Discurso do Papa Francisco aos prefeitos
Diário da Manhã
Publicado em 14 de janeiro de 2016 às 21:47 | Atualizado há 9 anos
No dia 21 de julho de 2015 – depois de entregar a Carta dos Movimentos Populares – o Papa Francisco falou de improviso no Encontro Mundial dos Prefeitos (cerca de cem das maiores cidades do mundo), organizado pela Pontifícia Academia das Ciências Sociais, para enfrentar duas emergências interligadas: a crise climática e as novas formas de escravidão.
Após saudar os prefeitos, Francisco inicia o seu discurso dizendo: “Agradeço-vos sinceramente, de coração, o trabalho que fizestes. É verdade que tudo se referia ao tema do cuidado do meio ambiente, da cultura do cuidado do meio ambiente. Mas essa cultura do cuidado do meio ambiente não é unicamente uma atitude – digo-o no bom sentido da palavra – ‘verde’, não é uma atitude ‘verde’, mas muito mais. Ou seja, cuidar do meio ambiente significa uma atitude de ecologia humana. Isto é, não podemos dizer: a pessoa está aqui e a criação, o meio ambiente, está ali. A ecologia é total, é humana. Foi o que eu quis dizer na Encíclica ‘Laudato si’: que não se pode separar o ser humano do resto; há uma relação de incidência mútua, quer do ambiente sobre a pessoa, quer da pessoa sobre o modo como ele cuida do meio ambiente; e há também o efeito de repercussão contra o ser humano quando o meio ambiente é maltratado.”
Continua o Papa: “Por isso, a uma pergunta que me dirigiram, eu respondi: não é uma Encíclica ‘verde’, mas social, porque no contexto social, na vida social dos seres humanos, não podemos separar o cuidado do meio ambiente. Ainda mais, o cuidado do meio ambiente é uma atitude social, que num certo sentido nos socializa – cada um pode atribuir-lhe o valor que quiser – e, além disso, nos leva a receber da ‘criação’ (gosto da expressão italiana ‘criação’, quando se fala do meio ambiente), daquilo que nos foi concedido como dom, ou seja, o meio ambiente.”
Diz ainda Francisco: “Por outro lado, qual é o motivo dessa iniciativa, que me pareceu uma ideia – da Pontifícia Academia das Ciências Sociais, de D. Sánchez Sorondo – muito fecunda, de convidar os prefeitos das grandes cidades e não tão grandes para vir aqui e falar sobre isso? Porque um dos aspectos que mais se notam, quando não se cuida do meio ambiente, da criação, é o crescimento incomensurável das cidades.”
O Papa acrescenta: “Trata-se de um fenômeno mundial. É como se as cabeças, as grandes cidades, se desenvolvessem, mas sempre com cinturões de pobreza e de miséria cada vez maiores, onde as pessoas padecem os efeitos da degradação ambiental. E neste sentido, envolve o fenômeno migratório. Por que razão as pessoas chegam às grandes cidades, engrossando os cinturões de pobreza – as ‘villas miséria’, as barracas, as favelas? Por que fazem isto? Simplesmente porque o mundo rural não lhes oferece oportunidades.”
Francisco lembra: “E um ponto que se encontra na Encíclica – com muito respeito, mas é necessário denunciá-lo – é a idolatria da tecnocracia. A tecnocracia leva a destruir o trabalho e cria desemprego. Os fenômenos de desemprego são muito grandes, e por isso as pessoas são obrigadas a emigrar, procurando novos horizontes. O número crescente de desempregados é alarmante! Não disponho de estatísticas, mas em determinados países da Europa, sobretudo entre os jovens, o desemprego juvenil – de 25 anos para baixo – supera 40% e nalguns casos chega a 50%. De 40% a 47% – refiro-me a outros países – e 50%. Penso em outras estatísticas sérias apresentadas pessoalmente por Chefes de Governo, por Chefes de Estado.”
Afirma, pois: “E isso, projetado para o futuro, leva-nos a ver um fantasma, ou seja, uma juventude desempregada. E hoje que horizonte e que futuro se pode oferecer a ela? O que sobra para esta juventude? As dependências, o aborrecimento, a incerteza sobre o que fazer da própria existência – uma vida sem sentido, muito dura, ou o suicídio juvenil – as estatísticas de suicídio dos jovens não são publicadas na sua totalidade – ou procurar um ideal de vida em outros horizontes, inclusive em projetos de guerrilha.”
Prefeitos – participantes do Encontro – todos os prefeitos do mundo e todos/as nós, meditemos sobre o discurso do nosso irmão, o Papa Francisco. Chegou a hora de tomarmos decisões claras e objetivas, que levem a uma verdadeira mudança de comportamento e de estruturas. O tempo urge!
(Continua no próximo artigo).
Em tempo: mais uma vez o jornalista João Aquino (da tropa de choque do Governo ditatorial de Goiás), no artigo “Gestão compartilhada não é privatização” (Diário da Manhã do dia 12), tentou desqualificar a minha pessoa usando uma linguagem tão baixa que dá nojo. Em sua ignorância, ele não percebe que o efeito produzido é justamente o contrário do pretendido. Responder a um artigo como esse seria se colocar no mesmo nível. Seu único lugar digno é o lixo.
(Fr. Marcos Sassatelli, frade dominicano, doutor em Filosofia (USP) e em Teologia Moral (Assunção – SP), professor aposentado de Filosofia da UFG – E-mail: [email protected])