Como os tecnocratas tapeiam o povo
Redação DM
Publicado em 5 de janeiro de 2017 às 01:57 | Atualizado há 8 anosÉ na Secretaria do Tesouro Nacional que estão centralizadas as informações sobre arrecadação, despesas, dívidas dos Estados, títulos da dívida pública e correlatas cositas más. Foi de lá que sairam as bases teóricas do assim chamado Novo Regime Fiscal. A matriz argumentativa em favor do NRF é um gráfico constante de um relatório publicado pela revista da CNI, de outubro deste ano. O relatório sobre a situação das contas públicas elaborado pela STN foi apresentado ao vivo por Ana Paula Vescovi, a secretária e ideóloga do Novo Regime Fiscal. O gráfico de que vos falo foi mostrado até em um telejornal da Globo, com animação e tudo mais, para melhor convencer o telespecator incauto a comprar gato por lebre.
O gráfico mostra a evolução das depesas primárias, a partir de l995, e sua proporção em relação ao PIB. Referido gráfico mostra que em 2025 as despesas primárias evoluirão a 20,9% do PIB, se nada for feito. Mas, com a adoção do Novo Regime Fiscal, a partir de 2017, chegaremos a 2015 à razão de 16,8% do PIB.
O gráfico, que não é quadriculado, omite valores importantes. Mas dá para perceber que a relação gastos primários/PIB era muito baixa nos tempos de FHC, embora a partir de 1996 a tendência foi de crescimento. Apresenta suave queda entre 2002 e 2003. Aí, começo do governo Lula, aparece no gráfico um número. Neste ano a proporção ficou em 16,8%. Segundo o gráfico, depois de cair fortemente nos anos vindouros, chegaremos ao patamar de l996 depois de 23 anos, graças ao NRF. O gráfico nos informa que a proporção relativa ao ano de 2015 é de 20,1% do PIB, cujo valor é conhecido, bem como conhecido é também o valor das despesas primárias. Como ainda não fechamos 2016, vamos deixá-lo de lado.
A primeira vista. o gráfico, tão bonitinho, de cores tão mimosas, engana bem. Engana os que não sabem contar com os dedos da mão, os que não têm interesse em conferir as contas. Enganam os bobos de sempre que acham que o governo sempre fala a verdade e que os tecnocratas do serviço público estão sempre cobertos de razão. Sim, eles devem ter razão porque sabem de coisas que não sabemos, fizeram cursos que não fizemos, em universidades americanas e européias.
O gráfico, contudo, é mentiroso. Nem me dei ao trabalho de conferir as contas anteriores a 2015. Dou de lambuja que estejam certas. Meu foco foi 2015 em diante. Feitas as contas, verifiquei que o gráfico mostra é puro charlatanismo. Antes de demonstrar matematicamente a enganação da STN, vou levantar aqui uma questãozinha de método.
O gráfico cartesiano aplicado a estatísticas econômicas, em que o eixo horizontal é sempre uma linha do tempo, vem a ser uma ferramenta utilíssima para demonstrar tendências e projetar cenários. Existem duas formas de projetar cenários futuros: uma, a mais simples, é fazer a mediana dos dados já realizados no passado. Tratam-se de projeções em que se trabalha com valores constantes redutíveis a uma função linear.
Mas o gráfico com que se pretende comparar a relação de proporção entre gastos e PIB num determinado período, deve ser obrigatoriamente uma curva gerada por uma função exponencial. Sim, porque estamos lidando com variáveis nos dois eixos. E isto não acontece no gráfico da STN, que induz o incauto observador a supor que o PUB é uma constante. Por que temos que calcular a evolução da proporção despesa/PIB por meio de uma função exponencial? Seria por que esta é a fórmula usada universalmente pera calcular juros compostos, evolução do PIB em certo período segundo uma taxa média, para calcullar taxa de crescimento de culturas bacrterianas e caucular ostros fenomêmnos? Sim, é isto mesmo.
A inflação também nunca é um valor fixo. Ele varia de ano para ano. O relatório diz que chegaremos em 2025 com a despesa equivalendo a 16,8% do PIB. Mas, de que PIB se fala? Do PIB de 2015? Ou seria do PIB de 2019, que é onde parou a estimativa dos técnicos da receita? Como vamos calcular o PIB de 2025? Podemos calcular o valor deste PIB por meio de uma função exponencial. Fiz isto.
