Opinião

Sem Temer

Diário da Manhã

Publicado em 23 de maio de 2017 às 02:15 | Atualizado há 8 anos

Nesta crônica uso um trocadilho, embora sem troça, para uma análise fria de uma situação, no mínimo, embaraçosa, para não me atrever a fazer julgamentos precipitados.

Macaco velho em política, já vi coisa de fazer o diabo corar. Mas de uns tempos pra cá, a política desandou mais do que caganeira, tamanha confusão, tanto para desvendar como para esconder o mar de lama em que meteram o Brasil.

Sem temer é preciso encarar os fatos, e de cara feia! De nada vai adiantar remendos. E chamo de remendo qualquer tentativa de reforma (política, eleitoral, econômica, financeira, trabalhista, da previdência ou demais -ainda que necessária), debaixo do comando onde todos estão sob a apreciação judicial. Dentro de uma crise, nenhuma solução será boa solução. Tudo a seu tempo.

Uma reflexão fria e desapaixonada me diz que primeiro se faz necessário limpar o terreno, varrer o lixo, aplainar a superfície atulhada de corrupção para, depois, construir uma nova casa.

Dito isto, sendo bem prático, sobretudo sem o blá-blá-blá que costumeiramente não apresenta proposta concreta, deixo a minha pequena contribuição logo abaixo.

Todos sabemos que o Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição, logo, o seu intérprete. Portanto, algumas inconstitucionalidades por ele praticadas chega até nós como se fosse uma pílula que ele dourou, embora não pacificamente aceitável. Se for para o bem, salvar a Pátria, por exemplo, engula-se. E é o caso.

Aos fatos. O presidente Temer foi pilhado em descumprimento, em pleno mandado, de preceito constitucional que regra as condutas no exercício do cargo: as narrativas sobre a JBS não deixam dúvidas de que ele tenha prevaricado, ainda que inocente no restante, o que ele próprio alega, mas foi por demais inocente ao tratar com o empresário dedo-duro naquelas tais circunstâncias não republicanas.

Aqui, entra o STF com a solução para retirar o presidente do cargo, se outra fórmula não surgir imediatamente. A seguir, o mesmo Supremo deve impedir a linha de sucessão presidencial, ainda que por apenas 30 dias para preparar a eleição indireta, tanto do presidente da Câmara dos Deputados como do presidente do Senado Federal, porque ambos já estão sendo investigados por indícios gravíssimos de cometimento de crime contra a administração pública.

Aí, cabe a condução do processo sucessório, pela via indireta, ao presidente do STF, hoje a ministra Carmem Lúcia.

Por fim, sugiro outra inconstitucionalidade: a não obrigatoriedade de filiação partidária para se candidatar ao cargo de presidente da República nessa eleição indireta. Muito simples. Se os partidos políticos estão também na lama, onde a legitimidade e a legalidade para indicarem candidatos?

Amigo, muito triste, para um Constituinte de 1988, ainda mais sendo professor de Direito Constitucional, escrever uma crônica com os argumentos que utilizei. Perdoe-me, mas nunca fiquei omisso. E, agora, foi a única maneira que encontrei menos traumática para o nosso querido Brasil, tão vergonhosamente saqueado.

 

(Iram Saraiva, senador constituinte de 1988)


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