Confaloni: de retratista a retratado
Diário da Manhã
Publicado em 4 de dezembro de 2017 às 22:42 | Atualizado há 4 meses
Estes dias estão marcados por eventos comemorativos do centenário do nascimento de Frei Nazareno Confaloni (1917-2017), com intensas atividades que vêm se desenvolvendo no Centro Cultural Oscar Niemeyer até o próximo dia 10, onde permanecerá por mais tempo uma exposição de obras do consagrado pintor, considerado o mestre e pioneiro das artes plásticas em Goiás. Dentre as obras da exposição estarão incluídos alguns retratos de pessoas reconhecidas como amigas do pintor, que por sua vez é agora retratado em suas múltiplas facetas pelo escritor e crítico de arte Emílio Vieira (titular aposentado da Faculdade de Artes Visuais da Universidade Federal de Goiás), no seu livro recém-editado pela Kelps, “Nazareno Confaloni & A Arte Moderna em Goiás”.
Segundo Emílio Vieira, Frei Nazareno Confaloni, embora fosse considerado excelente retratista, não se dedicou com afinco a esse gênero artístico, e seus retratos em destaque eram geralmente motivados como forma de homenagem aos seus amigos mais próximos, que contribuíam com suas obras sociais ou que frequentavam seu ateliê instalado junto ao Convento São Judas Tadeu de Goiânia, onde preferia trabalhar silenciosamente no exercício de sua arte voltada para os grandes temas religiosos e existenciais. Um dos seus retratos (vide foto) de Emílio Vieira ainda jovem, a quem fora confiada a realização das exéquias do pintor, proferindo inclusive o discurso de adeus em nome da família Confaloni, representada naquele ato por sua irmã Fernanda Confaloni e seu cunhado Ideale Orsini, os quais vieram da Itália para o seu sepultamento em
Goiânia, que se deu do dia 5 de junho de 1977, no subsolo da Igreja São Judas Tadeu, nesta capital.
Temas centrais da obra
O livro em foco compõe-se de cinco partes, começando da ideia de criação do Museu Confaloni, até a polêmica levantada pela imprensa em torno do seu espólio artístico, que finalmente encontrará seu domicílio definitivo na Cidade de Goiás, onde o artista realizou seus primeiros trabalhos no Brasil, a partir de 1950. Emílio Vieira (que assina o livro com o pseudônimo Emílio Etrusco) desenvolve uma análise da poética e da estética de Nazareno Confaloni, desde suas raízes na Itália, traçando uma aproximação entre sua obra e a de Fra Angélico, e comparando alguns aspectos dos seus afrescos realizados na Igreja do Rosário na Cidade de Goiás com os afrescos de Giotto pintados na Basílica de São Francisco de Assis na Itália. Em seguida, o autor comenta o “sincretismo pictórico” de Confaloni, mostrando as influências de sua formação clássica trazida da Europa associada a novas tendências desenvolvidas no Brasil após seu contato com artistas brasileiros, a exemplo de Cândido Portinari.
Dos três pioneiros
Emílio comenta que são considerados pioneiros da arte moderna em Goiás, três pintores, Nazareno Confaloni, Cleber Gouvêa e DJ Oliveira (sem contar um nome à parte, do escultor Gustav Ritter) que, ao lado de Confaloni e do professor Luiz Curado, fundaram em Goiânia a primeira Escola de Belas Artes em 1972, transformada na atual Faculdade de Arquitetura da PUC /Goiás. E explica: “Confaloni e Cleber se estabeleceram inicialmente na Cidade de Goiás (antiga capital), depois se transferiram para Goiânia (nova capital do estado), onde passaram a exercer o ensino superior de arte na referida escola, a que se agregou mais tarde DJ Oliveira. Gustav Ritter já se havia estabelecido em Goiânia onde lecionava carpintaria na Escola Técnica Federal de Goiás (atual Cefet).
Essas referências são importantes – destaca Emílio Vieira – “para avaliação dos respectivos papéis desses três pioneiros da arte moderna em Goiás. Dentre eles, Nazareno Confaloni foi o primeiro pintor moderno a se estabelecer em Goiânia e que maior influência exerceu nos meios culturais e artísticos na nova capital, desde o seu inegável prestígio de pioneiro e a sua versatilidade na condição de artista, professor de arte e sacerdote voltado para as questões sociais”. E arremata: “Os três mencionados foram responsáveis pela formação dos mais expressivos artistas de Goiás a partir da geração de 1960, os quais marcaram época como representantes de uma nova consciência estética”.
Um projeto não realizado
“Um projeto frustrado com a morte de Confaloni, foi a publicação de um álbum de pintura e poesia, em co-autoria com Emílio Vieira”, comenta Miguel Jorge, como editor do suplemento cultural de O Popular, em artigo intitulado “Confaloni, um ano de solidão” (Goiânia, 04-06-78), em que inclui textos de Emílio Vieira e Godoy Garcia, mencionando fatos relevantes do legado cultural e artístico deixado por Confaloni. O primeiro livro de Emílio Vieira, “Ponto Lua” (Goiânia, CERNE, 1966) foi ilustrado por Nazareno Confaloni, e neste seu trabalho atual, rememorando Confaloni pelo seu centenário de nascimento, Emílio Vieira destaca os trechos poéticos de “Ponto Lua” com as respectivas ilustrações de Frei Confaloni. São acrescentados outros desenhos ilustrativos extraídos do Álbum de Confaloni (Goiânia, 1966), com que Emílio homenageia o pintor acrescentando novos textos extraídos do seu livro “ Poemas da Revisitação” (Goiânia, Kelps/UBEGO, 2000). O livro em foco, numa versão bilíngue, português e italiano, conclui-se com o seguinte texto poético: (imagem ao centro).
(Michelly Souza, jornalista e editora do OpiniãoPública)