Como o excesso de Estado (estatismo/esquerdismo) ajuda a criar a Cracolândia
Diário da Manhã
Publicado em 27 de junho de 2017 às 03:16 | Atualizado há 8 anos
No meu último artigo, sexta-feira, 23.6.17, publiquei um microtexto que gerou críticas:
Cracolândia: uma filha da Esquerda
1/ A Esquerda ajudou a abolir a autoridade do pai e a tolerância da mãe. Resultado: filhos sem família, sem ocupação.
2/ A Esquerda ajudou a abolir o trabalho , em nome da “liberdade” (o patrão, o pai, são “opressivos”) , em nome do “coitadismo” (“me dê o que é meu direito”).
3/ A Esquerda ajudou a abolir a psiquiatria por decreto: “doença mental é uma criação de médicos/hospitais autoritários e gananciosos”.
4/ A Esquerda disse que era o Estado que iria cuidar de tudo isso: a criança, o trabalho, a doença. Não cuidou de nenhum.
Tento responder às críticas:
1/ Voce diz que o Estado prejudica a evolução do indivíduo, como isso se dá ?
– Resposta: vou citar alguns exemplos bem simples e banais; cito apenas uns poucos, eu poderia ficar aqui dias e dias citando outros do mesmo jaez.
a/ eu era médico de um hospital estatal, queria aumentar minha carga horária, aumentei meu ambulatório de psiquiatria infantil, a pediatra chefe do depto de pediatria fechou meu ambulatório com inveja porque ela queria fazer psiquiatria infantil e não fez. Era chefe e me fechou, simplesmente isso.
b/ depois tentei abrir um ambulatório de distúrbios de aprendizagem, tudo isso para aumentar minha carga horária, ou seja, trabalhar mais. O pessoal da neurologia impediu, medo de eu estar “invadindo a área deles”, ou seja, mais uma vez, inveja prejudicando a população e a evolução do indivíduo ( no caso, a minha ) .
c/ tentei montar um serviço de psicologia médica hospitalar (atenção psicológico/psiquiátrica a pacientes hospitalizados com problemas físicos), o pessoal da psicologia me impediu.
d/ tentei montar um serviço de psiquiatria hospitalar, enfermarias e leitos de psiquiatria, o pessoal do depto de psiquiatria me impediu.
e/ tentei fazer uma doação de 4 milhões de reais (economias de toda minha vida) para este hospital, na tentativa de fazer um Instituto de Psiquiatria, onde eu pudesse trabalhar bem e em paz. Dois diretores deste grande hospital estatal impediram isso, alegando que depois não podiam garantir que “meus inimigos” (do tipo que exemplifiquei aí acima) deixariam eu trabalhar nesse instituto…. Ou seja, eu faria uma doação de milhões para um hospital público e depois nada garantiria que eu ao menos pudesse trabalhar no instituto que seria construído com esse dinheiro…
f/ um dos meus ambulatórios varava a tarde, ou seja bem além de meu horário regular, ia até as 21 horas. Por inveja, disseram que eu não poderia trabalhar até tardem, que estavam “sumindo coisas” e que eu seria responsabilizado.
Bom, eu poderia ficar aqui dias e dias aumentando esses depoimentos, mostrando como o Estado tolhe o indivíduo. Do mesmo modo que eu poderia ficar aqui dias e dias mostrando como todas as pessoas podem ter , e tem , oportunidades de saírem de situações difíceis, mas não saem porque não querem, porque preferem divertir, curtir, beber, “futebolizar”, etc. Não é o Estado que tem de resolver essas diferenças, inclusive porque ele só faz aumentá-las e tornar o ambiente ainda mais desigual. “Igualdade de oportunidades”, prá mim, é “igualdade de trabalho”, de realização, e quem promove a realização, o trabalho, não é o Estado, é o indivíduo….
2/ O Estado tem de dar igualdade de oportunidades, diz meu contraditor.
Já dizia o filósofo inglês Francis Bacon, depois retomado por S. Freud, que “só o conhecimento traz poder”. Conhecimento é informação. Quantos brasileiros “pobres” hoje têm celular, consequentemente internet, a base da informação hoje ? Quantos usam para o próprio engrandecimento cognitivo e não para “putarias”? Quem criou a internet ? o Ipad? Foi a iniciativa própria do indivíduo, privada, não o Estado. Há dois mecanismos pelos quais a iniciativa do individuo produz riquezas, ou pela concorrencia (que o Estado trabalha para anular) ou pelo interesse genuíno do indivíduo em fazer um bom trabalho (o ser humano , e mesmo os animais, tem um institnto pouco estudado e pouco falado, o “instinto laboral”, uma espécie de “instinto de realização”).
