Nova Lei Geral de Telecomunicações
Redação DM
Publicado em 27 de janeiro de 2017 às 01:50 | Atualizado há 8 anos
Vinte anos atrás, como era sua vida? Em duas décadas – uma verdadeira vida – você pode enumerar, tenho certeza, um sem-número de mudanças. Agora imagine o que são vinte anos para um setor em franca evolução tecnológica como as telecomunicações.
Em 1997, os serviços de internet no mundo passaram a contar – ainda de forma incipiente – com a transmissão de vídeos por streaming. Conta a história do streaming que a primeira exibição foi de um jogo de futebol americano, e considerando que isso se deu vinte anos atrás, sabemos que a qualidade daquelas imagens era bastante distinta daquelas às quais temos acesso hoje, a todo tempo, muitas vezes em nossos smartphones.
Também naquele ano, dizem os almanaques online que contam a história da internet, foi cunhada a expressão “web-blog”, em conceito de disseminação de conteúdos que depois se popularizaria – trazendo ao centro da rede o compartilhamento de experiências e de conhecimento, algo tão presente hoje em dia.
No Brasil, o surgimento de diferentes provedores de acesso – com o característico sinal discado e o ruído do estabelecimento de cada conexão – movimentava o mercado e a rede brasileira, ampliando o acesso e anunciando a chegada do futuro. Futuro? Quem em 1997, não sendo grande especialista no setor e mesmo com boa dose de vidência, imaginaria que as coisas estariam como hoje? Vídeos em streaming são coisa rotineira e você pode assistir filmes on demand, com qualidade HD, em sua casa a hora em que quiser. Pode ainda se deslocar no espaço geográfico, fazer as suas escolhas cotidianas para as mais diferentes finalidades com o apoio e a inteligência dos dados e o “controle social” derivado da vivência de outras pessoas. E o acesso à informação evolui a cada instante, com blogs, redes sociais e diferentes experiências de conexão.
Dei estes exemplos para introduzir um tema que está na agenda do dia do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações.
Falo da nova Lei Geral de Telecomunicações. Você sabe, leitor, e por isso uma breve comparação de 1997 com o que temos hoje na nossa internet, o quanto é necessário atualizar o marco legal que ainda hoje rege o sistema brasileiro de telecomunicações – legislação daquele ano da década de 90.
À época, o desafio era a universalização da telefonia, a ampliação do acesso a diferentes serviços e a criação de um mercado competitivo e com diferentes prestadores, em oposição ao monopólio estatal, incapaz de fazer frente às necessidades de setor tão impactado pelos avanços tecnológicos.
O marco legal de 1997 era adequado às necessidades da época e permitiu a universalização das telecomunicações, ofertando linhas e pacotes, telefonia pública (os “orelhões” que compunham a paisagem das nossas cidades) e abrindo novos caminhos com a pesquisa e o desenvolvimento tecnológico. A partir da competição, as empresas tiveram de investir em qualidade e alcance dos serviços, primeiro com ênfase na telefonia fixa e depois na telefonia móvel, além de buscar preços e tarifas atrativos ao consumidor. Além disso, o ganho de eficiência impulsionado pela pesquisa e desenvolvimento de operadoras deu condições de o país perseguir os avanços mundiais nos sistemas de telecomunicações.
Chegamos a 2017 em outro cenário, evidentemente. Temos hoje cerca de 40 milhões de linhas de telefonia fixa, número bastante inferior às quase 250 milhões de linhas de telefone celular. Outro dado que mostra como as coisas mudaram vem do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística): a proporção dos domicílios com acesso à internet no Brasil passou de 11,4% para 54,9% entre 2003 e 2014. O consumo de mídia online também cresce a cada ano, como mostra a pesquisa brasileira de mídia da Secom (Secretaria de Comunicação da Presidência da República) de 2016 – apontando a internet como o segundo meio pelo qual o cidadão mais se informa sobre o que se passa no país, com 49% das menções, atrás apenas da TV (isso sem mencionarmos a crescente sinergia entre televisão e internet).
Temos uma lei envelhecida, que atendeu ao que o país precisava por diversos anos. Mas que hoje não faz mais sentido para o setor – e para o cidadão, por consequência, considerando-se que a telefonia fixa perde espaço para os serviços mobile, de dados, imagem e voz.
O desafio agora – para fazer frente às nossas necessidades comunicacionais, por exemplo de internet rápida e com qualidade nas mais diferentes regiões – é que o sistema de telecomunicações se ampare estrategicamente na previsão de investimentos em banda larga. Banda larga sim, a busca pela sua universalização e em pacotes de acesso ilimitado, é o que o Brasil precisa.
Por isso, ressalto a importância da Nova Lei das Telecomunicações (PLC 079/2016), que tramitou por anos na Câmara dos Deputados e neste momento está em processo final de discussão do Senado, devendo passar em breve à sanção presidencial.
O projeto permite que as operadoras da telefonia optem pela modalidade pela qual prestam os serviços, passando de concessão para o regime privado de autorização. A adaptação de outorgas se dará mediante contrapartidas firmemente fiscalizadas: cumprimento da obrigação de continuidade dos serviços de telefonia e obrigações de investimento em banda larga. Com compromissos de universalização e continuidade.
A expansão da banda larga também se valerá, em breve, das possibilidades oferecidas pelo satélite geoestacionário brasileiro – parceria entre o Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações e Defesa, e que estará em órbita neste semestre –, tornando o acesso à internet mais rápido e eficiente em regiões remotas.
A nova Lei de Telecomunicações define a destinação de bens herdados pelas operadoras no processo de privatização do antigo sistema Telebrás. Bens que teriam de ser devolvidos à União em 2025 quando do fim dos contratos de concessão em vigor atualmente, em valores estimados em R$ 20 bilhões, se converteriam em compromisso de investimento.
Superando-se a insegurança jurídica alegada pelo mercado sob esse prazo de mais alguns anos, as operadoras incorporarão esses bens, pagando com o investimento adequado em infraestrutura de banda larga. A lei determina que a valoração desses bens – que envolvem desde redes de infraestrutura, de equipamentos, até imobiliários e outros itens – seja feita por amplo estudo com a participação da Anatel, Ministério da Fazenda e Tribunal de Contas da União.
E também não faz sentido a União retomar uma infraestrutura defasada, obsoleta e com depreciação contínua de seu valor. O Brasil já adotou como premissa para o desenvolvimento do setor de telecomunicações o investimento privado, o avanço tecnológico sob a adequada supervisão do Poder Público, com foco total nas necessidades do cidadão. E isso é irreversível.
E tem ainda a marca de garantia da continuidade nos serviços de telefonia fixa e celeular, determinando que sejam mantidos em áreas sem a necessária competição de mercado.
Brevemente, por fim, a lei estabelece ainda a possibilidade de mais investimentos de ordem geral no setor, autorizando atração de recursos para composição do capital de empresas que operam no Brasil.
O Poder Público tem o dever de criar as condições de desenvolvimento e expansão dos serviços aos cidadãos – para além de disputas políticas, defesas de privilégios e modelos ultrapassados. É isso o que advogamos para as nossas telecomunicações – para o Brasil perseguir o futuro, e fazer frente às necessidades de país que busca o desenvolvimento, qualidade de vida e conhecimento para o cidadão e relevância no tabuleiro mundial da tecnologia.
(Gilberto Kassab, ministro da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações)