Opinião

Sérgio Bernardoni – Missionário da Esperança e de Justiça e Paz sempre

Redação DM

Publicado em 22 de setembro de 2016 às 02:27 | Atualizado há 9 anos

Sérgio Bernardoni missionário passageiro de 1930/2016 na Itália fascista e na ditadura nada branda brasileira. Ajuda nas diretas já. Durante a Guerra Mundial encontra-o no seminário vendo o mundo diante de guerra e de paz. Valores e contra valores dilaceradora sociedade italiana dividida e por fim livre dos cães de guerra hitleres e de mussolinis. Nos anos quarenta surge o Papa Pio XII que sustenta a igreja diante das mudanças, necessidades e de controversas, no século das polarizações, guerras frias e regionais. E mais neocolonialismos nas áfricas e nas ásias e américas latinas inconclusas. Tempos difíceis para o mundo e especialmente para a Santa Sé anunciadora do evangelho revolucionário de Jesus Cristo. Tempos ásperos. Tempos de diáspora? Tempos de renovação desejada pelo jovem padre Sergio e seu amigo e colega padre Ângelo. Surgem clamores por todos os lados. A igreja brasileira se reorganiza numa conferência/CNBB estimulada pelo pequeno grande bispo Dom Helder Câmara e setores variados de bispos, seminaristas, padres, irmãs, leigos da ação católica/Jec/Juc/Jic/Joc/Jac. Movimentos familiares cristãos, crise de padres. Surgem os primeiros financiamentos por igrejas norte – americanas numa vertente fundamentalista neopentecostal que começam a se espalhar por todo o Brasil. A Igreja católica no Centro-Oeste recorre ao nordeste e sul. Para ter mais padres e irmãs vindos todos para o centro – sul e norte. Surgem renovações nas liturgias, nas catequeses e trabalhos sociais como educação de base, sindicalismo rural, renovação nos colégios e universidades católicas. Vemos primeiros atos convergentes com novo ecumenismo com adeptos das igrejas tradicionais, protestantes, históricas e provenientes da reforma luterana. E mais que isto, na Europa e todo o mundo, indica-se a necessidade de estudos, debates, engajamentos extra paroquiais e de congregações. Papa Pio XII morre e é eleito de surpresa um Papa já mais velho, o cardeal de Veneza, Angelo Roncatti, torna-se Papa João XXIII que lança cartas pastorais renovadoras e mais que isso convoca o Concílio Vaticano II. E para Roma vão centenas de bispos, cardeais, teólogos, padres, irmãs e até leigos e leigas que direta e indiretamente participam das assembléias de padres conciliares. Cada um, cada todos iluminados pelo Espírito Santo realizam intensos debates sobre os novos rumos da Igreja de Jesus Cristo e desafios para uma ação evangelizadora para toda a humanidade de Deus. E lá estavam os irrequietos padres Sergio e Ângelo diante deste aggiornamento. E da modernização no sentido do desenvolvimento econômico e social para todos os homens e mulheres do planeta terra, água, ar, fogo e amor espalhados por todos os lados de ocidente e oriente. Sergio de Paulo VI, João Paulo I e II, Bento e agora do Papa Francisco que renova nossas esperanças num mundo melhor. Sergio de D. Fernando, D. Antônio e de D. Washington e outros mais anunciadores do evangelho de Jesus, filho de Maria que depôs os poderosos de seus tronos.

Assim como diz Delma e outros conviventes com o trabalho de Sérgio e Ângelo, depois da abertura do Vaticano II uma aragem se espalhou por todo o mundo. E até um ressurgimento do movimento ecumênico com o mundo oriental e ocidental. Diálogo interconfessional. Teólogos de todo o mundo buscam reinterpretar o sentido da vida, o sentido de uma evangelização libertadora, ampliando esses diálogos e trabalhos conjuntos em nome do cristianismo e mesmo de outras confissões religiosas. E mesmo laicas, ateias, animistas na busca de um mundo mais justo e mais fraterno, e que querem romper laços com os neocolonialismos. Depois do Concílio surgem conferências latinas, africanas e asiáticas e mesmo na Europa cristã carcomida, indiferente pela opulência, guerras, consumismos. E de quase abandono dos objetivos teóricos e práticos de Jesus Cristo. E em nome do Pai e do Espírito Santo, buscam luzes para nossos passos e engajamentos pro mundo melhor para toda humanidade. Será possível? E os nossos pecados capitais modernos? E os confinamentos dos migrantes. E refugiados e expulsos de um presente e futuro melhores dados os alastramentos de guerras, geopolíticas. E mais controles das riquezas, espaços, estudos com limites materiais que sobrepõem aos culturais e espirituais dada a concentração de riquezas nas mãos nada santas de poucas pessoas e empresas transnacionais, bancos, tráficos. E mais lavagem de dinheiros roubados, sonegados, drogados, e colocados nos paraísos fiscais? Temos muitos impostos. Temos mais incentivos para poucos e ricos. E muitas sonegações fiscais e manipulações midiatizas. Quem paga mais impostos diretos e indiretos são em grande parte os pobres, pequenos consumidores empreendedores.

