Opinião

Está na internet, é verdade

Diário da Manhã

Publicado em 7 de setembro de 2016 às 02:54 | Atualizado há 9 anos

A internet é o palco perfeito para a disseminação de mentiras e boatos. Impressiona a rapidez com que uma inverdade se espalha. E parece que quanto mais incrível – in (sufixo de negação) + crível (acreditável) – a informação, maior será a velocidade de sua propagação.

Já circula na rede, de há muito tempo, uma mentira a respeito da consequência de os eleitores votarem nulo na eleição.

Segundo as fontes do boato, se mais de 50% dos eleitores votarem nulo, a eleição será anulada e, em consequência, uma nova eleição será marcada. E não apenas isso, os candidatos que participaram do pleito anulado, estarão impedidos de participar da nova eleição.

Não parece perfeito?

Mas tudo isso é uma grande bravata. Mentira mesmo.

Como toda boa falsidade que se preze, essa também parte de uma verdade distorcida.O artigo 224 do Código Eleitoral disciplina a realização de novas eleições quando a nulidade atingir mais da metade dos votos. Veja-se:

Art. 224. Se a nulidade atingir a mais de metade dos votos do país nas eleições presidenciais, do Estado nas eleições federais e estaduais ou do município nas eleições municipais, julgar-se-ão prejudicadas as demais votações e o Tribunal marcará dia para nova eleição dentro do prazo de 20 (vinte) a 40 (quarenta) dias.

Como já foi alertado, trata-se de uma verdade distorcida.

O artigo 224 do Código Eleitoral não nos fala em votos nulos, mas de votos anulados. A diferença é gritante. Esse dispositivo diz, em síntese, que quando a Justiça Eleitoral, em decorrência de ilícitos praticados pelos candidatos, anular os votos por eles obtidos e, se essa nulidade, atingir mais de 50% dos votos, nova eleição será marcada. Desta forma, inicialmente os votos eram válidos, mas em decorrência de algum ilícito, foram anulados.

Situação diametralmente oposta ocorre quando o próprio eleitor, por manifestação política ou apolítica, decide votar nulo.

Nesse caso, pouco importa a quantidade dos votos nulos, a eleição será e permanecerá hígida.

Então, qual a consequência dos votos nulos? Melhor, qual a diferença entre os votos nulos e os votos brancos?

Comecemos pela última indagação. Atualmente, os votos nulos e os brancos possuem o mesmo efeito: ambos são inválidos.

Entretanto, até o ano de 1997, os votos brancos eram considerados válidos para fins da eleição proporcional, que como se verá, era, nesse caso, prejudicial aos pequenos partidos.

E qual a consequência dos votos nulos? Tantos os votos brancos e nulos poderão impactar, nas eleições para o Poder Executivo, para a determinação de realização, ou não, do segundo turno.

Como é cediço, nas eleições para presidente da República e governador dos Estados, caso nenhum candidato obtenha mais de 50% dos votos válidos (excluídos os votos brancos e os nulos), será realizado segundo turno com os dois candidatos mais bem votados. Na eleição municipal essa regra somente se aplica para os municípios que contarem mais de 200 mil eleitores.

Nas eleições em que exista a possibilidade de segundo turno, quanto mais votos nulos tiverem, melhor para o candidato que possua muitos votos e eleitorado cativo. A chance de vencer em primeiro turno aumenta.

Um exemplo para elucidar o que se afirmar: nas eleições de 2012, no município de Goiânia, o prefeito foi reeleito logo no primeiro turno em decorrência direta da quantidade de votos nulos dados naquele prélio eleitoral.

Já nas eleições proporcionais – vereadores, deputados estaduais e deputados federais – quanto mais votos nulos houver, menor o quociente eleitoral e, assim, mais fácil de ser eleito para aqueles candidatos/partidos que possuem muitos votos e eleitorado cativo.

Explica-se: nas eleições proporcionais deve-se calcular o quociente eleitoral – quantidade mínima de votos para se eleger um parlamentar – que é o resultado da divisão dos votos válidos (com a exclusão dos votos brancos e nulos) pelo número de vagas em disputa.

Concluindo, a quantidade de votos nulos e brancos não possui o condão de invalidar uma eleição, podendo, contudo, contribuir para aqueles candidatos que possuem eleitorado cativo.

 

Alexandre Azevedo, professor mestre em Direito Eleitoral da PUC-GO e da Unifan e assessor do TRE-GO

 

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