Mensalão – III
Redação DM
Publicado em 8 de abril de 2017 às 02:38 | Atualizado há 8 anosDia 24 de maio, Roberto Jefferson acusa o PT de ser traiçoeiro. O presidente nacional do PTB afirma que a relação entre os partidos é como a da fábula do escorpião e do sapo. Na fábula, o escorpião e o sapo celebraram um acordo para atravessar um rio. O escorpião prometeu ao sapo não mordê-lo se fosse carregado em suas costas. Porém, alegando não poder contrariar sua natureza, ele traiu a promessa, e mordeu o sapo. Como resultado, ambos morrem afogados. Segundo Jefferson,o PTB é o sapo da fábula.
Dia 25, da Coréia do Sul Lula tentava dissuadir os partidos aliados a apoiarem a CPI, no último dia para a criação da Comissão. À meia-noite, em sessão tensa no Senado, é criada a CPI Mista dos Correios. Dirigentes do PT decidiram tratar os parlamentares petistas que mantiveram suas assinaturas na Lista de criação da CPI como ‘bancada paralela’ dentro do partido. Os Correios entregaram ao Ministério Público do Distrito Federal os documentos e informações solicitados à Procuradoria Federal. As informações mais detalhadas diziam respeito ao ex-diretor Maurício Marinho denunciado na ‘Veja’, edição de 15 de maio; ao também diretor Antônio Osório Batista; e ao ex-assessor executivo Fernando Godoy. Também foram passados ao Ministério Público os nomes e qualificações das secretárias e dos motoristas, bem assim todas as agendas de compromissos e controle das ligações telefônicas dos três servidores, entre 2004 e 2005. O ‘Jornal da Paraíba’ publicou o artigo ‘CPI não é palanque’, do deputado federal Inaldo Leitão, em que o parlamentar dizia acreditar na honestidade do governo Lula, e que o objetivo da Comissão é servir de palanque eleitoral para a oposição.
Dia 26. Em entrevista ao ‘Jornal Nacional’, da TV ‘Globo’, o Ministro da Casa Civil , Jose Dirceu, criticou os parlamentares da base governista que apoiaram a criação da CPI dos Correios, afirmando que lugar de quem faz oposição no governo é a oposição’. Tem de buscar outro partido’.
Em telefonema a auxiliares, Lula reconheceu parcela de culpa pela criação da CPI, mas responsabilizou parlamentares do PT e do PCdoB pela derrota do governo.
Dia 27, Dissidentes do PT que apoiaram a criação da CPI em foco, iniciaram movimento para se defender das acusações de lideranças petistas de que estariam fazendo oposição ao próprio partido. O presidente do Senado descartou a possibilidade de o governo ocupar a Relatoria e ou a presidência da CPI. No Japão, Lula afirmou que a criação da CPI é uma tentativa de antecipar a disputa eleitoral de 2006.
Dia 28, o Governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, afirmou que o presidente Lula ‘não manda’ no País, e que o governo federal ‘não funciona’.
De volta a Brasília, Lula fez reunião de emergência na ‘Granja do Torto’ com ministros e aliados, a fim de traçar a estratégia do governo para enfrentar as investigações da CPI questionada.
Dia 29. ‘Veja’ publica reportagem em que revela que o corretor Henrique Brandão, proprietário da Seguradora Assurê e amigo do Deputado Federal Roberto Jefferson foi beneficiado por contratos milionários firmados com diretorias ocupadas por pessoas indicadas pelo PTB em outras estatais, como a Infraero, a Eletronuclear e Furnas. Convencido de que não há mais como inviabilizar, regimentalmente, a CPI, Lula buscou indicar aliados, controlar a Relatoria, e acelerar o trabalho de investigação da Polícia Federal, visando a esvaziar a Comissão.
Dia 30, no Programa ‘Café com o Presidente’, Lula afirmou que ‘quem estiver torcendo para o fracasso do Brasil, vai quebrar a cara’.
Dia 31, em resposta a seu apoio à CPI, o ‘Campo Majoritário do PT’, cuja Chapa disputaria a presidência do PT em setembro daquele ano, seria encabeçada pelo Deputado.
O Procurador-Geral da República, Cláudio Fontenelles, defendeu a instalação das CPI dos Correios. Pesquisa do Instituto ‘Sensus’ indica que mais de 50 por cento dos brasileiros ouviram falar das acusações de corrupção nos Correios, e que 86 por cento apóiam a CPI. A mesma pesquisa aponta que, para um terço da população, a corrupção aumentou no governo Lula. Nas simulações para a corrida presidencial de 2006, contudo, Lula aparece à frente de José Serra, Geraldo Alckmin, Aécio Neves ou Fernando Henrique Cardoso, em todos os cenários
O governo mudou de estratégia, e acredita que pode inviabilizar a CPI na Comissão de Constituicão e Justiça da Câmara dos Deputados que vai analisar a constitucionalidade de sua criação, e onde o governo avalia que tem maioria. O presidente da Câmara, João Paulo Cunha, do PT, declarou, então, que não vai haver CPI, e que “a Câmara não vai compartilhar com essa idéia de fazer política eleitoral com antecedência” tamanha.
