Opinião

Raízes corruptas do Brasil (como funciona o sistema)

Diário da Manhã

Publicado em 4 de agosto de 2018 às 23:26 | Atualizado há 7 anos

  1. No li­vro Di­nhei­ro, elei­ções e po­der (Com­pa­nhia das Le­tras, 2018), Bru­no Ca­raz­za mer­gu­lhou fun­do na aná­li­se de uma ques­tão cru­ci­al: co­mo os do­nos cor­rup­tos do di­nhei­ro man­dam no Bra­sil, se­ja com­pran­do o sis­te­ma po­lí­ti­co (ou se­ja, o po­der), se­ja in­ter­fe­rin­do no sis­te­ma ju­rí­di­co (par­ti­cu­lar­men­te nas Cor­tes on­de os ju­í­zes são in­di­ca­dos po­li­ti­ca­men­te).
  2. O sis­te­ma po­lí­ti­co bra­si­lei­ro (res­sal­va­das al­gu­mas ex­ce­ções) não é, co­mo mui­tos ilu­so­ria­men­te acre­di­tam, um es­pe­lho da so­ci­e­da­de. A cren­ça de que os po­lí­ti­cos são o re­tra­to do po­vo é um mi­to. Os po­lí­ti­cos com­pra­dos são o re­fle­xo fi­el dos que man­dam ne­les e no pa­ís (leia-se, dos en­di­nhei­ra­dos cor­rup­tos que fi­nan­ciam su­as cam­pa­nhas elei­to­ra­is).
  3. Nos­sos po­lí­ti­cos (res­sal­va­das as al­mas bo­as) não re­pre­sen­tam os in­te­res­ses do po­vo, em­bo­ra elei­tos por ele. Se de­mo­cra­cia é o go­ver­no elei­to pe­lo po­vo e pa­ra o po­vo, de­fi­ni­ti­va­men­te, o Bra­sil não é uma de­mo­cra­cia ver­da­dei­ra. Nos­sa de­mo­cra­cia é pu­ra­men­te for­mal (Schum­pe­ter). Aci­ma de tu­do, ela é mui­to ve­nal.
  4. Os po­lí­ti­cos (cor­rup­tos) cu­i­dam (co­mo qual­quer ca­pa­taz de fa­zen­da) dos in­te­res­ses da­que­les que dão di­nhei­ro pa­ra eles al­can­ça­rem su­as con­quis­tas elei­to­ra­is (ou se­ja, pa­ra se man­te­rem no po­der). Co­mo te­mos mui­tos cor­rup­tos no Bra­sil, so­mos uma das mais prós­pe­ras clep­to­cra­cias do mun­do (clep­to = la­drão; cra­cia = go­ver­no).
  5. Não exis­te cri­se de re­pre­sen­ta­ti­vi­da­de no sis­te­ma po­lí­ti­co na­ci­o­nal. Os que nos go­ver­nam, com pou­cas de­fec­ções, re­pre­sen­tam os in­te­res­ses (is­to é, são des­pa­chan­tes) dos que efe­ti­va­men­te man­dam ne­les e na na­ção em ra­zão do seu di­nhei­ro (umas 30 fa­mí­lias e me­nos de 500 em­pre­sas, co­mo ex­pli­ca Ca­raz­za no li­vro ci­ta­do). São eles os que mais fi­nan­ciam as cam­pa­nhas elei­to­ra­is (ten­do as­sim, aces­so ao po­der).
  6. Não há co­mo ne­gar que o Bra­sil é uma plu­to­cra­cia (go­ver­no de al­guns en­di­nhei­ra­dos), des­de 1500. A na­ta ex­cel­sa do se­le­to clu­be for­ma­do por es­ses la­drões do di­nhei­ro pú­bli­co e da fe­li­ci­da­de dos bra­si­lei­ros não che­ga a mil pes­so­as (fí­si­cas e ju­rí­di­cas). É ina­cre­di­tá­vel co­mo a von­ta­de de mil pes­so­as se so­bre­põe, sem con­tes­ta­ção sé­ria, à fe­li­ci­da­de e às ne­ces­si­da­des bá­si­cas de mais de 200 mi­lhões.
  7. A La­va Ja­to já co­me­çou a mos­trar as ca­ras de al­guns de­les. Mas ain­da tem mui­to tra­ba­lho pe­la fren­te. De qual­quer mo­do, é cer­to que ne­nhum clu­be de la­drões du­ra cin­co sé­cu­los sem en­ra­i­za­das co­ne­xões com as ins­ti­tu­i­ções do pa­ís. Que tam­pou­co cu­i­dam, em ge­ral, dos in­te­res­ses da po­pu­la­ção. As ins­ti­tu­i­ções são cri­a­das de acor­do com o fi­gu­ri­no da­do pe­los in­te­res­ses pri­o­ri­tá­rios dos cri­a­do­res.
  8. Is­so ex­pli­ca por­que nos­sas ins­ti­tu­i­ções (po­lí­ti­cas, eco­nô­mi­cas, ju­rí­di­cas e so­ci­ais) são mui­to frá­geis, mas ao mes­mo tem­po ex­tre­ma­men­te fun­cio­nais pa­ra a pros­pe­ri­da­de do ca­pi­ta­lis­mo de com­pa­drio (de la­ços, de ami­za­des), de­se­nha­do e ad­mi­nis­tra­do pe­la re­fe­ri­da con­fra­ria de la­rá­pios.
  9. A ques­tão não é que o bra­si­lei­ro não sa­be vo­tar. Fre­quen­te­men­te ele nem se­quer tem em quem vo­tar com con­fi­an­ça, éti­ca e es­pe­ran­ça, por­que o sis­te­ma se fe­cha de tal ma­nei­ra que nem se­quer dei­xa al­ter­na­ti­vas pa­ra a elei­ção.
  10. A ques­tão gra­ve e mui­to sé­ria é que, nas clep­to­cra­cias, sem­pre exis­te um gru­po res­tri­to de en­di­nhei­ra­dos cor­rup­tos que com­pra os po­lí­ti­cos (e go­ver­nan­tes) pa­ra se apo­de­ra­rem do po­der (e do Es­ta­do). Es­se é o âma­go da ques­tão bra­si­lei­ra.
  11. Uma gran­de par­te do Es­ta­do bra­si­lei­ro sem­pre foi se­ques­tra­da por um ab­je­to clu­be de la­drões. Aqui re­si­de a ra­iz cor­rup­ta do po­der no Bra­sil. En­quan­to não fa­xi­nar­mos com va­len­tia e fir­me­za os la­drões, cor­rup­tos e apro­vei­ta­do­res que man­dam na nos­sa na­ção nun­ca sai­re­mos do sub­de­sen­vol­vi­men­to. Vo­to fa­xi­na nos po­lí­ti­cos cor­rup­tos. Im­pé­rio da lei con­tra os la­drões (so­bre­tu­do en­di­nhei­ra­dos) da Re­pú­bli­ca.

 

(Lu­iz Flá­vio Go­mes, ju­ris­ta e cri­a­dor do mo­vi­men­to Que­ro Um Bra­sil Éti­co. Es­tou no f/lu­iz­fla­vi­o­go­me­so­fi­ci­al)

 


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