Perspectivas de reforma do processo penal brasileiro
Redação DM
Publicado em 27 de novembro de 2015 às 22:47 | Atualizado há 10 anosCediço que o processo penal brasileiro abriga em seu bojo diversos elementos formais, dos quais provoca tramitação com extrema lentidão, condiciona excesso de componentes que dificulta a fluência, bem como, recursos desnecessários, transmitindo sensação de impunidade à sociedade e encorajamento ao delinqüente. Após longos anos, e depois de emperramento e ranços insuperáveis o legislador com leniência, que é traço marcante que sela o legislativo pátrio resolve promover-lhes mudanças, das quais destacam o juiz de garantias, uma espécie de juiz que passaria atuar na qualidade de investigador do processo, com atribuição de interrogar acusados por videoconferência, inclusive com a finalidade precípua de monitorar a legalidade da polícia judiciária e dos direitos do investigado.
Contudo, o Judiciário, não tem estrutura necessária, bem como, escassez de magistrados levando ainda maior emperramento da prestação jurisdicional, inclusive, por ser esta alteração formalidade absolutamente desnecessária, sem qualquer utilidade técnica.
Por outro lado, pretende-se reduzir o número de recursos, inclusive com redução dos embargos declaratórios para apenas um em cada instância.
Prevê a dilação de prazo para 90 dias para realização de audiência de instrução e julgamento para adequá-lo ao prazo da prisão preventiva. Entretanto, nesta fase provoca uma evidente redução na celeridade processual.
De acordo com o relator do projeto fazendo uso da locução “mecanismo de celeridade processual” provocaria, esgotado o prazo máximo da audiência de instrução e julgamento o condutor do feito ordene que praticasse atos processuais aos domingos, feriados e recessos forenses, mesmo fora dos horários de expediente. Seria um pequeno avanço, visto que, o Brasil é o país dos feriados, à oportunidade é bom lembrar que, de acordo com estudos, para cada feriado o país perde cerca de cinco bilhões de reais.
Quanto ao famigerado “sequestro de bens”. O novo CPP cria a figura do administrador judicial, quer seja, aquele que administra os bens que foram seqüestrados e de bens declarados indispensáveis, entretanto, permite que o acusado apresente caução para levantar o sequestro de bem, vedando que bens indisponíveis sejam ofertados em garantia de dívida sem prévia autorização judicial. Cumpre salientar que a caução deve ser idônea, desimpedida de qualquer gravame, caso contrário seria apenas uma “permuta” para que o acusado levante um bem seqüestrado considerado precioso apenas com o propósito de se beneficiar.
Por outra face, o projeto define o processo penal, digamos assim, de tipo exclusivamente acusatório vedando ao juiz de ingressar na esfera do órgão acusatório de levantar provas que corroborem fatos narrados na denúncia. Vale gizar que, aumenta o princípio da imparcialidade do julgador, entretanto, vejo com certa cautela, pois, o juiz tambem deve envolver-se no descobrimento da verdade e da elucidação dos fatos.
Na visão do novo processo penal pretende-se a garantia do sigilo necessário ao esclarecimento da verdade, a preservação da vítima, testemunhas e do investigado, inclusive a exposição desses personagens aos meios de comunicação. Saliente-se, quanto ao investigado trata-se de flagrante retrocesso, buscando os porões da ditadura e da força bruta, impondo-se a censura prévia, e a limitação da imprensa, como corolário dos países civilizados. A proposta vem ressuscitando a famigerada e repugnante “lei da mordaça” que foi proscrita e odiada por diversos segmentos da sociedade.
Ressalte-se mais a “lei da mordaça” só interessa aos poderosos, máxime, aos detentores do poder político, em especial àqueles que maculam a classe, e blindados pela impunidade das benesses da lei penal e da brandura da Lei de Execução Penal. Atores que legislam em causa própria.
Em relação ao inquérito policial, deverá, a autoridade policial certificar ao Ministério Público visando maior proximidade do órgão inquisitorial com a acusação.
