Opinião

Paris e o mercado das pulgas

Redação DM

Publicado em 22 de junho de 2022 às 17:22 | Atualizado há 3 anos

Venho atualmente envidando esforços para melhor entender um dos maiores clássicos da literatura econômica, de enorme importância para se compreender o que acontece hoje no mundo: A Riqueza das Nações, de Adam Smith.

Escrito há mais de trezentos anos, o livro desse sábio escocês está mais vivo do que nunca, porque nos explica algo inerente ao mundo globalizado e ao enriquecimento (ou empobrecimento) dos países através do comércio.

Chamou-me especialmente a atenção um trecho, do qual explicito a passagem, em que Smith compara a situação de um homem mais rico com a de outro mais pobre e correlaciona essa riqueza ou pobreza com a de uma nação. Vamos, pois, a ela: “como o estilo de consumo a opulência é mais favorável a um (mais rico) do que ao outro, o mesmo acontece com o de uma nação. As casas, os móveis, as roupas dos ricos, em pouco tempo, tornam-se úteis para as classes médias e mais inferiores do povo. Eles são capazes de comprar tudo isso quando seus superiores se cansam dessas coisas, e a acomodação geral de todo o povo é, assim, gradualmente aumentada, quando esse estilo de consumo se torna universal entre os homens de fortuna.”

Em outras palavras, Smith quer nos dizer que, nos países de elevada renda, as classes de menor poder aquisitivo têm acesso a produtos de alta qualidade, e o motivo para que isso aconteça é um só: os mais ricos facilmente se cansam de usar tais produtos, ante a sua necessidade de consumo sem fim. Essa é a razão por que os integrantes da classe média dos países mais ricos têm acesso a produtos de excelente qualidade a preços acessíveis.

Na Europa, especificamente na França, é muito comum as pessoas comprarem produtos de boa qualidade nos chamados “mercados das pulgas”. Quanto a isso, vejamos a curiosidade do nome: este vem da Idade Média, em que era muito comum a infestação de produtos por pulgas. Mas a realidade de hoje não é essa, pois o mercado das pulgas, de pulgas, só tem mesmo o nome. Nesses estabelecimentos é perfeitamente possível encontrar produtos de excelente qualidade a preços bem acessíveis.

Conheço muita gente da chamada “alta sociedade”, que vai a Paris, olha aqueles casacos maravilhosos, as bolsas da Louis Viton em um dos templos de luxo da aristocracia parisiense, na charmosa e cara Avenida dos Campos Elísios, para depois tomar o metrô rumo aos subúrbios, na busca daquela mesma bolsa ou daquele mesmo casaco em um desses mercados das pulgas. Usado, sim, mas de alta qualidade e com uma grande vantagem: preço bem mais acessível.

Exemplo disso é o meu próprio caso. Já conhecedor dos detalhes que fazem a diferença na suntuosa capital francesa, comprei, na minha última estada por lá, um excelente relógio, novinho em folha, pela pechincha de 10 euros (30 reais). Lá, no mercado das pulgas, ele vale isso; em um grande shopping de Goiânia, custaria, no mínimo, cerca de mil reais.

O mesmo ocorre nos supermercados de bairros parisienses, nos quais você pode muito bem comprar champanhes, escargots e bons vinhos de alta qualidade a preços bem acessíveis. Comida de rico aqui é perfeitamente acessível à classe média na terra de Napoleão.

Não tenham dúvidas de que só vai a restaurantes e se hospeda em hotéis de luxo em Paris duas classes de pessoas provenientes de países em desenvolvimento, como o Brasil: os muito ricos e certos políticos que têm o péssimo hábito de serem pródigos com o dinheiro alheio.

Leia também

Siga o Diário da Manhã no Google Notícias e fique sempre por dentro

edição
do dia

Impresso do dia

últimas
notícias