Opinião

As relações entre Brasil e Cuba: o Porto de Mariel em debate

Diário da Manhã

Publicado em 7 de junho de 2017 às 02:14 | Atualizado há 8 anos

O Porto de Mariel é uma estrutura portuária localizada em Cuba, construída pela Odebrecht a cerca de quarenta quilômetros da capital Havana e foi inaugurado em janeiro de 2014, contando com a participação da até então presidente do Brasil, Dilma Rousseff, além de outros presidentes de países da américa latina, como Nicolás Maduro (Venezuela), Evo Morales (Bolívia), Donald Romotar (Guiana), Michel Martelly (Haiti) e a primeira-ministra Portia Simpson-Miller (Jamaica).

O financiamento concedido pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) causou um grande alvoroço entre os opositores do governo petista devido às declarações de fraude e de corrupção no processo de liberação dos recursos. O empreendimento foi cotado, inicialmente em 2008, em US$600 milhões, ainda no governo Lula, porém o custo total foi de US$957 milhões, o equivalente a R$2,3 bilhões. Destes, cerca de US$692 milhões (R$1,6 bilhão) foi financiado durante o governo do PT, o que consiste em um total de 72% de toda a reforma do porto cubano.

Muitos questionamentos começaram a potencializar-se quando o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC) confirmou que o Tesouro repassou recursos a fundo perdido, ou seja, um subsídio sem necessidade de ser pago. Além disso, quando questionado sobre o aumento do valor do financiamento, o MDIC disse que não poderia se pronunciar sobre o assunto em virtude do sigilo decretado por um período de 15 a 30 anos, que teria entrado em vigor, segundo um documento disponibilizado pelo próprio ministério, para que não prejudicasse outros financiamentos realizados devido a suas “condições específicas” para os cubanos.

Grande parte das críticas ao relacionamento entre Brasil e Cuba ataca o governo brasileiro por relacionar-se com uma ditadura que não respeita os direitos humanos e, também, por medo de beneficiar empresas que financiam campanhas eleitorais.

Mesmo que o ocorrido tenha causado indignação em determinados setores da sociedade brasileira, existem outros setores que tratam como um ato pragmático brasileiro.  O Porto de Mariel é, hoje, considerado tão sofisticado quanto os terminais do Caribe, os de Kingston, na Jamaica, e de Freeport, nas Bahamas, além de transitar pelo Canal do Panamá.

Embora o custo para a modernização do Porto de Cuba tenha sido alto, US$802 milhões investidos na obra foram gastos no Brasil na compra de bens e serviços comprovadamente brasileiros e, segundo a Odebrecht, esse valor gerou mais de 156 mil empregos diretos, indiretos e induzidos no País.

Diversos foram os motivos discutidos para que o Brasil financiasse essa quantia ao governo cubano, um deles seria o interesse de tornar-se um grande parceiro econômico de Cuba, tendo as exportações brasileiras quadriplicado na última década, ficando em terceiro lugar na lista de parceiros da ilha. O segundo motivo seria incentivar a modernização do modelo econômico de um país que tem potencial para ser um grande mercado para empresas brasileiras, além de que Mariel está a menos de 150 quilômetros do maior mercado do mundo, o dos Estados Unidos. Outro motivo seria a mão de obra barata ao mesmo tempo em que o Brasil amplia sua área de influência nas Américas em um ponto no qual os Estados Unidos não têm entrada.

Embora o estopim da história tenha ocorrido no governo Dilma, até hoje há várias investigações, sobretudo no governo Temer, segundo as quais não existem provas para o argumento de que o porto gerou mercado para brasileiros, pois é uma ilha fechada e seria difícil ter todo esse retorno em pouco tempo desde a sua inauguração. Isso suscita o questionamento sobre até que ponto os benefícios das relações Brasil-Cuba são realmente verídicos e até mesmo se o sigilo foi imposto apenas devido às condições específicas daquele repasse de recursos.

Afinal, as ações brasileiras em relação ao governo cubano foram realmente baseadas no interesse nacional ou revelam interesses partidários com uma inclinação para governos autoritários de esquerda? Uma coisa pode-se afirmar: manter boas relações com Cuba é uma prática do Estado brasileiro, não do governo do PT. As relações Brasil-Havana foram reatadas em 1986 e fortaleceram-se desde então. Pode-se, e deve-se, criticar o fato de o Planalto sob o comando PT não condenar publicamente as violações de direitos humanos da ditadura castrista, mas a questão é se realmente podemos condenar o governo pelo investimento no Porto de Mariel.

 

(Lorena Nascimento Fernandes, estudante de Relações Internacionais na Universidade Católica de Brasília)


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