É neste concerto de nações, igrejas, movimentos sociais e políticos que padre Sergio e Ângelo viajam para o Brasil, para Goiás, Goiânia, Bela Vista, Cristianópolis, Caldazinha, Roselandia e São Miguel do Passa Quatro. Lá nos céus encontra pais, irmãos, parentes, amigos do Brasil e da Itália. Aqui foi recebido por muita gente. E por todas aquelas pessoas que amavam e amam pra valer a mensagem revolucionária de Jesus Cristo. Nos céus quantas gentes boas gentes Sergio Bernardoni reencontra como fernandos, mouras, geraldinhos, katerines, pereiras, lourivals, d. celso e alaor figueredo. E mais oscaws, nativos, sebastiãos, zé porfírios, revys, dalels, d. tomás, nilces. Aqui deixa os padres alcides, césars, alaores, leos, geraldos, ângelos. E também dinorás, alonsos, edevaldos, nelsons, ivones, marcos, marianas, iedas, anas, lucias, canutos, elzas, melinis, henius, carlitos, vanins, soninhas. E mais pedros casadaliga, boffs, carlos, delmas, marinas, serjãos, marias, ângelas, gabriels, zéfernandes, fafaus, arilenes, olivias, adãos, zerosas, irenes, galegos, gesos, luzias, zémarques, fabios, ivos, terezas, veras cortez, sinvals, isacs, elias, antônios, anicetos, afonsos, daris, persivals, valters, altamiros, beneditas, joaquins, durvalinos, catarinas, claudinas, glórias, hélios, epitácios, brizolas, jesus flores, albertos, maria hernandez, pilares, wolmirs, olgas, baianos, zezãos e tantas gentes destes cerrados das águas (secarão um dia?) emendadas deste Brasil central de JK a Lula e Dilma na luta pela emancipação do povo trabalhador das cidades e dos campos  face ditaduras passadas e golpes e contra golpes presentes profundamente temerários para a caminhada do povo de Deus, dará. Dará continuidade aos projetos de partilhas, ecologia social, misericórdia, alegria, saneamento básico, biomas, trabalho, educação, saúde, cultura, lazer. E liberdade e fraternidade com pão e mel na barriga e na poesia. E mais celebrações e orações e ações solidárias para nossos viveres, bem viveres e melhores conviveres. Tudo para nossos corações e corpos pela liberdade e segurança social e alimentar para todos sem tetos, sem terras. E sem trabalhos, sem oportunidades, chances de vida digna. Liberdade para os movimentos políticos, sociais, populares e culturais. Oxalá seu exemplo, Sérgio Bernardoni cruze todas as linhas imaginárias por felicidades e bem quereres, amores sem fim. E mais risos soltos e compromissos até atrás dos morros de nossos sertões brasileiros gritantes por águas e terras para matar a sede e a fome de milhões de condenados, presos, doentes, migrantes, refugiados, pobres, sequestrados. E violentados nos corpos e nas almas mais lutadoras por justiça e paz. E por cultura da paz que tanto lutou Sérgio Bernardoni com Maria Conceição, Francisco e Daniel, família para sempre.

Repetindo que em 1972 motivados pelo Concilio Vaticano II, padre Sérgio e padre Ângelo partiram para o Brasil como missionários. A primeira experiência missionária deles foi em Bela Vista de Goiás. E onde encontraram um situação social, econômica e pastoral muito difícil. Era tempo da ditadura militar, oficialmente não se sabia de nada, era um tempo terrível de torturas e mortes nas prisões do Brasil. Perseguições à Igreja que profeticamente lutava contra as injustiças. Depois de seis anos de trabalho no Brasil, voltaram para Itália. Um ano mais tarde em 1979 padre Sérgio, a convite de Dom Fernando, retorna ao Brasil e assume a Paróquia Nossa Senhora de Lourdes, onde incansavelmente, trabalhou para transformar a vida dos mais necessitados.

