência do Ministério Público quanto ao provimento das vagas ímpares, prevalecendo a alternância nessas, sendo base a cronologia do primeiro provimento: se o primeiro provimento do quinto constitucional foi da OAB (Antônio Félix Gonçalves, em 06.01.89), e o segundo, do Ministério Público (Amado Cilton Rosa, em 10.03.89), a próxima vaga do quinto seria da advocacia, e não do MP, ocupada indevidamente por Jacqueline Adorno, num autêntico presente de Natal de Gadotti para o Ministério Público. O ato de nomeação de Jacqueline Adorno contrariava direito da OAB, garantido este pelas Constituições Federal e Estadual.
Mais uma vez o Tribunal curvou-se à vontade do Executivo, como sempre ocorria.
E a OAB continua esperando o resultado da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 76, que, ajuizada em 20/07/2005 e distribuída ao ministro Gilmar Mendes e redistribuída em 19/12/2011 à ministra Rosa Weber, transcorridos doze anos de sua propositura.
É bem capaz de que o Supremo, com suas decisões sem a mínima segurança jurídica, acabe dando uma “gilmarzada” e julgue pela teoria do “fato consumado”, ou considere prejudicada a ação, pela perda de objeto, pois tanto Gadotti quanto Jacqueline possuem quase trinta anos só de Tribunal, sem se contar com o tempo averbado, que, seguramente, deve estar beirando o necessário à aposentadoria.
No STF, com suas “gilmarzadas”, e no Tocantins tudo é possível.
(Liberato Póvoa, desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia Dianopolina de Letras, membro da Associação Goiana de Imprensa (AGI), escritor, jurista, historiador e advogado, liberatopo[email protected])