Brasil de hoje, França de ontem!
Diário da Manhã
Publicado em 16 de março de 2017 às 02:27 | Atualizado há 8 anos
Muitos se perguntam o porquê de estudar história, questionam a importância de saber do passado e de outras coisas mais que o estudo da história proporciona. Há vários viés para responder esses questionamentos; para começar pode-se salientar a ideia de que é necessário entender e saber o passado, para se compreender o presente e desenhar um provável futuro, outra vertente é a de que a história com seus relatos e contextualizações, aumenta a criticidade do indivíduo, aumenta o entendimento político, econômico e social de cada um que se dispõe à analisar, a tão globalizada história, além do que, uma paisagem não se explica por si só, é necessário interpretar as entrelinhas, minuciar os porquês, contextualizar os fatos, relacionar tempos distintos, materiais diferentes para se chegar em uma explicação plausível. Analisando dessa forma e a partir desses princípios o cenário brasileiro atual, perceber-se-á uma certa coincidência, obra do acaso ou algo do tipo com a França pré-revolucionária.
Como todo brasileiro já está exausto de ouvir, o Brasil vive uma amarga crise, tanto econômica, quanto política e social, uma vez que, a economia vem encolhendo, o PIB vem retraindo, o poder de compra dos brasileiros diminuindo cada vez mais, na medida que a crise prospera, taxa de desemprego enorme, muitos Estados-membros falidos ou em situação financeira calamitosa, principalmente os envolvidos na Copa do mundo de 2014 e nas Olimpíadas de 2016. Tudo isso resultado de uma inatividade política econômica dos governos Lula e Dilma, em contrapartida a alta atividade de corrupção desses governos, que segundamente também contribuiu para o cenário atual e agora na incapacidade do governo Temer de desenhar saidas plausíveis para fazer o país prosperar, não só economicamente, como também em todos os sentidos.
Da mesma forma estava a França de 1780, a beira da falência econômica e social, com a fome e a miséria em ascendência no 3°estado (trabalhadores rurais e urbanos, burguesia, comerciantes), que eram sufocados por impostos altíssimos designados ao 2° estado (nobres) e 1° estado (clero), os quais eram isentos de impostos, mas muito bem servidos por eles. O 3° estado na época, era em torno de 80% da população, o restante dividido entre os outros dois estados, ou seja, a população mais carente carregava a igreja e a nobreza nas costas, pagando impostos altíssimos e para piorar sofrendo com secas intensas, o que somente dificultava a agricultura e como a França era um país agrário, isso consequentemente gerava um alto custo no alimento, por exemplo em 1789 o pão chegou a custar quase 90% do rendimento de uma família. Meio a esse cenário desastroso de um lado e espetacular do outro, a insatisfação popular com a corte em Versalhes era enorme, principalmente pelas atitudes nada econômica da Rainha Maria Antonieta, que era sinônimo de luxúria e depravação na boca do povo Francês.
Como já foi mencionado, a igreja e a coroa francesa viviam na mordomia, sustentadas pelo humilde 3°estado, desfrutava dos impostos gastando sem precedentes, detinham o poder da terra e por consequência de toda fonte de renda na França, estavam acima da justiça e grandemente amparadas pelo Direito, as igrejas eram dotadas de um luxo esplendoroso e a casa do governo francês era simplesmente o palácio mais luxuoso da Europa, o chamado Palácio de Versalhes, onde havia 700 quartos, 352 chaminés, 1250 lareiras, 67 escadas, 2153 janelas, um parque de 700 hectares, entre outros exageros. Para dar conta dos serviços desse símbolo de luxúria meio a tanta miséria, mais de 2 mil funcionários integrais, sem contar os funcionários diários e os muitos alfaiates particulares, que Maria Antonieta tinha para dar conta de todas as suas suntuosas roupas, que não eram poucas. Como se já não bastasse havia ainda outro palácio no “quintal” de Versalhes, destinado as festas da Rainha, local onde havia comemorações todas as noites com bebidas e comidas pomposas regadas a pura opulência.
Se está parecendo uma ideia absurda ou que não há qualquer relação entre o Brasil de hoje e a França de ontem descrita acima, é porque ainda não foi dito que só em 2013, a receita do congresso nacional brasileiro foi de R$ 8 bilhões (fonte: Spotniks), o que ao pé da letra são R$ 16 mil por minuto, R$ 23 milhões por dia, fruto dos impostos altíssimos pagos pelos brasileiros e isso em 2013, hoje, em plena crise, a realidade dos deputados e senadores são bem mais volumosas, em contrapartida a realidade do brasileiro “comum” é bem mais drástica.
Se faltou ênfase ou se ainda não é entendido a gravidade da situação, há mais dados; o Salário de um Deputado federal hoje no Brasil é de exatos R$ 33.763, que também recebe uma ajuda de custo de pouco mais de R$1.400, que conta com uma generosa cota de mais de R$ 39 mil, com um auxílio moradia de R$1.600 ou apartamento funcional, além de uma gorda verba de gabinete de R$ 92 mil. Fazendo uma simples conta, chega-se ao resultado que um deputado custa ao cidadão brasileiro mais de R$ 168 mil por mês, isso multiplicado por 513 deputados, são quase R$ 87 milhões por mês, multiplica-se por 12 meses, chega-se a um resultado final: Os deputados federais custam mais de R$ 1 bilhão por ano ao contribuinte brasileiro ( todos esses números tem como fonte o site congresso em foco, que se baseia em dados da câmara, do Senado e de arquivo próprio).
