A inflação do rico e a do pobre
Diário da Manhã
Publicado em 25 de janeiro de 2018 às 00:05 | Atualizado há 7 anos
A inflação brasileira, de 2,95 em 2017, segundo os números oficiais, deixou exultante o governo. Pela primeira vez desde 1999, índices abaixo do mínimo da meta estabelecida pelo Ministério da Fazenda. Mas a comemoração envolve o governo e pouca gente mais. Neste caso, o percentual de mais ricos, cada vez maior no Brasil e no mundo. Ainda agora, às vésperas do Fórum Econômico Mundial que se realiza em Davos, na Suiça, revelou-se que o número de bilionários cresceu, em quantidade de pessoas e em quantias, ou seja, em valores por elas acumulados. Os cinco maiores bilionários do Brasil teriam patrimônio superior ao de pelo menos 50% de toda a população brasileira. Coisa de louco. Esses muito ricos têm motivos para as comemorações. Podem estourar a melhor champanhe e o whisky mais caro. O rico brasileiro que não se sente com segurança em seu próprio país pode, é claro, escolher qualquer lugar tranquilo no mundo para essa comemoração. Quem sabe, em alto mar, nas mordomias do iate próprio.
Já os pobres podem até ter esperança frente à notícia de inflação baixa, mas nada de concreto a comemorar. Falo dos mais de 12 milhões de desempregados, algo como 12% da população com idade laboral. Em 2014, eram a metade disso. Refiro-me também aos mais de 50% dos que ganham o salário mínimo. Assustados, por exemplo, com os aumentos de preços do gás, pouco ou nada lhes adianta falar em inflação baixa. A do gás de cozinha foi superior a 60% em 2017.
Os juros são outro item incompreensível pelo pobre e em especial pela classe média. A taxa básica selic caiu para pouco mais de 7% ao ano. E daí, se a taxa mensal sobre o cheque especial cobrada por alguns bancos, como exemplo cito o Santander, é mais que o dobro disso. Logo, para o cliente Santander que se viu na contingência de utilizar o cheque especial, falar de juros oficialmente baixos é como descrever as belezas de uma paisagem de Marte, na prática, inacessível. Falo do Santander mas poderia estar mencionando qualquer outro, o Itaú ou o Bradesco, por exemplo. Os governos promoveram a concentração do sistema. Um Estado como Goiás, que chegou a sediar diversos bancos privados quando sua economia era mais frágil, agora com economia forte e diversificada não tem mais bancos. Acabou a concorrência na intermediação do dinheiro. Prevalece a ditadura monetária, com apoio oficial.
Juros e tributos escorchantes são dois dos maiores males brasileiros.
E por falar em tributos, está sendo difundida nas redes sociais uma relação de impostos cobrados no Brasil. O da cachaça, bebida de brasileiro pobre, com alíquota de 83,07%, pareceu-me uma razão a mais a impedir qualquer comemoração dos índices inflacionários, por mais baixos que eles se apresentem.
(Valterli Guedes advogado, articulista e repórter especial do Diário da Manhã)