Dogma
Redação DM
Publicado em 1 de fevereiro de 2016 às 22:20 | Atualizado há 10 anos
Saiu, esta semana, na Revista Veja, o ranking internacional do conselho Cidadão para a Segurança Pública e a Justiça Penal, uma organização não governamental do México com experiência no acompanhamento e compilação de dados sobre violência.
Goiânia e aparecida de Goiânia dividem a 29ª posição entre as 50 cidades mais violentas do mundo, com 43,38 homicídios por ano para cada grupo de 100 mil habitantes.
No ranking nacional, estas duas cidades figuram na 11ª colocação entre as cidades do Brasil.
Goiânia é a cidade mais desigual da América Latina e ocupa a 10ª posição de mais desigual do mundo.
O Relatório divulgado ontem pelo Programa das Nações Unidas para os Assentamentos Humanos (ONU-Habitat) revelou que, mais uma vez, Goiânia é a cidade brasileira mais desigual do País e, pior: desta vez figura como a décima com distribuição de renda menos igual do mundo.
De acordo com o relatório Estado Mundial das Cidades 2008/2009 do Programa das Nações Unidas para Assentamentos Humanos (ONU-Habitat), a Região Metropolitana de Goiânia possui a maior concentração de renda dentre as 19 áreas analisadas da América Latina. De acordo com o relatório, a região da Grande Goiânia apresenta índice Gini de 0,65, enquanto que o ideal é cerca de 0,4. Se Goiânia fosse um país, seria o segundo mais desigual do mundo, atrás apenas da Namíbia.
Este resultado, segundo o professor do Instituto de Estudos Socioambientais (Iesa), da Universidade Federal de Goiás (UFG), João Batista de Deus, demonstra que uma pequena parcela da população que aqui vive ganha bons salários, enquanto outra parcela, sem qualificação profissional, tenha baixo poder aquisitivo. Em regiões como a de São Paulo, mesmo as populações mais carentes recebem salários melhores que os radicados em Goiás.
Para mudar esta situação, João de Deus aposta na melhoria da educação. “Como os adultos pobres que moram em Goiás, em geral, têm pouca qualificação profissional, é preciso, além das ações de governo que já visam reduzir essas discrepâncias, investir nas escolas. Temos de ter como meta salvar a geração seguinte e a educação é fundamental”, explica o professor.
Na avaliação do coordenador do relatório e diretor do Centro de Estudos e Monitoramentos das Cidades do ONU-Habitat, Eduardo Lopez Moreno, existe vínculo direto entre desigualdade e criminalidade. Mais do que custos sociais, o abismo entre ricos e pobres também provoca prejuízos econômicos. “É muito possível que a cidade mais desigual gere muito mais facilmente distúrbios e problemas sociais. As autoridades desses países vão deslocar recursos que deveriam ir para investimentos para conter esses movimentos sociais. O custo social acaba se traduzindo em custo econômico”, afirmou Moreno.
De acordo com o estudo Economia das Religiões, realizado pela Fundação Getúlio Vargas, Goiânia é a capital brasileira com o maior número de evangélicos. Dentre pentecostais e não pentecostais, um quarto dos goianienses declaram-se protestantes. Ao todo 80% da população é cristã, considerando-se evangélicos e católicos.
A pergunta é: como a cidade mais cristã do Brasil pode apresentar o maior índice de desigualdade social da América Latina e figurar entre as cidades mais violentas do mundo?
Porque o cristianismo ensina a repartir.
Jesus, tendo dado graças, partiu o pão e o deu aos seus discípulos recomendando: Tomai e comei. Em seguida, tomou um cálice e o entregou aos seus discípulos proclamando: Bebei dele todos vós.
Mas por aqui, tanta desigualdade e criminalidade parece normal. As pessoas vivem como se todos estes dados e estatísticas fossem apenas uma projeção de uma realidade distante.
O Estado de Goiás é o maior cliente da mídia goiana, que está refém de propagandas institucionais que nada condizem com a realidade.
Há 20 anos existe uma ditadura neoliberal legitimada pelo voto democrático, diga-se de passagem, que tem imposto ao Estado de Goiás dogmas que nada refletem a sua realidade.
A despeito das orientações de organizações de fiscalização da ordem democrática e social como o Ministério Público, o Governo de Goiás continua tentando impor através das propagandas institucionais sua vontade, como se não houvesse oposição.
É espantoso ver propagandas que agridem a população, dizendo ser ‘mentira’ tudo que se levanta como oposição neste Estado.
E a população se curva. Mas justificadamente.
Uma Capital desigual como a nossa, a primeira da América Latina, reflete a diferença de pensamentos e convicções pessoais e públicas, que jamais permitirão um consenso ou uma coalizão dentre todos os seus habitantes. É um Estado manipulável, alienado e descomprometido com a verdade.
Tenho adentrado as escolas púbicas estaduais, como apoiadora, e visto como há ali uma ditadura imposta por uma grade curricular que não permite o avanço do pensamento do proletariado. Está cativo. Crianças e adolescentes que não podem e não poderão discernir a conjuntura em que estão inseridos.
As propostas em pauta pelos estudantes vão além da escola pública, gratuita e de qualidade. Querem o debate em sala de aula, querem aulas humanizadas e dizem não a grade curricular da forma que está posta.
Mas este é o Estado ideal. Sem questionamentos, sem luta, sem parâmetros.
Entretanto, a revolução já começou por aqui. Uma revolução surpreendente, que tem como protagonistas crianças e adolescentes – gente de tenra idade que disse não a toda essa mentira.
Uma mentira que começa nos dogmas impostos pela burguesia que se sente confortável em ditar as regras para poder colher sozinha os louros de toda esta ilusão imposta.
Não tem arrego.
O levante dos estudantes goianos é um marco na vida de nossa sociedade, desta cidade e do nosso país, e já estão definitivamente fazendo história, mudando os rumos e destinos desta cidade-estado-nação fracassada.
E podem escrever: Goiás nunca mais será o mesmo.
(Silvana Marta de Paula Silva – advogada e escritora. Twitter:@silvanamarta15)