Opinião

Os filhos bastardos da internet

Diário da Manhã

Publicado em 4 de novembro de 2015 às 23:35 | Atualizado há 10 anos

“A Internet é como um espelho da sociedade. Se você não gosta do que nele vê, quebrá-lo não é a solução.” É mais sábio educar o objeto que lá está refletido. Vint Cerf, em 2010 num fórum em Vilna, Lituânia.

Cada vez mais pode-se constatar o quanto uma família estruturada é importante na educação e  formação dos filhos. O conceito família estruturada aqui não se refere tanto à questão econômica pura e simples, mas sobretudo aos valores imateriais. Dentre esses valores por exemplo a presença do pai e da mãe, a importância que eles dão a uma educação de qualidade, aos valores éticos e morais e mesmo ao nível sociocultural desses pais.

Alguns estudos bem conduzidos já tem demonstrado o quanto faz diferença para uma criança aquela casa que tem a presença amorosa dos cônjuges. Os resultados na personalidade e equilíbrio emocional são significativos no futuro de um filho que é criado com a presença física e afetiva da figura materna e paterna sob o mesmo teto.

Estamos vivendo em uma sociedade e em uma época que a despeito de tantos avanços tecnocientíficos temos como contraponto uma ruptura e perda de muitos valores e sentimentos de  ética, de moral, de cidadania e civismo.

Nas relações humanas, no concernente a namoro e casamento os contatos a dois se  tornaram banalizados e fragilizados. O vínculo conjugal entre as pessoas está cada vez mais vulgarizado e desconectado de qualquer compromisso de fidelidade e duração. O próprio contrato conjugal(casamento) tem sido dispensado pelos casais. O lado prático  é que as separações também se tornaram menos burocráticas e onerosas. juntaram-se um ao outro e os trapos, não deu certo?, se separa, sem cartório, sem os trâmites  da justiça.

Essa vulgaridade nas relações das pessoas, sobretudo entre adolescentes e jovens tem se tornado muito massiva e marcante com o surgimento da internet e redes sociais. É a globalização das mídias como o próprio celular, os smartphones, iPads e notebooks, um facebook, um whatsApp etc. Todas essas tecnologias forçaram os jovens e adolescentes, e mesmo já os adultos, ao um novo tipo de comportamento, o de apenas ficar (expressão própria dos adolescentes), que define um estar com o outro sem obrigação de fidelidade.

Ninguém mais tem vergonha ou se vexa em se mostrar em parte, no todo e até em suas entranhas e na intimidade. Isto vale muito para as novas gerações; pudor, recato e privacidade se tornaram sentimentos pessoais arcaicos e caretas. Todo esse comportamento, ao que sugere, é um fenômeno irreversível.

O  que tem de nexo de causalidade entre uma família desestruturada, consequências para a formação e personalidade do indivíduo (filhos) com a chegada das tecnologias da moda (internet, celular, redes sociais)? Dir-se-ia que tem tudo a ver um fenômeno com o outro.

A massificação e facilitação da comunicação entre as pessoas geraram o que se pode chamar de degradação ou perversão dos vínculos afetivos dos usuários(as) de todas essas mídias virtuais. Para tanto bastaria que as gerações de mães e pais mais jovens pós-internet rememorassem como foram o namoro e união conjugal de seus pais. Esses mais idosos que constituem a geração pré-internetiana (antes dos anos 1990).

Como se dava um namoro nos idos de 1970/80? O jovem  enamorava a menina (moça), havia um pedido aos pais da jovem e na maioria das vezes caminhava para um noivado e consumava o casamento; num ritual revestido de todo romantismo, respeito, com participação das duas famílias. Ou seja, havia um rito de compromisso, uma cerimônia, fidelidade e um vínculo do mais puro e sincero amor.

E com as gerações facebookianas e whatsappianas dos tempos virtuais? Como tem se dado as relações? Primeiro passo: os jovens se tornam  contatos e amigos pela internet, sem nunca ter se visto, marcam um encontro depois de algumas transas virtuais (já imaginou, sexo virtual!);  isto não se falando nos casos de pedofilias e estupros induzidos pela internet, os namoros passageiros, gravidezes indesejadas, separações rápidas e todos os danos para os filhos dessas descartáveis relações. Agora imaginemos o futuro reservado a esses  vindouros  “cidadãos”, filhos dessas frágeis relações! Esse comportamento tem gerado um problema familiar muito grave para a sociedade, os filhos bastardos da internet.

Deu-se ênfase aqui à influência do mundo virtual, às redes sociais e todas as mídias de interação empregadas pelas pessoas. Todas essas invenções e conquistas dos progressos tecnológicos são por excelência catalisadoras das relações conjugais (namoro, casamentos e uniões estáveis ou não) cada vez mais vazias de fidelidade e amor romântico e verdadeiro.

Torno então aquele mote inicial, dos filhos vítimas de famílias desorganizadas e falidas nos princípios socioculturais, éticos e morais. Digno de menção tem sido também o descaso, a irresponsabilidade e desleixo com o planejamento familiar. Casais existem e mesmo pais e mães solteiras que geram e criam filhos, como se o fizessem com a criação de outros bichos, porcos e cachorros por exemplo. Criar e educar um filho é muito mais exigente, difícil e oneroso do que criar e amansar um cavalinho, um burrinho, um cachorrinho. Ou será que eu é que sou um careta e desantenado com a modernidade no que se refere à honra, ao brio e valores abstratos e constituição moral das pessoas? Nov/2015.

 

(João Joaquim – médico – articulista DM – [email protected]www.jjoaquim.blogspot.com)

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