Os direitos humanos são para todos
Diário da Manhã
Publicado em 5 de dezembro de 2017 às 22:22 | Atualizado há 7 anos
O final do século XIX é marcado pela ascensão do discurso médico-científico preocupado com o estudo e classificação das patologias. E é também ali que surge uma nova espécie do homo sapiens, ou seja, o “homossexual”.
As primeiras investigações buscavam identificar as manifestações e causas da homossexualidade com interesse na normalização da vida sexual. Do projeto que fazia parte do movimento higienista, dirigido ao controle e a regulação da vida urbana, vale salientar que não só os homossexuais eram alvo dessa empreitada. De fato, as campanhas de higiene social pertenciam a um momento histórico que apoiou a expressão sexual, desde que restrita ao laço matrimonial, restrito apenas às relações heterossexuais conjugais vinculadas à reprodução e transmissão de bens até então endossadas, de acordo com Vieira (2009)
Ao sustentar a existência de uma “sexualidade natural” no ser humano, o imaginário judaico-cristão dominante no Ocidente cristalizou e isolou as expressões da sexualidade, como se tais manifestações possuíssem realidades concretas. O passo seguinte foi a criação de nomenclaturas para descrever, classificar e etiquetar as práticas sexuais. Foi também em referência à sexualidade natural que surgiu a noção de normal, que, como toda norma, é um construto teórico, logo, ideológico, tributário do imaginário sociocultural no qual ela emerge. A partir daí, “toda forma de sexualidade que não se encaixe nesse imaginário é tida como desviante ou patológica” (CECCARELLI, 2000).
Faz pouco tempo a Justiça Federal do Distrito Federal liberou os psicólogos a tratarem gays, lésbicas como doentes, podendo fazer terapias destinadas à reversão sexual.
Na sociedade da alta modernidade os gays, lésbicas, transexuais, bissexuais, travestis, sofreram e sofrem, ainda nos dias atuais, preconceito e discriminação. Durante a era cinzenta e assassina do nazismo, eram levados aos campos de concentração onde “teorias médicas e psicológicas” tratavam a homossexualidade como uma doença mental que podia ser curada através de métodos de tortura, como a castração, a terapia do choque, a lobotomia e estupros corretivos.
Com toda a contextualização de torturas, mortes e tratamentos degradantes, esse grupo de seres humanos sem face, até então, começou a articular com outras categorias e lutar por igualdade de direitos, respeito e manifestação de orientação sexual, surgindo o movimento LGBT. Atualmente a articulação, vestida em direito e diversidade, usa a sigla LGBTPQIA+ (gays; lésbicas; bissexuais; transexuais; transgêneros; pansexuais; queer; intersex; assexuais).
Em 1990 a Organização das Nações Unidas (ONU) proibia a “cura gay”, outra significativa conquista para o movimento ligado aos Direitos Humanos em sua diversidade de cores, mentes e gente (des) humana. Os Direitos Humanos vêm para garantir ao ser humano as mesmas oportunidades e igualdades. No 1º artigo da Declaração Universal dos Direitos Humanos está inscrito: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade de direitos.” Já o artigo 3º afirma que “todo indivíduo tem direito à vida, à liberdade e segurança pessoal”. No artigo 5º a lei reafirma que “ninguém será submetido a tortura nem penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
Assegurado na Constituição Federal de 1988, o artigo 4º inciso II lembra à sociedade hipócrita e perversa da “prevalência dos Direitos Humanos, artigo 5º inciso III” que atesta ainda: “Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante. Direitos de todos os cidadãos.
A homofobia, crescente, ainda afeta muito esse grupo, as estatísticas de agressões são preocupantes.Com base nesses artigos da Declaração dos Direitos Humanos, e, da Constituição Federal, mais a notícia de liberação da “cura gay”, podemos notar um retrocesso de direitos já conquistados, violação da dignidade humana, imposição da sociedade de padronização, só é aceito quem corresponde aos padrões impostos. Se todos nascem livres e iguais em dignidade e direitos, os LGBT’s devem decidir o que fazer com sua orientação sexual, e não serem tratados como doentes, e precisar de tratamento e cura.
Se todos são livres, por que um determinado grupo não pode usar dessa liberdade para ser homoafetivo? Sem serem considerados doentes. Se ninguém pode ser submetido a tratamento degradante, por que os casais homoafetivos ainda sofrem agressões, morrem e precisam de reversão sexual? Toda a liberdade “conquistada” só é valida para heterossexuais?
A liberação da cura gay é um retrocesso de uma luta intensa, com milhares de pessoas mortas ao tentar conquistar direitos e voz em uma sociedade surda e preconceituosa. Definitivamente um caminho curto para alcançar o aumento mais significativo da homofobia, suicídios entre as pessoas, uma brecha para violar o que ainda resta ao mundo enquanto direitos. Se os Direitos Humanos são para todos, também a liberdade o é, assim como a segurança e o respeito de enxergar-se em si, e, nos outros.
Querida sociedade hipócrita, você não precisa apoiar a decisão de ninguém, mas deve respeitar.
(Viviane Duarte, graduanda do curso de Serviço Social – FacUnicamps)