O que é o “instinto do trabalho” – e como desenvolvê-lo?
Redação DM
Publicado em 24 de janeiro de 2017 às 01:32 | Atualizado há 8 anos
No meu último artigo no jornal Diário da Manhã , de 22.1.17, disponível em “impresso.dm.com.br”, eu disse que sem terem aprendido a trabalhar, no momento certo (infância tardia e adolescência), muitas pessoas irão usar sua “energia vital” apenas para a busca do prazer biológico, e não para o prazer social, isto é, o prazer da realização, o prazer do trabalho. Todo ser humano tem uma “energia para a ação”, coisa que os psiquiatras franceses M. Dide e P. Guiraud denominaram “hormé”. Esta energia tem de ser canalizada para a realização laboral, para a responsabilidade ocupacional, para os feitos concretos e organizados sobre o mundo (os judeus sabendo disso, obrigam os filhos a aprenderem alguma tarefa manual/braçal na infância/ adolescência, tanto é que Jesus era carpinteiro, Saulo era tecelão, Espinosa era polidor de vidros, etc) . A energia vital, hormé, do ser humano, tem de ser castrada, disciplinada, orientada para a realização de coisas concretas. É preciso dar amor e afeto da criança/adolescente, para podermos cobrar deles a realização de ocupações. E , quando eles realizarem o fato concreto, que pode ser desde a leitura de um livro até a poda de uma árvore, temos de elogiá-los, abraçá-los, beijá-los, ou seja mostrarmo-nos satisfeitos com eles como se tivessem feito os maiores trabalhos do mundo, como se fossem as pessoas mais importantes do mundo. Estas atitudes irão “fixar” na mente infantil/juvenil o gosto por uma coisa que, de início, não lhes parecia prazerosa ( poucos nascem sabendo gostar do trabalho, poucos já nascem com uma “obsessão pronta” pela realização laboral ). Passarão, eles mesmos, a reproduzirem a atitude dos pais e passarão a olhar e gostar de seus próprios feitos. Introjetarão a felicidade dos pais e passarão a ter felicidade consigo mesmos, com o próprio esforço, com o próprio trabalho. O “instinto da ação” terá encontrado a “felicidade da ação”. Não será uma “ação instintiva”, que não é passiva e não traz felicidade; será uma ação própria, algo ativo, e isso traz felicidade e calma. Sem esta disciplina e sem estes estímulos, a criança/jovem irá dirigir sua energia apenas para as coisas “biológicas”, sexo, agressão, ação externa, bebidas, drogas, comidas, baladas, “festas”, “alegrias”. Só que estas coisas não trazem “calma”, felicidade, não preenchem. Aí essa energia vai ficando “escura”, vai ficando cada vez mais tensa, mais bruta, mais selvagem, mais profunda – isso porque o ser humano não se agüenta sozinho, não agüenta apenas “curtir”, ele tem de “realizar” alguma coisa . É uma energia descontrolada, algo que Freud chamou “instinto de morte”, ou “pulsão de morte”. A aniquilação é o futuro, tanto é que essas pessoas praticamente nunca vivem muito tempo, todos matam ou procuram a morte ( vide o gosto que os rebelados têm em matar, e até em morrer ).
A Sociedade atual, para fugir do “machismo patriarcal” antigo ( que era ruim mesmo ) , optou por abolir a disciplina ocupacional sobre as crianças e adolescentes. O resultado está aí.
(Marcelo Caixeta ( [email protected]) é médico psiquiatra, especialista em psiquiatria da infância ( Univ de Paris XI ) e em psiquiatria criminal [forense] ( Assoc.Bras.Psiq.) Artigos no Diário da Manhã ( impresso.dm.com.br) as terças, sextas, domingos. )