A renúncia coletiva e o pacto da impunidade
Redação
Publicado em 22 de outubro de 2015 às 01:02 | Atualizado há 10 anosSempre tive um pé atrás em relação às declarações de cunho político do ministro do STF Marco Aurélio de Mello, não sei se pelo fato de ter aversão a sua linguagem rocambolesca, uma forma ostensiva de demonstrar conhecimento jurídico, ou pelo fato de ser aparentado do Collor, o certo é que nem sempre concordei com suas opiniões sobre os variados temas que lhe são solicitados a opinar. Contudo, agora, quando se manifestou a respeito da atual conjuntura política afirmando que o ideal é que houvesse uma renuncia coletiva de Dilma, Temer e Cunha reconsiderei de imediato minha opinião e dei à mão a palmatória: não tive como não concordar com o ministro. Sua declaração como ele mesmo ressaltou é utópica, pois lhe falta o instrumento jurídico para viabilizá-la, mas diante da atual situação de generalizada crise de legitimidade o mais certo seria isso mesmo: renuncia coletiva. Na realidade, proporia mais uma medida nesse pacote, já que a iniciativa do ministro na incursão especulativa neste exercício também me permitiu especular utopicamente, o que fiz, acrescentando, além da renúncia da Dilma, Temer e Cunha, a dissolução do Congresso convocando novas eleições parlamentares com Constituinte.
Ora, a crise não é pelo fato, como quer afirmar o situacionismo, de ser contra ou não gostar da presidenta Dilma. A crise é mais profunda do que isso e, isso se dá por que foi alvejada a legitimidade tanto do Executivo como do Legislativo. A Dilma, mesmo considerando que ainda não exista acusação formal contra ela, esta envolvida em uma engrenagem corrupta, sistêmica, como quer a oposição, com sérios indícios de que recebeu e foi irrigada sua campanha eleitoral com recursos de propina oriundo da Petrobras. Indícios não faltam. Agora mesmo, o mesmo delator que acusa Cunha de receber propina também acusa Palocci, como tesoureiro de campanha de Dilma ter recebido recursos contaminados pela corrupção. Ministros, parlamentares do PT e da sua base aliada estão envolvidos na trama sórdida da propina, alem de que, os dois tesoureiros do PT estarem presos. O que falta mais? Falta o batom na cueca? A Elba? Mas ela não era a presidenta do Conselho de Administração onde se aprovava todas as operações de relevância? Afinal, existiu má fé ou incompetência? Em um ou em outro está tipificado o crime, seja de cumplicidade com o malfeito, seja o de improbidade administrativa. Escapa-se de um não escapa de outro, essa que é a realidade.
Por outro lado, como legislar com um Congresso onde seus dois presidentes, da Câmara e do Senado estão indiciados como beneficiários da propina da Petrobras? Onde mais de quarenta parlamentares espalhados pelos partidos da base aliada do governo estão prestes a serem chamuscados pela denúncia do procurador geral da República? Como legislar com um Congresso contaminado pela propina e corrupção da Lava Jato?
Apesar dos fortes e veementes desmentidos de ambas as partes esta sendo ventilado entre o governo e Cunha a feitura de um escandaloso acórdão, evidentemente, buscando salvarem se da guilhotina. O governo salvaria a pele do Cunha retirando a assinatura dos petistas no Conselho de Ética que visa cassar o seu mandato e Cunha, por sua vez, não encaminharia o pedido de impechmmant da Dilma. Assim, ambos se salvariam e abafariam as pressões exigindo apuração e punição irremediável dos corruptos.
Diante das repercussões negativas tanto o governo, como o PT e o próprio Cunha se apressaram em negar o acórdão. Em entrevista dada no Japão, Marina Silva foi contundente em condenar este cambalacho do salvam-se todos, afirmando que o pacto da impunidade é inadmissível. Se por acaso chegar a acorrer tamanho e escandaloso acórdão a única alternativa é ir mesmo para a rua.
(Fernando Safatle. Economista – [email protected])