O povo brasileiro vive uma séria crise ética
Diário da Manhã
Publicado em 23 de junho de 2017 às 23:22 | Atualizado há 8 anosO que é ser ético? Você é ético? Nós somos éticos? Em meio a tanta notícia sobre corrupção no Brasil nos últimos tempos, essas questões vêm à tona a todo momento, nas rodas de conversas. O momento é mais que propício para se discutir ética.
A Ética é a ciência da moral. É ela quem sinaliza o desenvolvimento histórico e cultural da humanidade. Ao longo da história, a evolução da ética é determinada pela mudança dos valores morais e por leis de cada época. Se na civilização grega a conduta do indivíduo determinava o bem-estar coletivo, na Idade Média o conceito de ética muda radicalmente, com influência forte da Igreja que impõe que só o encontro do homem com Deus lhe permitirá atingir a felicidade. Já no Renascentismo, a ética se volta para o humanismo da Antiguidade, surgindo teorias éticas que se afastam dos valores do cristianismo.
Na Idade Moderna, a ética retorna à busca da felicidade coletiva, retomando seu sentido original grego, vinculado com a política, compondo orientações para a realização plena do cidadão. Centralizar o foco na razão, com aposta na autonomia humana e na crença otimista do progresso foi a tônica da ética na Idade Contemporânea. O agir corretamente passa, não só pelo conceito de liberdade, mas também de responsabilidade pelos próprios atos e intenções.
Mas, no século XX a ética entra em crise. O ser humano passou a centralizar-se no consumo e no individualismo e deixou de lado, no mundo capitalista, a preocupação com a coletividade. A preocupação com o outro foi substituída pelo egoísmo, focando ações apenas no eu em detrimento do nós. A competição ganhou força.
E é na competição que a sociedade capitalista ainda vive. Todos se digladiando pela sobrevivência, tomam atitudes que revertem em apenas benefícios próprios. Nessa seara, os valores morais de outrora, como a ajuda mútua, por exemplo, são deixados de lado.
No Brasil atual, quando uma infinidade de atos de desonestidade é descoberta quase todos os dias, há, em setores da sociedade, uma discussão acerca da ética. Numa pesquisa recente, feita pelo Datafolha e encomendada pelo Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial (ETCO), 90% dos jovens pesquisados, na faixa etária entre 14 e 24 anos, afirmou que a sociedade brasileira é pouco ou nada ética. Para 57% dos entrevistados os próprios familiares foram considerados pouco ou nada éticos. Quando perguntados se são éticos, 63% se consideram e apenas para 8% deles é possível ser ético o tempo todo. Entre as profissões, apontaram como mais éticos os bombeiros e os professores (com notas 8,7 e 8,5). Já os políticos, com nota 2,2, foram os menos éticos, segundo os entrevistados.
Tomando como base os políticos, que na atualidade amargam altos índices de rejeição pelas notícias divulgadas diariamente pela mídia, percebemos que os brasileiros têm consciência do que é ser antiético, mas, por outro lado, se esquecem que as ações desvirtuadas estão em outras atitudes que, por serem consideradas pequenas, não são levadas em consideração quando se discute a ética. Qual a diferença entre roubar uma agulha ou milhões de reais? Para muitos a diferença está no valor da coisa roubada. E é aí que reside o grande engano. O que importa não é o valor, mas a ação. E ação desonesta é o que não falta no dia a dia do brasileiro. Comprar produto pirata, furar fila, não respeitar a sinalização de trânsito, puxar o tapete do colega, dar o famoso jeitinho para resolver problemas pessoais. Tudo isso tem o mesmo valor, na escala da moralidade, que a ação de políticos que desviam milhões de reais dos cofres públicos ou recebem propina para beneficiar grupos.
A crise ética pela qual estamos passando só deixará de existir quando retomarmos os valores da coletividade, deixando de lado atitudes egoístas. Sem essa inversão dos valores atuais, o País não sairá desse descalabro em que, mesmo no advento da comunicação massificada, o homem se vê cada dia mais isolado no seu mundo de interesses próprios.
(Antônio Dirceu Pinheiro, radialista e jornalista)