Opinião

Organizações Sociais (OSs) na educação

Redação DM

Publicado em 18 de março de 2016 às 00:51 | Atualizado há 9 anos

O sistema capitalista caracteriza-se por elevada capacidade na geração de riqueza alimentada pelo contínuo aperfeiçoamento das tecnologias utilizadas em seus processos produtivos, motivada pela concorrência e a insaciável necessidade de geração de lucros para manter em expansão seu processo de acumulação de capital garantindo, assim, sua sobrevivência.
Isto,sem dúvida alguma, traz benefícios à sociedade com a redução dos custos de produção e, em decorrência, diminuição dos preços dos produtos, elevando o nível de bem-estar de grande parte da população devido, também, a introdução de novos produtos para consumo. Traz, ainda, elevação do nível de renda de parte da população empregada, tanto nas empresas privadas como para expressivo percentual da população empregada em diversos segmentos do aparato governamental mas, também, acentua as desigualdades socioeconômicas para grande parte da população menos qualificada profissionalmente.
Assim, se por um lado, o sistema capitalista tem elevada capacidade de gerar renda e riqueza, por outro lado, é acentuada sua capacidade de gerar desigualdades sociais. São características inerentes ao funcionamento do sistema.
Como, então, minimizar ou, ao menos, diminuir este forte efeito nocivo à sociedade de concentrar a renda?
Cabe somente ao Estado desenvolver ações direcionadas a criação de uma sociedade mais justa. É sua única e exclusiva função.
Quando se atribui ao Estado,refere-se às ações que devem ser desenvolvidas por todas as esferas governamentais.
O Estado tem como obrigação garantir, de maneira eficiente, todos os serviços básicos que tragam a todo indivíduo o exercício de uma vida digna e saudável, como: emprego, transporte público, comunicação, segurança, moradia, infra-estrutura urbana, saúde e educação.
Torna-se evidente que, para a redução deste nível de desigualdade existente no Brasil, saúde e educação de boa qualidade deveriam ser garantidas, de forma universal e eficiente, a toda população de baixa renda. Isto é o mínimo que os gestores dos recursos públicos devem proporcionar a todo cidadão.
Agindo assim, e acompanhado de política tributária justa onde o imposto recaia com alíquota progressivamente elevada sobre a renda e a riqueza e não sobre as mercadorias, está-se minimizando as desigualdades socioeconômicas geradas pelo próprio sistema .
Como a função do Estado é, primordialmente, construir uma sociedade mais justa, as bases desta sociedade mais justa só são possíveis se edificadas na educação. Esta é a única opção capaz de reduzir o grau de miséria de qualquer país.
Aí aparece o grande desafio: como viabilizar um processo educacional onde todas as crianças, independentemente de sua situação econômico-financeira ou familiar, possam caminhar, proporcionando a estas crianças a mesma qualidade de conteúdo pedagógico com a correspondente igualdade na aprendizagem?
Por que, no Brasil, existe tão elevada disparidade entre a qualidade da educação da escola pública e da escola particular?
Será que a simples transferência de gestão, passando as escolas públicas para serem administradas por Organizações Sociais (OSs) resolve-se o problema?
Parece ser uma tentativa de solução simplista com total desconhecimento da realidade em que vive cada escola pública goiana e de sua população.
Fazendo-se um paralelo entre a escola pública e a escola particular vamos entender a realidade que distancia tanto estas duas instituições, pois a melhoria da qualidade de ensino da escola pública depende de fatores que não fazem parte do círculo de preocupação da escola particular.
A educação pública brasileira está vencendo o desafio da inclusão mas não da qualidade de ensino,pois alunos pobres enfrentam dificuldade muito maior para aprender e escapar do currículo vicioso que leva ao mau desempenho, ao atraso do conteúdo desenvolvido e ao abandono da escola. Não há de fato igualdade de oportunidades, porque eles já largam em desvantagem no longo processo que vai culminar numa formação e num nível de renda desigual, pois crescem em bairros mais violentos e ambientes insalubres, sem local próprio para estudar e com parentes com vocabulário limitado, além de despenderem mais tempo no trajeto até às escolas de infra-estrutura precária.Também, têm que se contentar com professores menos preparados, pois os melhores professores transferem-se para estabelecimentos menos periféricos e problemáticos.
A escola pública, para chegar ao mesmo ponto de partida da escola particular, tem que fazer muito mais: dedicar a estas crianças atenção especial, na sala de aula, para compensar das desvantagens que enfrentam só por nascerem onde nasceram. Também integrar a escola à comunidade tornando-a uma célula viva desta comunidade com diversas ofertas de serviços que possam fazer a integração dos pais à escola e a escola à comunidade, como: instalação de posto de atendimento à saúde, esportes, danças, música, palestras, etc., cujos serviços devem ser prestados por pessoas da própria comunidade através de algumas horas de trabalho de dedicação destes profissionais à escola.
Do lado pedagógico, além da implantação do currículo básico para cada município, estado ou de nível nacional, todas as secretarias de educação municipal ou estadual deveriam instituir um exame anual para avaliação do desempenho de seus alunos, semelhantes ao Enem e, a partir daí, os professores que elevarem a média de avaliação de seus alunos,neste exame, receberiam um adicional salarial que seria incorporado a seus rendimentos, a cada melhoria alcançada.
È difícil entender uma escola pública, com tantos desafios para alcançar a meta de elevados ganhos em aprendizagem, com diferenças estruturais com a escola particular,surgirem governantes interessados em transferir a gestão destas escolas para organizações travestidas de Organizações Sociais(Os).
Temos que ser ingênuo ou ignorante para acreditar na dispendiosa mensagem publicitária do governo tentando “vender” a proposta de que as OSs irão salvar a escola pública goiana.

(Walter Chaves Marim é professor universitário, economista com mestrado pela FGV e curso de doutorado pela USP)

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