Quanto vale um grau?
Redação DM
Publicado em 26 de abril de 2016 às 01:39 | Atualizado há 9 anosVocê já parou para pensar na exatidão matemática que rege boa parte de nossas vidas? Ela está presente nos cálculos precisos que indicam o grau exato de alinhamento das vigas para se construir nossa casa, marca presença naturalmente em nosso olhar para que não precisemos usar óculos; está presente, até mesmo, na trivial temperatura correta para assarmos um bolo.
A exatidão matemática das coisas está presente em tudo, inclusive na natureza, sustentando nosso modo de vida. Não paramos para pensar nela: essa exatidão faz parte do roll das coisas que simplesmente negligenciamos por “simplesmente” estarem ali. A ela somam-se o ar que respiramos, a presença do sol que garante nossa existência, a água que bebemos, a terra fértil em que plantamos; e até mesmo nossas vidas. Tudo isso simplesmente está ali, sempre com a exatidão necessária e ao nosso dispor.
Porém, o que acontece quando essa exatidão matemática nos falta? A casa cai, a vista falha e a massa pode não crescer – ou pior: queimar. Não é o caso de pensar que desvios não são toleráveis e que por menor que sejam podem colocar tudo a perder. Não, não é isso: o caso aqui é nos conscientizarmos que desvios têm limites. Limites que não devem ser ultrapassados.
Uma das exatidões matemáticas que regem nossas vidas e que “simplesmente estão ali” parece estar deixando de existir: o clima do planeta está mudando. Não é de hoje, nem é novidade. Há bastante tempo respeitadas organizações e cientistas do mundo todo atestaram esse fato. No final de 2015, durante a Conferência do Clima da ONU (COP 21), também foi deixado bem claro para o mundo qual o limite que temos em termos de aumento de temperatura até o final do século: 2ºC.
Esse aumento de 2ºC é tudo que temos de margem para garantir que a vida no planeta (a minha, a sua e daqueles que amamos) não seja seriamente colocada em risco. Na verdade, isso é mais do que temos: a temperatura média do planeta já está 0,8ºC maior do que na época Pré-industrial. O que nos resta de aumento é, portanto, 1,2ºC.
Apesar de dados sobre a temperatura global de curtos períodos não indicarem muita coisa sobre como será o ano, os números divulgados no último sábado pela NASA estão no limite.Os dados revelaram que fevereiro deste ano foi o mês mais quente já registrado na história mundial, sendo que o segundo mês mais quente foi seu antecessor (janeiro), enquanto o terceiro mês com temperaturas mais altas na história foi dezembro de 2015. Nunca houve um trimestre tão quente no mundo: entre dezembro e fevereiro, a média da temperatura no planeta ficou 1,2ºC acima da média – no limite exato do aumento ao qual ainda podemos nos submeter nos próximos 84 anos que ainda restam para o final do século.
A humanidade, como a conhecemos, depende, inteira e sem exceções, desses 1,2ºC. Não tenho uma resposta definida para a pergunta do título desse artigo, mas repasso novamente o questionamento a você: quanto você acha que vale?
(André Ferretti, gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza)