Os embates do governo para a reforma da previdência
Diário da Manhã
Publicado em 2 de abril de 2016 às 02:24 | Atualizado há 9 anos
A presidente Dilma Rousseff vem afirmando em todos os meios de comunicação que o País terá que encarar uma reforma da Previdência Social. Sem detalhar as medidas que pretende propor para modificar o sistema previdenciário, a presidente sinalizou que pode sugerir uma idade mínima para a aposentadoria. Segundo informações da Agência Senado, a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH) começou a organizar uma audiência pública para debater a reforma proposta pelo governo. As primeiras decisões foram tomadas em uma reunião de trabalho, realizada no dia 8 de março, entre o presidente da CDH, o senador Paulo Paim (PT-RS), e representantes de entidades de classe.
Diante das dificuldades que o governo enfrentará para promover mudanças na Previdência Social, a presidente advertiu que eventuais mudanças nas regras de aposentadoria não irão retirar direitos adquiridos. E nem poderia, já que, de acordo com a Constituição Federal de 1988, a Previdência Social está inserida na Seguridade Social e compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. Desta forma, a previdência atua no sentido de auxiliar na preservação do princípio da dignidade humana, garantindo proteção ao trabalhador e à sua família diante de vários eventos e incertezas.
No período inicial de implantação desse sistema previdenciário no Brasil, havia superávit. No entanto, com o desvio dos recursos provenientes deste resultado, não ocorreu a capitalização do sistema. Na década de 1960, as despesas médicas dos segurados passaram a ser pagas pela Previdência Social e, com essa ampliação na cobertura, aumentaram, consideravelmente, os gastos que culminaram com a ocorrência dos primeiros déficits e necessidades de financiamentos. Além disso, o crescimento desproporcional da arrecadação das contribuições e dos gastos com pagamento de benefícios, com a gradativa diminuição da proporção do número de contribuintes em relação aos beneficiários, houve aumento desproporcional dos valores pagos em comparação com a arrecadação.
Após a equalização das contas em 1978, houve relativo equilíbrio no sistema até a década de 1990. Com a Constituição de 1988 e a universalização da proteção previdenciária, houve aumento desproporcional entre o número de contribuintes e de beneficiários. Este aumento foi deteriorando as contas do sistema até que, na década de 1990, segundo os resultados divulgados pelo governo, foram registrados sucessivos déficits que atualmente ainda perduram.
Outro fator que contribuiu para o déficit previdenciário foi a Desvinculação das Receitas da União (DRU), criada em 2000 para permitir que a União desvinculasse 20% das contribuições sociais e das contribuições econômicas, possibilitando que os recursos fossem utilizados em outras atividades. De acordo com a Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Receita Federal (Anfip), a União retirou do orçamento da Seguridade Social R$ 52,4 bilhões em 2011, R$ 58,1 bilhões em 2012 e R$ 63,4 bilhões em 2013. Nesse sentido, a DRU tem o papel de esvaziar o orçamento da Seguridade Social, sendo que os recursos transferidos aparecem como se esses recursos fossem, por natureza, do orçamento fiscal.
Enquanto o governo divulga os resultados das contas previdenciárias como deficitários, estudos divulgados pela Anfip sustentam a inexistência do déficit na Previdência Social. A entidade afirma que, em 2013, o superávit do orçamento da Seguridade Social, da qual o Previdência faz parte, foi de R$ 76,2 bilhões e, em 2012, de R$ 82,7 bilhões.
Várias contribuições sociais não são exclusivamente previdenciárias, ou seja, compõem o orçamento da Seguridade e não especificamente a receita da Previdência, e não há uma repartição legalmente estabelecida. Desta forma, entende-se que a melhor forma de estabelecer o resultado das contas é de fato considerar o sistema como um todo. Assim, considerando o sistema de Seguridade Social como um todo, no qual a Previdência Social faz parte, não há déficit.
Importante salientar que, quando o Senador Paulo Paim diz que a audiência pública servirá para terminar com a farsa do déficit da Previdência, é um fato que todos devem preocupar, cobrar transparência e publicidade. Mas não é o que o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) demonstra, pois, no último Boletim Estatístico da Previdência Social (Beps), referente a dezembro 2015, não há as informações referentes aos valores dos recolhimentos efetuados pelas empresas, segundo as unidades da federação. Portanto, o governo terá muita dificuldade de aprovar medidas com intuito de reforma previdenciária, ainda mais no que tange a restrição de direitos à aposentadoria, mas não afetando os que já possuem direitos adquiridos.
(Henrique Mendes Stabile, membro do Instituto Goiano de Direito Previdenciário – IGDP)