Otoniel Machado, leão de Deus
Redação DM
Publicado em 14 de janeiro de 2017 às 01:38 | Atualizado há 8 anos
Ao folhear as páginas antigas de jornal, perdida no meio de outras notas, encontrei, numa coluna social de mais três décadas, a notícia do aniversário do ex-senador Otoniel Machado, médico e agropecuarista. O nome Otoniel, significa, em hebraico, leão divino.
Conheci o dr. Otoniel Machado nos labirintos do Centro Administrativo, no começo de 1994. Ele era o secretário de Governo do estado e eu, nomeado pelo então governador Iris Rezende, acabava de assumir a presidência da Fundação Cultural Pedro Ludovico com a função de Secretaria Estadual de Cultura. Na primeira audiência com ele tratei de assuntos da Orquestra Filarmônica de Goiás. O jeito elegante e amável do dr. Otoniel me impressionou. Esse mesmo jeito simples também encantou as musicistas Belkiss Spenziere e Tânia Cruz que me acompanharam na audiência. Os assuntos pendentes foram, depois, encaminhados com prioridade ao dr. Irondes de Morais, seu sucessor no cargo, também ligado à cultura por intermédio do Gremi – Festival de música de Inhumas.
Por algum tempo o dr. Otoniel deixou de lado as suas atividades de médico e criador de gado para ajudar o estado com a sua experiência. Foi secretário de Governo e Senador. Exerceu essas funções públicas com dignidade e correção. Enquanto senador destacou a cultura como ponto de união dos goianos. Num dos seus discursos, em 1997, registrou nos anais do Senado a crônica do escritor José Mendonça Teles sobre o Batismo Cultural de Goiânia. Noutro falou sobre o 2º Festival do Livro e 1ª Bienal de Goiânia.
Otoniel Machado transcende em sua dimensão individual. Fez morrer em si o indivíduo para brilhar-se em espírito. Tornou-se absoluto junto da sua família e dos amigos que conhecem a sua alma translúcida. Deus retirou dele o desejo de vingança da sua alma repleta de bondade ao próximo. Talvez seja por isso que Deus deu-lhe a profissão de médico. A respeito deste tema ensina Hélio Pellegrino, o porta-voz dos intelectuais de sua época, em uma entrevista a Clarice Lispector: “A coisa mais importante do mundo é a possibilidade de ser-com-o-outro, na calma, cálida e intensa mutabilidade do amor. O Outro é o que importa, antes e acima de tudo. Por mediação dele, na medida em que o recebo em sua graça, conquisto para mim a graça de existir. É esta a fonte da verdadeira generosidade e do entusiasmo. O amor genuíno ao Outro me leva à intuição do todo”.
É no caminho da alma que encontro a imagem do dr. Otoniel Machado batendo à porta das minhas recordações. Vibro as notas da gratidão a um ser humano singular que suportou a maldade para torna-se plural na apreensão das luzes do Criador. Nenhuma surpresa da vida desviou o seu caminho de fé no próximo. Por isso mantém a orquestra do seu espírito afinada com Deus. Uma figura simbólica ao estilo dos músicos na antiga Vila Boa ao cair da tarde dos séculos passados: um vai á janela e toca a sua rabeca, da casa ao lado outro músico toca a sua tuba, do casarão da esquina soa o trompete para o deleite dos ouvidos atentos. Há uma harmonia perfeita entre os músicos de uma orquestra sinfônica. Numa janela com moldura de aroeira, debruçada com os cotovelos apoiados no batente inferior, uma imagem digna do pincel de Volpi.
Assim é a vida na esperança de uma passagem ao Eterno.
(Doracino Naves, jornalista; editor do Portal Raízes)