3/ Você é ingênuo, não sabe que o capitalismo utiliza-se do Estado? – diz meu contraditor
Respondo : A concentração de renda só ocorre porque os empresários são turbinados pelo Estado. Se fosse pela concorrencia, isso não ocorreria. Aí vc vai dizer que o “seu Estado esquerdista” não é esse que está aí , esse do PT”, esse da China, esse de Cuba, da URSS, etc. Aí fica dificil a gente antever que Estado/esquerda é essa que vc fala, é o Estado Fulan-iano ? Ou seja, é o Estado que só existe na sua cabeça? Complicado…
Os grandes empresarios, os grandes do PIB, “gigantes nacionais”, só concentram renda porque tem os mecanismos sórdidos do Estado a favor deles. Esses mecanismos não são criados e não são aproveitados pela grande sociedade civil, composta por micros, pequenos , médios empresários. Os simples mortais não mamam nessa estrutura do “grande PIB”.
4/ você fala de Estado como se fosse uma “entidade psicológica”, algo uniforme , gerado por uma sociologia específica; não concordo com isso, diz meu contraditor.
Respondo: Se voce ler um pouco de Emile Durkheim, Marcel Mauss, Blondel, Levy-Bruhl, [ escola francesa ] , Weber, entenderá o que quer dizer uma “estrutura social” determinar determinados comportamentos. A estrutura estatal determina determinados comportamentos, eu escrevo isso o tempo todo, há uns 50 dias mesmo escrevi uma serie de artigos sobre isso no Diário da Manhã . O Estado cria uma “superestrutura” (conceito de Marx), uma “consciência ideológica” que funciona como eu lhe disse, tolhendo iniciativas, “agindo dessa forma ou de outra”. O Estado cria toda uma “psicosfera”, que induz os indivíduos trabalharem dessa e dessa forma.
Por exemplo, vá na URSS pré – Queda do Muro, vá em Cuba, Coreia do Norte, leia os estudos de historiadores, p.ex., Hobsbawn, Judt, Todd, Brown, etc, etc, e descobrirá uma coisa : todas essas sociedades, por mais oprimidas fossem, por mais pobres fossem, queriam manter seu status de “regressão à média”, ou seja, queriam manter -se em situação de pobreza (absoluta ou relativa), tudo porque o “igualitarismo” é algo que galvazina, hipnotiza, as massas: “é melhor sermos todos pobres e todos iguais”, “é melhor sermos todos pobres/iguais do que permitirmos uns ricos/desiguais que sejam nossos patrões”.
O marxismo/esquerdismo aproveitou-se exatamente dessa tendência estatística de “regressão à média”. Ela pode ser até “boa” para o grosso da população (todos com “direitos iguais”) mas é mortal para os individuos que querem evoluir, e são esses que derrubam esses regimes, não o povão, não os “grande capitalistas” (esses sempre arrumam um modo de mamar no Estado, mesmo na época de Stalin era assim, basta ler um pouco de história da URSS e a história de suas grandes companhias de Capitalismo de Estado).
5/ “você se defende, porque também é elite”, diz meu contraditor .
Resposta: Em tempo, não concordo, nao “sou direita”, nao sou “elite”, sou mulato, comecei do nada, sem ajuda política, sem ajuda financeira, só com meu diploma, inclusive estudei em escola publica. Não ligado a grupo nenhum, político ou econômico. Nao sou “a favor de desigualdade nenhuma”, inclusive porque sou cristão, tento tratar todo mundo igual, e nao acumulo bens, tudo que eu tenho eu gasto , a fundo perdido, tentando só melhorar o hospital filantropico do qual sou diretor medico, pra desespero de minha mulher e meus filhos.
Morei na Europa onde vi o individuo ser totalmente tolhido pelo Estado. P.ex., lá vc nao pode montar o que é seu, nao pode trabalhar num hospital (se não entrar na panelinha prá isso) , nao pode escolher seu curso, nao pode escolher sua residência médica, etc. Em tudo vc é tolhido pelo Estado, tudo em nome do igualitarismo coletivista. Chegando de lá , aqui no Brasil, a primeira coisa que fiz foi montar um hospital, tentei fazer isso no Estado nao deu – como já citei acima. E fiz isso apenas para poder trabalhar bem, nao para ganhar dinheiro ou mandar em ninguem. Jamais poderia ter feito isso na França, onde o Estado tolhe todas essas iniciativas.
6/ Em resumo, solução para “um mundo com menos Estado”: 1/ transparencia (essa impede ou pelo menos inibe o Capitalismo de Compadrio, Capitalismo de Estado) . 2/ permitir que indivíduos concorram (corrige o Capitalismo Selvagem) . 3/ permitir que indivíduos evoluam, trabalhem, melhorem.( permite que surja um “Capitalismo Sadio”, aquele dos indivíduos que não querem dominar/enriquecer, mas apenas “fazer um bom trabalho”).
(Marcelo Caixeta, médico psiquiatra. (hospitalasmi[email protected]). Escreve às terças, quintas, sextas, domingos no Diário da Manhã, Goiânia. Acesso livre em impresso.dm.com.br))