Opinião

Obras inacabadas, até quando?

Diário da Manhã

Publicado em 5 de julho de 2016 às 01:54 | Atualizado há 9 anos

Assistindo reunião do Fórum Permanente do Setor Energético de Goiás na sede do Crea (Conselho Regional de Engenharia e Agronomia), pude acompanhar a preocupação dos presentes quanto à necessidade de implantação de um modelo sustentável para Goiânia, levantado pelo Codese (Conselho de Desenvolvimento Econômico Sustentável Estratégico).

A sua proposta é a de levar aos pré-candidatos à sucessão do prefeito Paulo Garcia a importância do desenvolvimento econômico e social, da preservação ambiental e das condições de vida dignas à população. No decorrer da apresentação das linhas gerais do projeto, o representante do Crea-GO, Dolzonam Mattos, teceu rápidas considerações sobre a falta de continuidade nas obras públicas de cada administrador.

As palavras do orador me levaram para bem distante. Numa reflexão pensei com os meus botões quanto desperdício com o dinheiro do contribuinte. Tal fato se dá de maneira corriqueira nas prefeituras municipais, nos governos de Estado e na União. É dinheiro jogado fora porque o sucessor dificilmente quer concluir a obra de seu antecessor. O pretexto é o mais é esdrúxulo possível e desrespeitoso com a sociedade que pena para pagar impostos e taxas de serviços.

Posso citar alguns exemplos e ignorar outros por absoluto esquecimento. Mas, eles estão aí e são marcantes. Mauro Borges fez nos idos de 60 uma experiência agrária nos moldes das colônias agrícolas de Israel, tendo como modelo o kibutz, em Alto Paraíso, e o governo de Ary Valadão implantou um projeto de fruticultura no mesmo município. Trata-se de uma região pobre e os projetos de ambos constituíam uma alternativa de renda para os seus moradores. Os sucessores ignoraram a proposta de alto cunho social e econômico e os projetos implantados pelos ex-governadores não tiveram a devida continuidade.

Alguém já utilizou o refrão do “Brasil, cemitério de obras inacabadas”. É incrível. Mas, é pura verdade. Jânio Quadros não se animou a tocar pra frente a Belém-Brasília porque em sua visão estreita “a estrada não levava ninguém a lugar nenhum”. A obra notável de Juscelino foi ampliada e acabada no governo militar de Médici.

Embora JK tenha sido cassado pelos militares, sua obra mereceu novos investimentos porque interligava o Brasil de norte a sul, de leste a oeste. Hoje, às suas margens ou sob sua influência encontram-se cidades progressistas como Anápolis, Uruaçu, Gurupi, Porangatu, em Goiás, Palmas, Araguaína e Estreito, no Tocantins. Em resumo, integrou estados como Goiás, Tocantins, Maranhão e Pará. O mesmo Médici construiu a Transamazônica, outros, no entanto, quiserem dar continuidade. Atualmente, muitos percebem a sua importância econômica, social e uma obra de integração nacional.

Para a Copa Mundial no Brasil, além do vexame da seleção, a construção ou reforma de 12 estádios ficaram por acabar. Se as obras iriam custar cerca de 400 milhões cada, os valores superaram em regra a casa do bilhão de reais. Superfaturamento e obra inacabada.

O PAC foi um engodo, uma tentativa de ludibriar a boa-fé do cidadão, ludibriar o interesse do País com propostas jamais concretizadas. Há no Brasil um baixíssimo índice de infraestrutura, estradas, portos e aeroportos. Obras públicas, como hospitais, escolas, são poucas.

De Norte a Sul do Brasil, milhares de empreendimentos iniciados com o dinheiro público estão parados, sem perspectiva de retomada. Um levantamento feito pelo ‘Estado’, jornal editado em São Paulo, mostra que há, pelo menos, cinco mil obras paralisadas no País inteiro, num total de investimentos de mais de R$ 15 bilhões. Os projetos estão espalhados por vários setores e incluem restauração e pavimentação de rodovias, expansão de ferrovias, escolas, construção de prédios públicos e saneamento básico.

Segundo o conceituado jornal paulistano, “com um atraso secular em suas metas de expansão e de investimentos em ferrovias, há mais de dois anos o Brasil se dá ao luxo de simplesmente abrir mão do uso de uma ferrovia pronta e moderna, uma estrutura que já custou mais de R$ 4,2 bilhões aos cofres públicos e que poderia ter iniciado uma revolução no mapa logístico nacional”.

No trecho de 855 km da Ferrovia Norte-Sul, entre Palmas (TO) e Anápolis (GO) é o retrato do desperdício e da irresponsabilidade com o bem público, confirma o Estadão.

É tanta sem-vergonhice com o dinheiro oriundo do contribuinte que nem o Ministério Público dá conta de tanta investigação. As desculpas são as mais esfarrapadas. A necessidade de revisão do plano arquitetônico, atualização de valores corroídos pelos custos. E, assim, por diante.

Essa mentalidade tacanha de não dar prosseguimento às obras do antecessor precisa ser mudada. A ideia do Codese de assegurar continuidade das obras públicas deve ser levada ao conhecimento de todo o País. Disseminada pelos municípios, pelos Estados. E não ficar restrita apenas a Goiânia. Os casos de corrupção nas obras devem ser apurados e seguir o exemplo da Lavajato, punindo os autores das irregularidades como superfaturamento de preços.

 

(Wandell Seixas, jornalista voltado para o agro, bacharel em Direito e Economia pela PUC-GO, ex-bolsista em cooperativismo agropecuário pela Histradut, em Tel Aviv, Israel, e autor do livro O Agronegócio passa pelo Centro-Oeste)

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