Cuba e o Vaticano
Diário da Manhã
Publicado em 15 de dezembro de 2016 às 00:57 | Atualizado há 8 anosNo final do mês de novembro os meios de comunicação e as redes sociais globalizados divulgaram o falecimento de Fidel Castro e a consequente repercussão em todo mundo.
O líder revolucionário, comandante da guerrilha que derrubou o governo e assumiu comando da ilha de Cuba, por décadas dirigiu o país com mão de ferro e ali implantou o sistema comunista. Na ocasião houve perseguição à Igreja Católica e muitos cristãos deixaram o país migrando para outras partes do mundo.
O Vaticano buscou sempre poder influenciar na liberdade religiosa, em Cuba, e manteve bispos e padres na região. Desde o golpe político, paróquias tinham sido apreendidas e escolas católicas fechadas. Dezenas de milhares de fiéis cristãos reagiram fugindo da ilha.
Em 1998, João Paulo II tornou-se o primeiro papa a visitar aquela ilha, porém existe um fato inédito quase desconhecido. Antes de visitar Cuba, o papa esteve nos Estados Unidos com o então presidente Bush, que no diálogo com o líder católico, tentou dissuadir João Paulo de ir a Cuba, apelo que definitivamente não foi ouvido. O papa polonês fez um chamado histórico, pedindo a Cuba para se abrir ao mundo e para o mundo se abrir a Cuba. Houve também os históricos diálogos com Fidel Castro que, em 1996, esteve duas vezes no Vaticano visitando o papa.
Em março de 2012, Bento XVI fez uma visita de três dias a Cuba, pedindo paz, liberdade e reconciliação. Além de falar com Raul Castro, o papa também se reuniu, em particular, com o seu irmão Fidel. Foram encontros que abriram o caminho para este último desenvolvimento histórico entre os EUA e Cuba. O Vaticano falou muitas vezes contra o embargo emitido pela nação norte-americana.
Entre poucos países que receberam seguidamente a visita de um pontífice, Cuba recebe o papa Francisco, em 20 de setembro de 2015, o terceiro representante da Igreja Católica a visitar a ilha. “Venho a Cuba como peregrino da caridade, para confirmar meus irmãos na fé e encorajá-los na esperança. Levo em meu coração as justas aspirações e os legítimos desejos de todos os cubanos, onde quer que encontrem, seus sofrimentos e alegrias, suas preocupações e seus desejos mais nobres”, disse o papa perante Castro.
Recordando mensagens desses peregrinos da fé e da esperança transcrevemos alguns pontos fundamentais de suas falas:
“Neste sentido, cabe recordar que um Estado moderno não pode fazer do ateísmo ou da religião um dos seus ordenamentos políticos. O Estado, longe de todo o fanatismo ou secularismo extremo, deve promover um sereno clima social e uma legislação adequada, que permita a cada pessoa e a cada confissão viver de maneira livre a sua fé, expressá-la nos âmbitos da vida pública e contar com os meios e espaços suficientes para oferecer à vida nacional as suas riquezas espirituais, morais e cívicas.” (João Paulo II–1988).
“Perante o olhar da Nossa Senhora da Caridade, desejo fazer uma chamada para que deem novo vigor à sua fé, para que vivam de Cristo e para Cristo, e, com as armas da paz, do perdão e da compreensão, lutem para construir uma sociedade aberta e renovada, uma sociedade melhor, mais digna do homem, que reflita mais a bondade de Deus.” (Bento XVI–2012).
Francisco também citou a retomada das relações de Cuba com os Estados Unidos da América do Norte. “Estamos sendo testemunhas de um acontecimento que nos enche de esperanças: o processo de normalização das relações entre dois povos, depois de anos de distanciamento. É um processo. É um símbolo da vitória da cultura do encontro, do diálogo. […] Quero estar entre vós como missionário da misericórdia, da ternura de Deus, mas consenti-me de encorajar também vós para que sejais missionários do amor infinito de Deus. A ninguém falte o testemunho da nossa fé, do nosso amor. Todo o mundo saiba que Deus perdoa sempre, que Deus é sempre ao nosso lado, que Deus nos ama”. (Papa Francisco–2015)
Fidel Castro não foi lembrado pelo mundo tão somente por sua figura emblemática como líder político como também por sua relação com o sentido da fé e da crença em um Ser Superior.
(Gil Barreto Ribeiro, professor emérito da PUC Goiás e diretor editorial da Editora Espaço Acadêmico)