Num gráfico cartesiano, não posso escalar o eixo vertical com valores dados em percentuais, como faz o relatório. O valor do PIB deveria ser dado em reais, ainda que para os anos seguintes ele fosse apenas estimado. O gráfico mostrado pela STN só teria valor científico se o PIB fosse uma constante a que se atribuísse o valor 100. Ocorre que a taxa de crescimento do PIB é tomada, sempre, em relação ao PIB do ano anterior. Uma projeção da relação à despesa/PIB até 2025 teria que vir acompanhada, necessariamente, de uma projeção do valor monetário do PIB até este ano, pressupondo-se uma taxa média de crescimento qualquer. Sim, porque não é crível que teremos, como sugere o gráfico da STN, uma taxa de crescimento zero pelos próximos 9 anos. O próprio Tesouro estima uma taxa de crescimento do PIB, a partir do próximo ano, de algo em torno de 1,2% em relação ao PIB deste ano, que deverá fechar negativo em torno dos 4%. A estimativa, em outubro, é de que teremos taxa de -2,5% em 2019. Estimativa já revisata para baixo. Os pessimistas acham que fecharemos a -4%.
Agora, vamos às contas que fiz. Estou supondo, para os próximos o anos, uma taxa média de 3%, tomando o PIB de 2015, que de 5,9 trilhões de reais, como valor de referência. Com isto, chegaremos a um PIB de 61,36 trilhões de reais.
As despesas, engessadas pelo NRF, chegarão a 12,48 trilhões de reais em 2025. Nas minhas contas, parto do valor das despesas primárias realizadas em 2015. A partir daí, seguindo as regras do NRF, projeto sua evolução aplicando uma taxa de incremento de 4% ao ano, que é a meta de inflação fixada para os anos seguintes. Isto representa 20,35% do PIB cauculado nos termos do parágrado anterior, se a inflação for baixa.
Para esta proporção cair, o PIB teria que crescer a uma taxa de pelo menos 4% ao ano, ou mais. Se ficar abaixo disso, a proporção vai aumentar.
Conclusão: O Novo Regime Fiscal não vai trazer a relação despesa /PIB para 16,8%. Para quem quiser conferir as contas, basta aplicar os dados disponíveis dentro da seguinte fórmula: P (x) = Pi . (1×0,04)10, em que dez é potência aplicável sobre a base. P(x) é o valor procurado do PIB de 2025. Pi é PIB de 2015 vezes 1 muliplicado por 0,04, que é a taxa de incremento do PIB no período em tela, elevado à décima portência (sendo 10 a quantidade de anos durante os quais o PIB evoluirá). A evolução das depesas primárias, segundo as regras do NRF, foi também calculada pelo mesmo método.
Nem foi preciso um computador quântico para chegar ao resultado. As contas foram feitas a lápis, com auxílio de tabuada aritimética, dessas que os alunos do pré-primário usam. O truque dos ideólogos do NRF consiste em trabalhar com PIBs medidos em percentuais e sem referência a um dado PIB já conhecido e quantificado. É pressupor que o PIB é uma constante igual a 100. É assim que essa trecnocracia chega a conclusão, em outro gráfico igualmetne fajuto, que o déficit da previdência chegará em 2060 ( mal posso esperar para ver!) a 17,20% do PIB. Podemos calcular o PIB de 2060, por meio da função exponencial, se pudermos prever a taxa média de crescimento, ou de descrescimento, do referido dito cujo. Desconfio, porém, que nem o Todo Poderoso, que é onisciente, e a quem o futuro pertence, teria como prever a taxa média de crescimento da economia para os próximos 50 anos. Que se dirá de nós, pobres mortais!?
Bem, meus amigos e minhas amigas, rogo-lhes que não acreditem em mim. Papel e lápis na mão: façam as contas e tirem suas próprias conclusões.
Equlíbrio fiscal é função de receita igual a despesa, resultando em zero a equação orçamentária. Estranhamente, em parte alguma o comportamento da receita é abordado. O que acontecerá com o excesso de arrecadação, caso apareça? Como o governo aposta que o NRF fará a retomada do crescimento, o que implica aumento e arrecadação, seria lícito supor que isto criaria lastro para um aumento equilibrado da despesa. Mas isto fica para o próximo capítulo.
(Helvécio Cardoso da Silva, jornalista)