Opinião

A legalização dos jogos de azar

Redação

Publicado em 14 de dezembro de 2015 às 22:12 | Atualizado há 9 anos

O Congresso Nacional está ressuscitando um assunto que já deveria ter sido tratado há muito tempo: a legalização do jogo de azar. A exploração de jogos de azar era permitida no Brasil até 1946. A última partida de roleta no Brasil foi realizada no cassino Copacabana Palace” em 30 de abril de 1946. Na época, existiam cerca de setenta cassinos no país e 40.000 empregos em decorrência dos jogos. A proibição teve um forte efeito econômico em cidades que viviam principalmente do turismo ligado aos jogos, como

Petrópolis, Poços de Caldas, Lambari e outras.

A mídia nacional está repercutindo, por enquanto timidamente, a possibilidade de legalizar os jogos de azar: a liberação de cassinos, bingos, caça-níqueis, apostas na internet e jogo do bicho.Nestes dias de hoje, em que o governo digladia no vazio buscando ressuscitar a CPMF, criar novos tributos e arrecadar de qualquer jeito para tapar o rombo do Erário, o Planalto parece ver com simpatia a legalização dos jogos, que estão proibidos no Brasil  por força do  decreto-lei 9.215, de 30/4/1946, assinado pelo presidente Eurico Gaspar Dutra, sob o argumento de que o jogo é degradante para o ser humano  Muitos destacam, no entanto, a forte influência que a esposa de Dutra,Carmela Teles Leite Dutra, teria exercido na proibição, motivada por sua forte devoção à Igreja Católica

Surgiu em 1993 a “Lei Zico”, que favorecia os bingos, mas cinco anos depois, veio a “Lei Pelé”, que a revogou. O certo é que surgiram vários projetos de lei para disciplinar o assunto, mas acabaram sendo arquivados, em nome de uma falsa moralidade, como se político no Brasil tivesse moral. Ainda existe um projeto de lei, de nº 442/91, que deverá rediscutido agora, quando o governo parece que vai se empenhar na sua aprovação.

Não podemos tapar o sol com a peneira: o Brasil vive uma nova realidade, e, em nome da modernidade, recentemente a Câmara Federal deu o primeiro passo para legalizar bingos, cassinos e outros jogos de azar com a instalação de uma comissão especial que analisará dez propostas sobre o assunto, o que é visto com simpatia pelo Planalto, ávido por dinheiro, que vê na medida a possibilidade de elevar entre R$ 15 bilhões e R$ 20 bilhões a arrecadação por meio de impostos e outros tributos, de estimular a criação de empregos e o turismo no país, e examina proposta de liberação de jogos feita pelo ministro do Turismo, Henrique Eduardo Alves.

Um dos defensores da legalização é o deputado Nelson Marquezelli, político e empresário, um dos maiores exportadores de suco de laranja do país. Atualmente está no sexto mandato como deputado federal pelo Partido Trabalhista Brasileiro, que diz, com propriedade: “De 193 países, o jogo é regularizado em 177. Mensalmente, 200 mil brasileiros saem para jogar em outros países, principalmente Uruguai, Argentina, Chile e Paraguai. Nós não precisamos continuar deixando as divisas irem embora daqui. Nós temos 2,5 bilhões de pessoas no planeta que jogam e precisamos fazer com que essas pessoas venham jogar no Brasil”. Vê-se que em quase 92% dos países do mundo o jogo é regularizado. Por que este nosso falso moralismo, teimando em resistir a uma ideia perfeitamente legalizável? Como o jogo não é proibido pela Constituição Federal, a tramitação da proposta não terá o rigor de uma emenda constitucional, que exige “quórum” qualificado.

Integrantes da comissão instituída pela Câmara para estudar o assunto estimam que a legalização pode gerar uma arrecadação equivalente a mais da metade dos R$ 32 bilhões que o governo planeja obter com a volta da CPMF. “Nós não podemos ignorar que essa é uma fonte de receita e de turismo dos países mais desenvolvidos”, ressaltou o presidente do colegiado, deputado Elmar Nascimento (DEM-BA).

A exploração de jogos de azar já levou à criação de duas CPIs no Congresso na última década: a “CPI dos Bingos” e a “CPI do Cachoeira”. A primeira foi instalada no Senado, em 2005, na esteira do primeiro escândalo político do governo Lula, o caso Waldomiro Diniz, para apurar as relações do empresário Carlos Augusto Ramos, conhecido por Carlinhos Cachoeira, com o então assessor da Casa Civil e a influência dos bicheiros no país. A segunda, criada em 2012, investigou as ligações daquele empresário com políticos, na esteira das revelações da Operação Monte Carlo. O caso resultou na cassação do então senador Demóstenes Torres, acusado de interceder em favor de interesses daquele empresário de jogos, quando se desconfia que a cassação de Demóstenes foi “armação”, para crucificar e desmoralizar quem batia de frente contra a politicalha que entope o Congresso de vigaristas e aproveitadores. Com a legalização dos jogos, vai haver gente voltando por cima, pois a lei penal retroage para beneficiar o réu.

A clandestinidade dos jogos de azar continuará a alimentar a corrupção, com chantagens de policiais e políticos corruptos em cima de pessoas que querem apenas ganhar a vida e oferecer os empregos que seriam obrigação do próprio governo.

O assunto, porém, é polêmico, pois o jogo vicia, argumentam uns; mas a bebida também vicia, tanto quanto o cigarro, mas nem por isso foram proibidos, e sua legalização enfrenta resistência no Congresso, sobretudo de parlamentares ligados a igrejas. Mas a Bíblia não condena o jogo especificamente, nem a aposta, nem a loteria. A Bíblia apenas nos alerta para que fiquemos longe do amor ao dinheiro (I Timóteo 6:10; Hebreus 13:5). As Escrituras também nos encorajam a que fiquemos longe das tentativas de “enriquecimento fácil” (Provérbios 13:11; 23:5; Eclesiastes 5:10). Certamente o jogo gira em torno do amor ao dinheiro e inegavelmente tenta as pessoas com a promessa de riqueza fácil e rápida.

Vamos acabar com essa hipocrisia! Vamos criar novos empregos! Se a chamada bancada evangélica condena o jogo com base nas citações bíblicas, é bom que seus próprios integrantes ponham a mão na consciência, pois não há melhor forma de enriquecimento fácil e amor ao dinheiro do que um mandato cheio de mordomias, régios subsídios, verbas de representação, passagens aéreas e, ainda, “acordos” que engordam contas bancárias, aqui e na Suíça, e fazendas cheias de gado, sem prejuízo dos dízimos e ofertas arrecadados em cada culto.

A propósito: Eduardo Cunha é evangélico.

Liberato Póvoa e desembargador aposentado do TJ-TO, membro-fundador da Academia Tocantinense de Letras e da Academia  Dianopolina de Letras, escritor, jurista, historiador e advogado)

Tags

Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

Impresso do dia

últimas
notícias