Nos crimes de competência do tribunal do júri, será permitida a comunicação entre os membros do corpo de sentença, entretanto, exceto durante a instrução e os debates. Contudo, o legislador perdeu a oportunidade de transferir a competência para o juiz singular, posto que, alem de provocar menos celeridade nos julgamentos, implica na alocação de recursos financeiros provocando grandes gastos desnecessários.
Na ação penal vimos que, neste particular, aumenta a impunidade, vejamos, o texto extingue a ação penal privativa do ofendido. Sob esta ótica é salutar, entretanto, o processo para ser iniciado por ação pública condicionada à representação do ofendido, mudança superficial e inócua, podendo ser extinta com a retratação da vítima, desde que até o oferecimento da denúncia, ocorre que, por certo, após repercussão moral e psicológica, quer seja, já “produzido estrago”, surge a figura da retratação, tornando impune o infrator, mesmo sendo nos crimes de menor potencial ofensivo.
O interrogatório passa a ser meio de defesa e direito optativo do investigado, e preservando o direito de reunir-se com advogado em caráter reservado. Não podendo a autoridade investigante oferecer ao acusado qualquer vantagem à confissão se não houver amparo legal.
Também é permitido ao interrogado (réu preso) por videoconferência em caso de risco à segurança pública no caso do réu doente ou outro motivo justificável.
Prevê o projeto, que a vítima tome conhecimento das decisões especialmente quanto à prisão, soltura, conclusão do inquérito, oferecimento da denúncia, arquivamento, condenação ou ab solvição, podendo, inclusive, obter cópias de peças, desde que não esteja sob sigilo. Podendo tambem prestar declaração em dia, separadamente do acusado, permitindo à vítima ser ouvida antes das testemunhas e solicitar à autoridade pública a respeito do andamento do feito, inclusive, manifestar sua opinião. Representa certa mudança, entretanto, não tão expressiva, posto que, algum destes requisitos não inova atualmente de modo substancial.
Escuta eletrônica. Permitida em crime cuja pena seja superior a dois anos, com exceção do crime de formação de quadrilha. Andou mal o legislador, pois, mesmo que o crime não seja superior a dois anos, o delinquente poderá utilizar desta limitação da pena para articular fatos de maior gravidade especialmente em país, como violência em escala geométrica como o Brasil.
Lamentavelmente, o projeto prevê duração máxima de dois meses podendo chegar a um ano, se for crime permanente. Contudo, o prazo de dois meses é extremamente reduzido, posto que, há determinados crimes como o narcotráfico, tráfico de pessoas, sequestro, os atos preparatórios exige maior tempo.
A fiança se estende de um a duzentos salários, cuja pena corpórea seja superior a oito anos, nas demais de um a cem salários.
Outras medidas cautelares, como opção de condenação: fiança, recolhimento domiciliar, monitoramento eletrônico, suspensão do exercício da profissão ou função pública, afastamento do lar, suspensão do poder familiar, etc…
O projeto acaba com a prisão especial para quem tem curso superior, prevalecendo apenas para o preso que corre risco de integridade física e psicológica. Entendo que houve o princípio da isonomia, posto que, não há diferença entre o profissional de nível superior com o menos letrado.
A prisão provisória limita a três modalidades: flagrante, preventiva e temporária. Não se admitindo a violência e uso de algema, apenas em resistência e tentativa de fuga.
Não se admitirá o flagrante preparado, “quando supor que a ação só ocorria em virtude daquela provocação”.
A prisão preventiva não poderá ultrapassar 180 dias, se decretada no curso da investigação, ou antes da sentença condenatória recorrível, e de 360 dias se decretada ou prorrogada por ocasião da sentença condenatória recorrível. Inobstante aos prazos e possível que o juiz possa prorrogar, entretanto, deverá indicar prazo de duração da segregação. A prisão que exceder a 90 dias será compulsoriamente reexaminada por juiz ou tribunal. Permanecendo o prazo de cinco dias para a temporária, prorrogável, se comprovada a necessidade da medida.
À conclusão a meu ver aumenta sensação de complacência, não convence quanto ao aumento da celeridade processual e cujos avanços são de caráter superficial.
(Vandelino Cardoso, advogado, docente universitário, pós-graduado em processo penal e cursou a Associação dos Diplomados da Escola Superior de Guerra)