Opinião

Lista do Janot

Redação DM

Publicado em 21 de março de 2017 às 01:55 | Atualizado há 8 anos

Há uma paralisia no ar, como se as pessoas estivessem em compasso de espera, aguardando qual será o próximo passo. Melhor dizendo: qual o próximo escândalo a ser revelado, para indignação e vergonha da sociedade brasileira. Tal situação vem de anos atrás, como uma caudal que começa num filete, avoluma-se, ganha corpo e transforma-se em tsunami que arrasta tudo e todos, aos quais vai levando de roldão.

Claro que não há como ignorar ou empurrar para debaixo do tapete tanta corrupção, tanta desonestidade, tanta falta de vergonha no trato dos dinheiros arrecadados dos contribuintes. E, igualmente, no exercício de funções e atribuições que deveriam ser respeitadas e até sagradas, porque dizem respeito à saúde, à segurança, ao transporte, à habitação. E, já agora, à própria alimentação do povo brasileiro.

Enquanto as – digamos – revelações estiveram afetas à dinheirama roubada da Petrobras, muitos reagiam com certa dose de descrença e outro tanto de resignação: “Políticos roubam mesmo”, diziam, acrescentando que “são todos da mesma laia”. Claro que a gigante petrolífera saqueada resulta em ineficiência e consequente alta de preço dos combustíveis e também do gás de cozinha – o que impacta o orçamento esquálido da maioria. Mesmo assim, uma espécie de conformismo resignado contribuía para abaixar a poeira, esfriar a indignação, moderar a revolta.

Agora, com a “Operação Carne Fraca” da Polícia Federal escancarou-se a corrupção nos frigoríficos e empresas próximas, revelando-se também a desonestidade de funcionários remunerados para zelarem da saúde da quem paga seus salários. Mesmo o mais indiferente ou o mais alienado não pode furtar-se à repulsa e à indignação, diante do fato de que a cultura da esperteza e da enganação está a ameaçar até a comida que ingerimos. Com destaque para os menos favorecidos, aqueles que consomem as chamadas refeições ligeiras, sanduíches e similares à base de embutidos. Isso porque não dispõem de tempo, ou porque não têm dinheiro para pagar sequer um prato feito.

Sabe-se que, nos últimos anos, as exportações brasileiras de carne e derivados têm crescido de maneira expressiva, pelo que não devem faltar espiões e sabotadores atuantes na disputa por mercados. Pelo que foi revelado, entretanto, a safadeza criminosa foi exercitada em nível local, com a conivência de funcionários das empresas e de fiscais do Ministério da Agricultura a serviço de políticos ávidos por dinheiro.

De onde se volta ao problema da corrupção, onipresente na triste realidade dos nossos dias. Se a carne é fraca, fraquíssimos – senão inexistentes – são os padrões éticos que presidem à democracia de resultados em que vivemos. A farra dos partidos que se multiplicam, o marketing eleitoral superfaturado e descaradamente mentiroso, o arrivismo de grande parte da elite política – com destaque para o sindicalismo peleguista – desembocou na chamada Lista do Janot, que está a assombrar Brasília e a todos nós.

São aproximadamente 300 nomes de notáveis – deputados, senadores, governadores e ex-governadores, ministros e outros figurões mais – sobre os quais recaem suspeitas fundamentadas de alguma forma de corrupção. Isso sem falar em outros crimes, como lavagem de dinheiro, tráfico de influência, até mesmo roubo puro e simples, se assim se pode dizer.

Lista do Janot – que vergonha! Por antítese, faz lembrar a Lista de Schindler, na qual se relacionavam os judeus que um industrial alemão empregava e depois salvava do Holocausto nazista, durante a Segunda Grande Guerra. Uma lista do bem, portanto, inspirada na crença em valores como a caridade, a bondade e a fé no ser humano.

Fico a pensar em quanto precisamos de uma Lista do Brasil, na qual se explicitassem os nomes de pessoas e instituições que primem pela ética e pela moralidade, trabalhando com seriedade e competência para o bem de nossa pátria tão humilhada e vilipendiada.

A começar pelos notáveis: não os haverá corretos, honestos, idealistas, dedicados ao interesse público? Refiro-me a todos os níveis e aos três poderes da República:  no Executivo, no Legislativo e no Judiciário, contar-se-ão 300 cidadãos íntegros, probos em seu comportamento pessoal e público, que sejam exemplares para as novas gerações?

Há, certamente, muito mais do que isso. É preciso que essas pessoas saiam do anonimato e de sua zona de conforto e comodidade, e venham lutar por um País mais saudável, de mente, de corpo e de espírito. Com lista ou sem lista, faz-se absolutamente necessário resgatar nossa cidadania, acreditar em nosso País e em nós mesmos, entender que este é um mau momento que logo será ultrapassado. E lutar para que isso aconteça, com as armas da verdade e do trabalho, lastreadas no orgulho de sermos brasileiros.

 

(Lena Castello Branco

[email protected])


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