Dia 01 de junho, o autor do artigo “CPI não é palanque”, publicado no ‘Jornal da Paraíba’, a 25 de maio, Deputado Federal Inaldo Leitão, do PL, foi indicado Relator do Recurso contrário à CPI, e afirmou que trabalhará com integral ‘isenção’, assinou requerimento pela criação da CPI, e depois retirou sua assinatura, devido à pressão do PL, que pertencia à base aliada do governo. O Ministro da Integração Nacional, Ciro Gomes, atacou o ex-presidente FHC, afirmando que ele não tem ‘a mais remota preocupação com a ética’. Segundo o Ministro, ‘os que estão chafurdando na lama, devem dizer que o PT é igual a eles.
Dia 02. O Presidente do Superior Tribunal de Justiça, Ministro Edson Vidigal, disse apoiar a CPI, declarando que a ‘Comissão Parlamentar de Inquérito é um braço atuante do Congresso que serve para investigar irregularidades, e é um instrumento que nem nos tempos da Ditadura foi extinto’. Pressionado pela oposição, o Presidente do Senado convocou reunião para o dia 08 de junho, a fim de que líderes da base governista indicassem os nomes para a CPI. O Senador Renan Calheiros afirmou que, caso isso não fosse feito, ele mesmo nomearia os nomes da referida Comissão. O PT ameaçou retirar dos Deputados dissidentes o direito de concorrer às eleições de 2006. O governo estudava a liberação de Quatrocentos Milhões de Reais para Emendas de Deputados fiéis ao governo, nas articulações da CPI dos Correios.
- Em seu ‘site’ na Internet, a Revista ‘Veja’ divulgou uma entrevista com o ex-presidente do Instituto de Resseguros do Brasil, em que declarou que os indicados pelo PTB para cargos no governo federal deveriam recolher Cr$400.000,00 por mês para o partido. O governo avaliou que a crise poderia piorar, e que a estratégia para esvaziar a CPI poderia não Dar certo, diante de novas denúncias de corrupção.
- A Datafolha divulgou pesquisa apontando que 65% da população achava o governo Lula corrupto, e que 59% acreditavam que ele deixou de defender a maior parte das idéias que tinha antes de ser eleito presidente da República. Entre os que se declaravam petistas, esse percentual chegava a 42%.
- A ‘Folha de São Paulo’ publicou entrevista de Roberto Jefferson na qual o presidente nacional do PTB afirmava que o partido recebeu de Delúbio Soares, tesoureiro do PT, uma proposta de mesada para os parlamentares da base aliada Roberto Jefferson cunhou o termo ‘mensalão’. Segundo o Deputado, parlamentares do PP e do PL já recebiam Cr$30.000.00 cada um, em troca de apoio político. O presidente do PTB afirmou ter avisado sobre a existência do esquema aos Ministros Walfrido dos Mares Guia, do Turismo, José Dirceu, da Casa Civil, Ciro Gomes, da Integração Nacional, e Miro Teixeira, das Comunicações, além de informar o caso ao então líder do governo na Câmara, o ex-Deputado Aldo Rebelo. Por fim, Roberto Jefferson avisou ao Presidente Lula que, segundo ele, chorou ao saber do mensalão. Na entrevista, o Deputado ainda declarou já ter um caminho traçado: ‘Não me preocupa mais o mandato, não vou brigar por ele. Só não vou sair disso como um canalha, porque não sou’.
O presidente do PT, José Genoino, nega a existência do mensalão. Miro Teixeira e Ciro Gomes, porém, confirmam os relatos de Roberto Jefferson. O líder do governo no Senado, Aloizio Mercadante, afirmou que Lula de fato foi avisado por Roberto Jefferson, mas que a conversa não passou de um mero comentário sobre boatos não confirmados. Falando em nome do Palácio do Planalto, o Ministro Aldo Rebelo reconheceu que o presidente Lula sabia do caso desde março, mas que tentou dissociá-lo do Governo e PT, afirmando que as acusações envolviam apenas partidos políticos e não o governo.
O governador de Goiás, Marconi Perillo, do PSDB, afirmou ter avisado o Presidente Lula, em maio de 2004, sobre a tentativa de aliados de convencer Deputados a trocarem de legenda com a oferta de uma ‘mesada’ de Cr$40.000.00/mês e um ‘bônus’ de um milhão de Reais por ano. Segundo Marconi, Lula teria dito que esse esquema havia sido introduzido no Congresso pelo ex-ministro das Comunicações de FHC, Sérgio Motta, o ‘Serjão’. Líderes do PSDB recomendaram moderação na reação a fim de não alimentar a acusação de que a postura da oposição seria uma antecipação das eleições. Os tucanos temiam ser acusados de golpistas.
O Advogado Fábio Konder Comparato, presidente da Comissão de Defesa da República e da Democracia da OAB, disse que Lula poderia sofrer processo de ‘impeachment’ se fossem comprovadas as denúncias de suborno a deputados feitas por Roberto Jefferson, e a ligação do Presidente da República com o esquema.
(Licínio Barbosa, advogado criminalista, professor emérito da UFG, professor titular da PUC-Goiás, membro titular do IAB-Instituto dos Advogados Brasileiros-Rio/RJ, e do IHGG-Instituto Histórico e Geográfico de Goiás, membro efetivo da Academia Goiana de Letras, Cadeira 35 – E-mail [email protected])