Por que saí da universidade
Diário da Manhã
Publicado em 29 de setembro de 2018 às 04:09 | Atualizado há 7 anos
- Picaretagem
Em minha breve experiência com a Academia, mais especificamente no curso de Licenciatura em História, deparei-me com talvez o que seja o pior da intelectualidade brasileira, digo isso comparando com os relatos de outras universidades já divulgados. O mar de picaretagem se institucionalizou na instituição, principalmente no departamento que estava eu envolvido, tive aula com professores que não sabia, interpretar figuras de linguagem e outros que quando se deparavam com visões de mundo que contrapõem sua ideologia na própria bibliografia, deixavam a ideologia sobrepor a própria inteligência.
Quando digo que a faculdade foi dominada por picaretas não é exagero, o Filósofo Alemão Arthur Schopenhauer já descrevia em seu ensaio “Sobre a Erudição e os Eruditos”, que o “erudito alemão era pobre demais para ser honesto e honrando”. Essa condição ainda se aplica nos dias atuais, a mediocridade reina no espaço acadêmico, a exemplo foram as várias vezes que ouvi da boca de um professor sobre como era legal um trabalho que tinha lido sobre a história das flatulências e outros temas que não tem nenhuma relevância científica e que só há quem os leia nos pequenos grupinhos sociais da faculdade. A verdade é (pegando uma frase emprestada do Filósofo Luiz Felipe Pondé) aconteceu a institucionalização do papo furado cheio de jargão técnico).
- Hipocrisia
É comum ouvir pelos corredores das áreas de Ciências Humanas o mesmo “papinho do bem”, porém essas pessoas se inspiram em professores que dizem sem nenhum pudor nas palestras que assisti na faculdae, que jogavam pedras em vidros de bancos, enfrentavam a polícia, que queimar ônibus em manifestação é certo, um desses professores quando questionado sobre movimentos de direita chegou a dizer as seguintes palavras “Tenho vontade de sair e esmurrar os outros”.
Foi fácil ver que a hipocrisia também se institucionalizou nesse espaço, as mesmas pessoas “do bem” também chegaram a dizer em palestras que quem tem medo do comunismo não sabe o que é o comunismo, normatizando o pensamento revolucionário de esquerda, porém entrarei nesse mérito em um paragrafo exclusivo.
- Censura
“Posso não concordar com o que dizes, mas lutarei para que possas dizer em liberdade” Voltarie.
A famosa frase de Voltarie é admirada e aplaudida pelos centros acadêmicos, pois a universidade em tese seria o espaço das livres ideias e principalmente pelo fato da atual admiração aos liberais revolucionários que deram a base para a revolução francesa. Contudo observa-se que essa frase só vale para a já consagrada erudição local universitária. Schopenhauer, ainda em seu tempo dizia que os eruditos já consagrados se preocupavam em “não deixar que desponte uma cabeça realmente eminente quando ela tende a se destacar, pois tal coisa representaria um perigo para todos ao mesmo tempo”, e mais uma vez a suas observações valem para além do seu tempo.
No início do curso eu até me esforçava em lutar contra a censura velada, mas era tremendamente cansativo, doído, tal esforço me apresentou a mais fiel das amizades, a solidão, e ela acompanha até hoje o autor dessas palavras.
Exponho aqui ser complicado andar no espaço das ideias não podendo expor as minhas próprias sem antes não abstrair a permissão psicológica do olhar da maioria e ainda observar se essas ideias não ferirão os princípios institucionalizados da hipocrisia e da picaretagem. A pressão psicológica da qual passei seria a dos olhares de reprovação, o isolamento inconsciente e as provocações de pessoas que chegavam perto para proclamar ofensas. O medo que senti quando chegavam por trás e me chamavam de reacionário era o medo de mim tornar o que me acusavam.
- Doutrinação
Ouvi muitas críticas ao projeto “Escola Sem Partido”, apoiando-se no argumento que não há doutrinação nas faculdades, apenas proliferação do conhecimento. Para quem argumenta isso, só consigo vê-lo de duas óticas, ou é um clássico charlatão ou um imbecil que se acha intelectual, o primeiro não tenho o que explicar, o próprio termo já define tudo, já o imbecil do qual me refiro é aquele que acha ser dono dos seus próprios pensamento mas não enxerga que é um mero papagaio que repete as palavras de meia duzia de autores quando provocado.
Outro ponto a se observar é a loucura coletiva instaurada naquele meio. As argumentações pseudofilosóficas, muitas vezes excluíam o fator humano de qualquer figura admirada, elevando personalidades como Che Guevara e Fidel a níveis semidivinos. Em palestras cheguei a ouvir frases como “Ernesto Che Guevara lutou no Congo, Bolívia, Cuba para ter o direito de existir”. Frases como essa são obviamente desprovidas de qualquer sentido, contudo fez com que papagaios aplaudissem o autor da frase.
Poderia eu fica citando inúmeras frases como essa, porém podem me acusar de tirá-la do contexto. O ponto é que eu não questionava os momentos de loucura coletiva pois tinha medo, e também que de nada adiantaria os meus questionamentos. Luiz Felipe Pondé tinha razão na sua frase que a tempos juguei ser exagero, “existe mais debate de ideias em uma igreja evangélica do que no departamento de uma faculdade de ciências humanas”.
- Silêncio
Chegamos no que talvez pode ser fruto de todos os fatores já mencionados juntos. O silêncio a que me refiro é em relação aos atos e consequências do movimento que deixou ate hoje 100 milhões de vítimas, o comunismo. Logo no início da faculdade pude observar que sempre que alguém fosse citar um exemplo de retrocesso e barbárie, era apenas o movimento nazista o pautado. Em mais de um ano naquele espaço, talvez a União Soviética foi citada uma vez em aula, mas não ouve qualquer menção a China, Camboja, Coreia do Norte, Vietnã, enquanto o nazismo é citado quase diariamente.
É obvio que o movimento comunista fui muito mais prejudicial a humanidade do que qualquer movimento autoritário na história das civilizações, porém o silêncio em relação a isso é perturbador. Não sou o único a perceber isso, o Historiador Frances Stephane Courtois, especialista no estudo do comunismo, já identificou esse fenômeno e propôs uma explicação para isto, porém não entrarei aqui no mérito da explicação, estou apenas dando o meu testemunho.
Observação Final
Nessas breves linhas escritas em algumas horas relatam apenas uma curta experiência minha no espaço acadêmico. Quase como um desabafo explico aqui que o ambiente ao qual estava envolvido me desconcentrava dos dos estudos, era sofrível e doído observar diariamente os fenômenos citados sem ter poder de ação. Finalizo aqui os motivos que me fizeram sair da academia.
(João Paulo Melo, escritor)