Opinião

Aplicação da nova lei aos contratos de trabalho

Diário da Manhã

Publicado em 29 de janeiro de 2018 às 22:51 | Atualizado há 7 anos

Uma das gran­des po­lê­mi­cas en­vol­ven­do a re­for­ma tra­ba­lhis­ta é so­bre a apli­ca­ção das re­cen­tes nor­mas pa­ra os con­tra­tos de tra­ba­lho vi­gen­tes e an­te­rio­res ao dia 11 de no­vem­bro de 2017, da­ta em que en­trou em vi­gor a no­va lei. O Tri­bu­nal Su­pe­ri­or do Tra­ba­lho (TST) de­ve­rá se po­si­cio­nar so­bre es­ta de­man­da no mês de fe­ve­rei­ro.

En­tre­tan­to, é im­por­tan­te es­cla­re­cer que as prin­ci­pa­is si­tu­a­ções em que a dis­cus­são acer­ca da apli­ca­bi­li­da­de da re­for­ma tra­ba­lhis­ta po­de­rá ter mai­or re­le­vân­cia são: (i) nos ca­sos de no­va pac­tu­a­ção ocor­ri­da lo­go após o pe­rí­o­do de va­cân­cia da lei, em que a no­va lei de­ve ser apli­ca­da e cri­a­rá um ce­ná­rio de even­tual dis­cus­são so­bre pos­sí­vel frau­de na no­va con­tra­ta­ção, in­clu­si­ve no que se re­fe­re aos acor­dos ou con­ven­ções co­le­ti­vas, (ii) nos ca­sos em que a le­gis­la­ção que en­trou em vi­gor be­ne­fi­cia o em­pre­ga­do em re­la­ção à le­gis­la­ção an­te­ri­or; (iii) no de­ba­te so­bre a mo­du­la­ção de efei­tos e a ne­ces­si­da­de de fun­da­men­ta­ção ade­qua­da por par­te do Po­der Ju­di­ci­á­rio nos ca­sos em que os tri­bu­nais pá­trios pro­ce­de­rem à al­te­ra­ção de sua ju­ris­pru­dên­cia até en­tão pa­ci­fi­ca­da (um dos pon­tos po­de ser so­bre a ques­tão da ter­cei­ri­za­ção) e (iv) for­ma de apli­ca­ção do que a dou­tri­na de­no­mi­na co­mo nor­mas ma­te­ri­ais e pro­ces­su­ais.

So­bre es­se úl­ti­mo pon­to in­di­ca­do, a nos­so ver, é que as prin­ci­pa­is ce­leu­mas ocor­re­rão.

Em re­la­ção às nor­mas pro­ces­su­ais, no Bra­sil, apli­ca-se a cha­ma­da te­o­ria do iso­la­men­to dos atos pro­ces­su­ais, que con­ta com a ade­são ma­çan­te da dou­tri­na pá­tria, ten­do si­do con­sa­gra­da in­clu­si­ve pe­lo ar­ti­go 2° do Có­di­go de Pro­ces­so Pe­nal e pe­lo art. 1.046 do CPC ao es­ta­be­le­cer que a apli­ca­ção da lei que en­tra em vi­gor ocor­re des­de lo­go aos pro­ces­sos pen­den­tes.

Em re­la­ção às nor­mas ma­te­ri­ais, a ques­tão pai­ra so­bre a pos­si­bi­li­da­de de es­ta­be­le­cer cri­té­rios pa­ra iden­ti­fi­car pos­sí­veis con­fli­tos en­tre nor­mas de mo­do a tu­te­lar con­te­ú­dos con­tra­di­tó­rios en­tre si (an­ti­no­mia) e, con­se­quen­te­men­te, a for­ma de so­lu­ci­o­nar es­ses cri­té­rios até se che­gar ao pla­no so­bre a pos­si­bi­li­da­de ou não de uma so­lu­ção e o “de­ver de co­e­rên­cia” na pro­du­ção e apli­ca­ção das nor­mas, ou se­ja, tan­to em re­la­ção à sua di­men­são le­gis­la­ti­va (o ór­gão que cria lei não de­ve cri­ar nor­mas que se­jam in­com­pa­tí­veis com ou­tras nor­mas do sis­te­ma), quan­to em re­la­ção à di­men­são ju­di­cial (co­mo as de­ci­sões ju­di­ci­ais de­vem li­dar com as an­ti­no­mi­as, ca­so se de­pa­rem com elas).

O fa­to é que a se­pa­ra­ção, co­mo um du­a­lis­mo, en­tre nor­mas pro­ces­su­ais e ma­te­ri­ais de­ve ser pen­sa­da com cui­da­do – e até su­pe­ra­da -, pois mui­tas ve­zes o que se vê são nor­mas de­no­mi­na­das de pro­ces­su­ais, mas cu­jos efei­tos são ma­te­ri­ais. Um exem­plo im­por­tan­te no âm­bi­to da re­for­ma tra­ba­lhis­ta se re­fe­re aos ho­no­rá­rios de su­cum­bên­cia e aos no­vos pa­râ­me­tros pa­ra con­ces­são da gra­tu­i­da­de ju­di­ci­á­ria (arts. 791-A e 790 § 3º da CLT) que, pa­ra nós, não po­dem ser apli­ca­dos nos pro­ces­so já em an­da­men­to, pois os pe­di­dos fo­ram fei­tos no pro­ces­so sob a égi­de da le­gis­la­ção an­te­ri­or.

A apli­ca­ção ime­di­a­ta e in­te­gral da no­va lei aos con­tra­tos de tra­ba­lho, por­tan­to, não pa­re­ce ser o ca­mi­nho mais ade­qua­do.

No que to­ca ao di­rei­to ma­te­ri­al, so­men­te o tra­ba­lho pos­te­ri­or à da­ta de vi­gên­cia da re­for­ma tra­ba­lhis­ta é que pas­sa a ser re­gi­do pe­la no­va le­gis­la­ção. Nes­te con­tex­to e con­si­de­ran­do a im­pos­si­bi­li­da­de de al­te­ra­ção con­tra­tu­al le­si­va, os em­pre­ga­dos que já es­ta­vam con­tra­ta­dos an­tes da en­tra­da em vi­gor da lei de­vem ter seus con­tra­tos de tra­ba­lho res­pei­ta­dos, sob pe­na de afron­ta ao di­rei­to ad­qui­ri­do.

 

(Hen­ri­que Gar­bel­li­ni Car­nio, ad­vo­ga­do de Di­rei­to do Tra­ba­lho, mes­tre e dou­tor em Di­rei­to pe­la PUC/SP, pós-dou­tor em Fi­lo­so­fia pe­la Unicamp e só­cio do es­cri­tó­rio Frei­tas Gui­ma­rã­es Ad­vo­ga­dos As­so­cia­dos)

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