Neste sentido, com o senador não é muito diferente, recebe o mesmo salário dos deputados e outras coisas mais que chega a R$ 147 mil mensais, além dos benefícios de auxílio médico-odontológico ilimitado e auxílio psicológico de até R$ 26 mil anuais. O órgão superior presidencial não fica atrás, em 2014, por exemplo, gastou R$ 7 bilhões e não para por aí, ainda tem os ex-presidentes que também se fartam da melhor “vaca leiteira do mundo”, em que cada um custa ao Brasil quase R$ 1 milhão ao ano, são 5 ex-presidentes vivos, logo, são quase R$ 5 milhões ao ano, incluído nisso 40 funcionários, 8 para cada um e mais 10 veículos oficiais a disposição e isso para pessoas que não desempenham qualquer papel significante para o povo brasileiro. (Fonte: congresso em foco). Agora fica a pergunta; o que de tão bom esses Presidentes fizeram, a não ser cumprirem com suas obrigações, que motivam tantas regalias? O engraçado é que quando o povo, o cidadão comum, é mandado embora do serviço ou o tempo de seu contrato finda, por mais que esse empregado tenha desempenhado o melhor dos papéis, que tenha sido um espetacular funcionário, não tem esses direitos e dado o tamanho absurdo, nem deve ter.
Dessa forma, a Relação Brasil de hoje e França de ontem fica evidente, em ambas as situações, os governos usufruem dos impostos com toda pompa e a população comum arde na crise; de um lado o Brasil, onde o povo não usufrui de uma saúde espetacular, não tem acesso à educação de qualidade, a segurança é mínima, Lazer e cidadania são coisas de outro mundo, a escassez de trabalho é comum, impostos caríssimos, salário mínimo de 937,00 reais, valor esse que não chega nem perto do menor benefício recebido por um congressista, que é a ajuda de custo de R$ 1.400. Do outro lado a França de ontem que como já foi dito, tinha o 3° Estado na fome e na miséria e ainda submetidos a impostos altos e exclusivos de sua classe, enquanto o 1° e 2° estado gozavam de puro glamour, ou seja, não há como ser mais parecido.
O pior de tudo é que para o atual Presidente da República, o problema não são os gastos exorbitantes da máquina pública, para a vossa excelência o problema é a previdência social, é a aposentadoria do trabalhador. O ilustre presidente prega também que precisa-se economizar em tempos de crise para “arrumar a casa” e que depois de feito isso, estabelecer um crescimento sustentável, essa visão é correta, o que não é nem um pouco correto é tirar única e exclusivamente da população, é tirar daquele que menos tem e deixar a classe política intocável. É aquele velho ditado, “faça o que eu falo, mas não faça o que eu faço”.
Ano passado, o atual presidente da câmara dos deputados, Rodrigo Maia, em uma entrevista concedia a Mariana Godoy em seu programa, enfatizou que a câmara está mais econômica e que não acha caro o salário dos deputados, já que trabalham muito, pois são empenhados em resolver os problemas dos representados em Brasília, já outros dizem que os congressistas precisam sim, de receberem um ótimo salário e terem uma gama de benefícios , para assim atuarem melhor na gestão do país, para terem mais condições de atender às necessidades sociais.
É importante ressaltar que não são todos os políticos que esbanjam da sua remuneração, ainda há políticos com noção nesse país e que preza pelo bem social, vale ressaltar também que ainda há Estados-membros que estão conseguindo contornar essa crise, que conseguem não deixar a população na crise ardente e para isso usa sim, de medidas austeras, mas que são sustentáveis, futurísticas e que não deixam de lado a sociedade. O Estado de Goiás é um exemplo disso, pois segundo o Ministério do Trabalho e Previdência Social, Goiás liderou o ranking da geração de emprego do 1º semestre de 2016, ou seja, uma melhora que já possibilita um horizonte mais agradável.
Como já está notório, o salário e os privilégios dos congressistas não são nada econômicos, mas o que ainda poucos sabem é que há País no mundo, com economia excepcional, com educação extraordinária, com saúde e segurança que funciona, com transporte coletivo ótimo, dentre outras coisas mais, que fazem o povo desfrutar daquilo que a nação tem de melhor e tudo isso com vereadores que não recebem salários para trabalhar, que não têm gabinetes para executarem suas tarefas, com Deputados que andam de ônibus ou de trem, que cozinham suas próprias comidas porque não têm empregada, que lavam suas próprias roupas e em lavanderias comunitárias, que moram em apartamentos de apenas 18 metros quadrados, deputados que não recebem pensão vitalícia e que não têm plano de saúde privado bancada com dinheiro público, deputados que não têm imunidade parlamentar, que não aumentam seus próprios salários, que trabalham em gabinetes de 15 metros quadrados sem secretária, assessores e motorista particular. Isso existe na vida real e é de um sucesso impressionante, chama-se Suécia, país desenvolvido e de números excepcionais.
É muito importante para o Brasil saber que há uma possibilidade de se ter ordem e progresso com um preço mais acessível e a Suécia é um exemplo positivo disso. A autora Claudia Wallin que escreveu o livro “Um país sem excelências e mordomias” descrevendo a vida política na Suécia, mostra muito bem esse modo administrativo de tão raro sucesso e ela diz que “na concepção sueca, sistemas que concedem privilégios e regalias aos políticos são perigosos. Porque transformam políticos em uma espécie de classe superior, que não sabem como vivem os cidadãos comuns”. Uma concepção genial que fica ainda mais brilhantes se atentarmos para o histórico da Suécia, que há pouco mais de 100 anos também era um país de corrupção aflorada, um dos mais pobres e atrasados da Europa e que depois do investimento maciço em educação e pesquisa passou a crescer politicamente, economicamente e socialmente. Será que há possibilidade de o Brasil de hoje, que é a França de ontem, ser a Suécia amanhã?
(Pedro Henrique Lima de Souza, estudante de Direito)