Afinal, o que é este ‘tal de golpe’?
Redação DM
Publicado em 22 de março de 2016 às 00:00 | Atualizado há 9 anosDentre as várias coisas que têm me chamado a atenção nestes últimos dias, no que se refere às manifestações – de um lado os favoráveis ao governo e de outro os que pedem o impeachment – é quanto a utilização da palavra ‘golpe’. Os dois lados se apropriaram deste termo, com sentido antagônico. Não é raro, nas duas manifestações observar faixas e cartazes de: “Não ao golpe.” Mas, afinal, que tal de golpe é este?
É claro que nunca devemos nos esquecer da riqueza gramatical brasileira, em que uma palavra tem diferentes significados diante de contextos específicos. Então vamos recorrer ao velho e bom dicionário. “Ferimento ou pancada com instrumento cortante”, “desgraça, infortúnio”, “ímpeto”, “crise”, “disposição decisiva que se toma em qualquer negócio”, “esperteza”. Vamos as gírias: “manobra traiçoeira”, “ação desleal, visando prejudicar alguém ou tirar vantagem sobre ele”.
Mas eu queria me ater as definições de golpe que são fundamentais para o contexto político atual, sendo a primeira: “Medida extraordinária, pela qual o chefe do governo de um país altera ou tenta alterar, violentamente, as suas instituições políticas, para tornar-se ditador, quase sempre com o apoio das forças armadas”, e a segunda: “Derrubar ilegalmente um governo constitucionalmente legítimo.” São dois lados da mesma moeda?
No entanto, mesmo cada um tendo o direito de utilizar a palavra como quiser, há algo que historicamente ou até mesmo sociologicamente, precisa ser explicado, que é o significado de ‘golpe de Estado’. Apenas para contextualizar, o golpe de Estado pode consistir simplesmente na aprovação por parte de um órgão de soberania de um diploma que revogue a constituição e que confira todo o poder do Estado a uma só pessoa ou organização.
Mas então o que seria o golpe militar? De forma bastante simplória é quando unidades das forças armadas ou de um exército popular conquistam alguns lugares estratégicos do poder político para assim forçar a rendição do governo. O Brasil já viveu dois golpes de Estado, um em 1937 em que Getúlio Vargas se apropriou do discurso de invasão comunista para justificar a sua ditadura e a outra em 1964, em que derrubaram João Goulart e permaneceram no poder até a década de 80, época em que aconteceu a redemocratização do País.
A grande questão que proponho neste artigo, é que o leitor faça uma reflexão sobre a atual conjuntura política, econômica e social do Brasil. E que coloque o nosso país no contexto internacional. Depois responda: vai ter golpe? O que é golpe? É possível golpe? Que golpe é este? Observamos na última semana, um grande exemplo do fortalecimento da democracia no Brasil, em que em um dia estavam os favoráveis ao governo na Avenida Paulista, em São Paulo, e no outro estavam os contrários.
Na medida do possível, manifestações de forma pacífica (é claro que tem muitas amizades sendo desfeitas no Facebook, mas vamos ignorar as paixões individuais), demonstram o estágio atual democrático do País. Você acha mesmo que este slogan ‘não vai ter golpe’ se aplica ao contexto atual? Ou é uma frase de efeito, reacionária e descontextualizada por ambos os lados? Isto não é igual ao “Moro Bloco”, “Somos todos Moro”? Isto é frase de manifestação? A personificação, a idealização, o endeusamento de um personagem? Será que estamos sabendo ir para as ruas e escrever o que realmente queremos nas faixas e cartazes? Para mim, a mensagem deve ser clara: “Nós brasileiros queremos o fim da corrupção.” Agora a reflexão é sua. Por precaução, eu não uso a palavra golpe!
(Letícia Jury, jornalista e mestranda em Comunicação pela UFG)