Opinião

O crescimento perdido

Redação DM

Publicado em 12 de outubro de 2018 às 23:38 | Atualizado há 7 anos

A so­ci­e­da­de bra­si­lei­ra vi­ve uma ex­pe­ri­ên­cia dra­má­ti­ca:

  1. Os mais des­va­li­dos so­frem com a ine­fi­ci­ên­cia do go­ver­no no su­pri­men­to dos bens mais bá­si­cos – sa­ú­de, edu­ca­ção, sa­ne­a­men­to e se­gu­ran­ça. Os re­me­di­a­dos pa­gam du­as ve­zes pe­los mes­mos ser­vi­ços. Tu­do is­so, a des­pei­to de…
  2. En­fren­tar uma car­ga tri­bu­tá­ria bru­ta mui­to al­ta e mui­to mal dis­tri­bu­í­da. A si­tu­a­ção foi se tor­nan­do mais crí­ti­ca à me­di­da que o de­sen­vol­vi­men­to eco­nô­mi­co mur­chou e atin­giu o pa­ro­xis­mo, quan­do che­ga­mos, no go­ver­no Dil­ma, ao de­sem­pre­go de 13% da po­pu­la­ção eco­no­mi­ca­men­te ati­va, que se re­duz mui­to len­ta­men­te.

A si­tu­a­ção fis­cal agra­vou-se des­de 2012 com o rá­pi­do cres­ci­men­to das des­pe­sas re­ais do go­ver­no cen­tral, pro­du­to do vo­lun­ta­ris­mo da po­lí­ti­ca eco­nô­mi­ca e do pro­je­to de “ga­nhar a elei­ção a qual­quer cus­to”, que con­ti­nuou mes­mo de­pois da re­ces­são a par­tir de me­a­dos de 2014.

O grá­fi­co abai­xo mos­tra cla­ra­men­te que a des­pe­sa re­al au­men­tou até me­a­dos de 2016. A par­tir daí, es­ta­bi­li­zou-se, mas a re­cei­ta só vol­tou a cres­cer gra­ças ao pe­que­no au­men­to do ní­vel de ati­vi­da­de, a par­tir de 2017.

O dé­fi­cit acu­mu­la­do em 12 mes­es vem se fe­chan­do, tam­bém len­ta­men­te. Não há, por­tan­to, ne­nhu­ma evi­dên­cia de que­da na des­pe­sa re­al do go­ver­no cen­tral, a não ser a pro­du­zi­da pe­la pró­pria Dil­ma em 2015.

Não creio que ha­ja al­gum ci­da­dão ra­zo­a­vel­men­te in­for­ma­do no Bra­sil que não te­nha a con­sci­ên­cia do la­men­tá­vel es­ta­do em que se en­con­tram as nos­sas fi­nan­ças e as con­se­quen­tes ten­sões so­ci­ais que se vêm acu­mu­lan­do.

Des­de a gra­ve cri­se mun­di­al de 1979-1980, não con­se­gui­mos re­en­gre­nar nos­so cres­ci­men­to. Em ape­nas dois mo­men­tos – um no go­ver­no Sar­ney (1985-1990) e ou­tro no go­ver­no Ita­mar Fran­co (1993-1994) – cres­ce­mos mais que o mun­do: 4,2% an­te 4%, em mé­dia, no pri­mei­ro, e 5% con­tra 2,7%, no se­gun­do.

Sar­ney lu­tou mui­to pe­lo seu man­da­to. Nun­ca con­tou com o apoio do “nú­cleo” do par­ti­do que o ha­via ad­mi­ti­do no jo­go elei­to­ral opor­tu­nis­ta que, ao fi­nal, aca­bou ele­gen­do Tan­cre­do Ne­ves. Te­ve um mo­men­to de gló­ria com o Pla­no Cru­za­do, mas ter­mi­nou com uma ta­xa de in­fla­ção de 1.621% em 1990.

O pi­or foi que au­to­ri­zou um es­tú­pi­do de­fault que atras­ou uma dé­ca­da a ne­go­ci­a­ção da dí­vi­da ex­ter­na. Ita­mar fez um su­pe­rá­vit pri­má­rio de 5% do PIB e apoi­ou o ilus­tre fu­tu­ro mi­nis­tro da Fa­zen­da, Pe­dro Ma­lan, a fe­char o acor­do da dí­vi­da ex­ter­na.

No mais, as coi­sas an­da­ram mui­to mal em ma­té­ria de cres­ci­men­to, ape­sar de re­for­mas e me­lho­ras ins­ti­tu­ci­o­nais que co­me­ça­ram com o go­ver­no Col­lor (1990-1992). Vi­mos o cres­ci­men­to do nos­so PIB re­du­zir-se a me­nos 1,2%, en­quan­to o mun­do cres­cia a 2,8%.

Na oc­ta­e­té­ri­de fer­nan­dis­ta (1995-2002) as­sis­ti­mos à exe­cu­ção do Pla­no Re­al, uma pe­que­na joia em ma­té­ria de con­tro­le da in­fla­ção, ini­ci­a­do por Ita­mar Fran­co. Pro­du­ziu avan­ços no­tá­veis e uma tra­gé­dia: o ins­ti­tu­to da re­e­lei­ção. De­pois de nos le­var ao FMI du­as ve­zes, ter­mi­nou com um cres­ci­men­to mé­dio do PIB de 2,4%, con­tra 3,5% do mun­do.

O úl­ti­mo sur­to de cres­ci­men­to, aju­da­do pe­la me­lho­ra das re­la­ções de tro­ca, foi com Lu­la (2003-2010), mas, mes­mo as­sim, cres­ce­mos, em mé­dia, 4,1%, pra­ti­ca­men­te igual ao cres­ci­men­to mun­di­al (4,2%), ou se­ja, fi­ca­mos pa­ra­dos.

Com Dil­ma, o cal­do en­tor­nou de vez: cres­ce­mos 0,4%, em mé­dia, con­tra 3,6% do mun­do. A par­tir de 2012, ti­ve­mos o pi­or quin­quê­nio do sé­cu­lo em ma­té­ria de cres­ci­men­to. Do se­gun­do tri­mes­tre de 2014 ao quar­to tri­mes­tre de 2016, nos­so PIB per ca­pi­ta caiu mais de 9%.

Seu go­ver­no dei­xou um ras­tro de “es­que­le­tos”: 7,4 mil obras pa­ra­das pe­lo “fes­ti­val” dos PACs e uma aven­tu­ra no se­tor elé­tri­co (MP nº 579) que ain­da vai con­su­mir mais de 100 bi­lhões de re­ais dos bra­si­lei­ros.

Pa­ra en­cur­tar a me­ló­dia, en­tre 1980 e 2017, o PIB per ca­pi­ta do Bra­sil em pa­ri­da­de de po­der de com­pra de 2010 cres­ceu 30,6% (0,7% ao ano), en­quan­to o PIB per ca­pi­ta mun­di­al cres­ceu 69,2% (1,4% ao ano). Sem cres­ci­men­to nun­ca vol­ta­re­mos ao equi­lí­brio. Com o tris­te me­nu que, pa­re­ce, se­rá ser­vi­do nes­ta elei­ção, há sé­rias dú­vi­das se va­mos re­cu­pe­rá-lo.

 

(Del­fim Net­to For­ma­do pe­la USP, é pro­fes­sor de Eco­no­mia, foi mi­nis­tro e de­pu­ta­do fe­de­ral)


Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

Impresso do dia

últimas
notícias