Em 1987, casou-se com Maria Conceição e tiveram Francisco e Daniel. Mesmo casado padre Sérgio não abandonou sua vocação missionária. Convidado pelo Padre Viana, mudou-se com a família para Colina Azul, onde deu continuidade ao seu trabalho de promoção da vida. No final de 1988, no Centro comunitário João XXIII, apoiado pela Irmã Maria Hernandez, onde Sérgio abre a primeira loja da Cara Vídeo e a partir daí inicia uma nova forma de exercer sua pastoral que se estendeu por varias cidades: Aparecida, Inhumas e Goiás. Em parceria com Leo Pereira, do Criméia resistência. Inicia um trabalho no Centro Social Cidadania Plena, que recebe crianças e adolescentes da região levando cultura através dos cursos de: música, teatro, computação e capoeira. Esse projeto era a menina dos olhos de Sérgio. Ele não abria mão da visita quinzenal a CPP, onde junto com alguns amigos, fazia um trabalho de formação junto aos jovens encarcerados. E o trabalho não parou por ai, em 2005 nasce o Centro Cultural Cara Vídeo, que coroou todos esses anos de trabalho dedicados não só a igreja, mas a cultura e a educação. Além de todas essas atividades se encantava com o ecumenismo, com anglicanos, luteranos, metodistas, assembléias de Deus, batistas, ortodoxos e católicos. Vale lembrar ainda, o movimento de padres casados e suas famílias, pelo qual lutou até o ultimo respiro. E quantas reuniões, celebrações animou, registradas na revista da arquidiocese.

Padre Sérgio Bernardoni fez sua páscoa. Padre Sérgio Bernardoni fez sua passagem para o Pai no sábado dia 20 de agosto de 2016. Desde de 2.000, Sérgio convivia com um câncer. Entre um tratamento e outro foi superando com muita fé e energia as agruras desta doença. Com 86 anos sua caminhada por este mundo se encerrou. Viva a vida.

Pe. Sérgio era chamado por todos. Veio ao Brasil como missionário. Afastado do ministério presbiterial por ter se casado com Maria, ele continuou muito ativo e presente nas atividades da Igreja. E foi um dos promotores do Centro de Vivência Ecumênica, que reunia para estudos e orações pessoas de diversas religiões. Lá aumenta os estágios para alunos da UFG, PUC e UEG.

Sempre se mostrou um grande admirador da arte cinematográfica. Foi animador de Cineclubes tanto na Itália quanto no Brasil. Em 1988 fundou a Cara Vídeo – Centro Alternativo de Recursos Audiovisuais – para promover a cultura e o sadio entretenimento na cidade de Goiânia, onde reuniu um grande acervo de documentários e filmes. Mais tarde criou o Centro Cultural Cara Vídeo, um ponto de encontro da Cultura Goiana. Um espaço aberto para atividades culturais e pastorais. Um espaço aberto para os que viram as portas fechadas por outras instituições tanto publicas quanto eclesiásticas e civis.

O Centro Cultural apóia e/ou abriga hoje CPT, CIMI, Cebi, ABD, Curso de Verão, o Cajueiro – Centro de Formação Assessoria e Pesquisa em Juventude, as CEBs, o Grupo de Vivência Ecumênica, o Movimento de Meninos e Meninas de Rua, o Movimento de Moradores de Rua, o Instituto Reflexão (pós-graduação na área de Educação) e o Comitê de Direitos Humanos Dom Tomás Balduino (diante do processo de criminalização de Valdir, Luiz e Lázaro, dos movimentos populares, de modo especial o MST), o Centro Cultural Eldorado Carajás (que trabalha, sobretudo, com adolescentes das escolas públicas da periferia), e a Comunicativa (ONG de comunicação).

Como reconhecimento pelo seu trabalho recebeu, do Instituto de Cultura e Meio Ambiente – Icumam, uma homenagem na 4º edição do Festival Goiânia Mostra Curtas, em 2004; na Câmara Municipal de Goiânia; o Troféu Lobo Guará – oferecido pela PUC – GO, em 2004; o Igualdade Racial, em 2006; a Medalha de Mérito Cultural – Conselho de Cultura, em 2009 e do júri oficial do Fica, em 2013. Pe. Sérgio Bernardoni deixa grande saudades na cidade de Goiânia onde desenvolveu seu trabalho desde que veio ao Brasil. Seu corpo velado nas dependências da Paróquia Nossa Senhora de Lurdes, Vila Jaraguá, foi sepultado em Cristianópolis, de onde é a família de sua esposa. Ficam muitas lembranças, saudades, amores, exemplos.

Sérgio Bernardoni tua força e testemunho continuam presentes animando os que lutam pela superação das desigualdades. E por justiça, democracia, paz, participação e cidadania, sempre. Creiamos em Deus e na história que liberta todos homens e mulheres do planeta terra/água.

 

(Pedro Wilson Guimarães, professor da UFG e da PUC-Goiás – Sociologia e Política 1968-2010. Secretário de Direitos Humanos e Políticas Afirmativas da Prefeitura de Goiânia, 2015/2016. Foi vereador, deputado federal e prefeito de Goiânia – 1994 a 2011/PT. Militante de Movimentos de Fé, Alegria e Política, Educação, Cerrados e Direitos Humanos/sempre)

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