Brasil

A preço de banana

Redação DM

Publicado em 2 de junho de 2015 às 03:28 | Atualizado há 10 anos

Quanto pesam três bananas? Depende do tamanho das bananas, eu sei. Acontece que eu estava com três bananas nas mãos e não poderia falhar no peso. Um erro de cálculo, além de interferir no meu almoço, poderia significar a minha desonra perante a plateia. Ou melhor, perante as pessoas da fila do caixa do supermercado que, assim como eu, aguardavam a vez.

Tenho um histórico confiável relativo a cálculos, principalmente aos que envolvem itens domésticos. Lá em casa, sou eu quem faço compras. Por questão de economia, ou de sobrevivência, aprendi a pesquisar e sei onde encontrar os produtos mais baratos. Observo preço, peso, qualidade e sei qual é o produto mais vantajoso. A experiência era o que me dava certo ar de confiança, ali na fila do caixa.

Naquele dia, meu almoço teria que sair “a preço de banana”, literalmente. Havia saído da faculdade por volta do meio-dia. Passei na lotérica e paguei a fatura da Avon para minha esposa. Almoçaria no “Um real”, restaurante popular da Avenida Goiás. Depois, seguiria para o meu primeiro trabalho, uma confecção, na Avenida 85, onde ficaria até as seis da tarde. Às sete da noite estaria no meu segundo trabalho, a Biblioteca Bariani Ortêncio, em uma escola estadual, no Bairro Itaipu. De lá, sairia às dez e meia, direto pra casa e dormir.

No entanto, algo saiu dos eixos e dessincronizou minha rotina, como um planeta que foge de sua órbita e coloca em risco todo o universo, no caso, meu almoço. Como sempre, a fila do “Um real” estava com mais de 300 metros. Após uns 30 minutos, chegou minha vez de matar quem me matava. Quando juntei as moedas, percebi que não tinha um real, e sim 36 centavos. Pouco antes, ao pagar a Avon, havia desinteirado meu um real, contado desde quando saí de casa.

Com a tristeza no estômago, abandonei a fila e me deitei em um dos bancos da Goiás. Comecei a elaborar planos. Ir pra casa: perder o dia de serviço. Seguir para o trabalho: desmaiar de fome. O que almoçar com 36 centavos? Salgado: um e cinquenta. Sardinha: um real. Biscoito recheado: 50 centavos. Paçoquinha, balas: não enche barriga. Uma fruta. Era isso, uma fruta. O Bretas da Avenida Anhanguera seria minha salvação. Segui para o supermercado.

Para minha sorte, o quilo da banana prata estava na promoção, 99 centavos. Peguei uma e calculei: uma dúzia pesaria pouco mais de um quilo. Três custaria menos de 36 centavos. Horário de almoço, supermercado movimentado. À medida que a fila andava, sentia um frio no estômago. Medo de que as bananas estivessem além do meu poder aquisitivo.

A atendente pôs as três bananas na balança. Os números começaram a girar, e… Parou nos 41 centavos, para o meu desespero. Simulando calma diante do caos, disse a ela que levaria só duas bananas. Ela e as demais pessoas da fila sorriram. Pensaram que fosse piada. Tremendo, tentei desatar o nó. Decidi nunca mais dar nó em nenhum saco. Rasguei a embalagem. Retirei uma banana. O almoço passou de 41 para 28 centavos. Aguardei o auxiliar de caixa ir até a seção de verduras e trazer outro saco plástico. Desculpei-me com todos que me observava. Perceberam que não era piada.

Após o “deus-nos-acuda”, à sombra do Teatro Goiânia, almocei dignamente, as duas bananas.

 

(Paulo Martins é professor e escritor, pós-graduado em linguística aplicada na educação. E-mail: [email protected])

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