Soja, rainha do Agronegócio Brasileiro (VI)
Diário da Manhã
Publicado em 23 de março de 2018 às 22:01 | Atualizado há 7 anosA corrida pela substituição da lavoura de subsistência, arcaica e improdutiva, pela agricultura de mercado, moderna e produtiva, começou no final da década de sessenta, com os ensaios FAO – Anda – Abcar, sendo a Acar-Goiás, a executora. Houve mais de um coordenador, dentre eles o Engenheiro Agrônomo, Armantino Alves Pereira, estes ensaios, como já comentados, foram feitos em três anos consecutivos e, eram insistentemente supervisionados, pois, tinham uma missão a cumprir. Ao todo, foram mais de mil e pioneiros, seu objetivo: fornecer os subsídios para modernizar e, ao mesmo tempo, diversificar a lavoura, assim, substituir a monocultura dominante. Substituir, dita monocultura, por meio da incorporação, do cerrado no processo produtivo. Tratava-se de inovação, como toda inovação, carecia de inovadores além da motivação que começava a ser feita, pelos agentes de extensão rural, além do concurso do governo, com uma arrojada política agrícola. De sorte que, para vencer o tradicionalismo, resistência à inovação, tinha que se valer de perseverança na arte da motivação.
O arroz, monocultura dominante, no antes, sem necessidade do concurso do pó milagroso, o calcário, vincou, embora com baixa produtividade, o solo de cerrado, contudo perseguido pela baixa produtividade, mas, de repente, foi premiado por outro pó milagroso, o fosfato de rocha, com isso, tornou-se de pé de boi do cerrado, quase dobrando a produtividade, todavia, acabou derrotado pela perecibilidade aos veranicos, frustrando colheitas e seus cultores, rizicultores, em vez de riqueza, lucro, gerava pobreza, ensejando a luta pela diversificação. Como, de fato, ocorreu tendo como ponto de partida, a política encetada pelo Governo Federal – ministério da agricultura e governo do estado – secretaria da agricultura, arrancada, no primeiro ano da década de setenta do século XX. A combinação de fatores da produção, como solo agricultável de cerrado, com o concurso de insumos modernos, como calcário, seguido de adubação química, no plantio mecanizado, instrumentos inovadores porquanto redutores de mão de obra e mentores de maior produção e produtividade, associado as sementes potenciadas, pela benfazeja genética, como o caso das sementes de soja, melhoradas para nosso clima, pela Emgopa de igual forma, a de milho.
Ademais, aprimoramentos permanentes, para que a soja, rainha do cerrado, chegasse a produtividade atual, superior as três toneladas hectare, alcançando, com razoável, engenhosa, combinação de fatores e insumos, a quatro mil e trezentos kg hectare, com a precoce e o concurso da irrigação, três safras num só ano. Demais a otimização de sementes por área, espaço entre ruas, momento adequado, auxiliado por política agrícola, de juros compatíveis, modernização e lubrificação dos meios de transportes, incentivo a industrialização e exportação poderia duplicar a atual produção de soja, hoje, igual à dos EUA. A política agrícola do primeiro ao último ano, da singular década de setenta, singrou de vento em popa, para mergulhar, em crise tenebrosa, na década de oitenta. Os maus negócios, corrupção sempre assolou nossa república, república do faz de conta, faz de conta porquanto gerida por maus governantes. O programa, como dito, substancioso de financiamento agrícola, acabou desviado de sua função fundamental, por especuladores da mesma laia dos gestores da república do faz de conta. Com efeito, em gesto inqualificável de velhacaria, tal qual, os envolvidos na operação Lava Jato, aproveitando da inusitada política de modernização e expansão, como nunca dantes vista, da agricultura: lavoura e criação, fazendo o, então, improdutivo cerrado, em fonte geradora de progresso, bem estar do país, passaram, a comprar ou falsificar notas fiscais, para retirar no banco, mediante projetos fajutos, verbas destinadas ao financiamento agrícola. A nefasta operação ficou conhecida como “adubo papel”.
Cabia ao governo do senhor João Figueiredo enquadrar todos os maus feitores na lei, e, no lugar de mudar abruptamente, a política de crédito rural, continuar financiando os verdadeiros agricultores. Orientado pelo ministro da agricultura – ministro divorciado do meio rural, a cultura do senhor Delfim Neto, embora douta, é em economia, foi inclusive, professor da USP, ministro da fazenda, duas vezes, mas, na agricultura foi vexame, fundado no escândalo do adubo papel, induziu o presidente, já mencionado, a cortar todos os subsídios à agricultura, beneficiando especuladores e prejudicando centenas de produtores, destes, muitos tiveram que vender suas propriedades, para quitar suas dívidas com o banco. De forma que, a política atabalhoada da época, desencadeou toda sorte de malefícios, tanto para os produtores rurais que surpreendidos pela mudança das regras do jogo, no meio do ano agrícola, ficaram arruinados, assim pararam de produzir alimentos essenciais ao abastecimento da população, sociedade consumidora, como acelerar o crescimento econômico, através da circulação de mais e mais riqueza, como aconteceu na década finda. A política de expansão, de repente, na contramão, vira contração. Contração alimentando inflação durante vários governos: Figueiredo, Sarney, Collor.
A soja, já na época influenciada pelo mercado internacional, embora os reveses, foi a que menos sofreu no que diz respeito a retomada da expansão, não encolheu, tanto no que diz respeito a área plantada, como na produtividade, outrossim, já era, em parte, financiada pelo próprio mercado. A condição de Rainha despontava, como rainha consolidou-se, dessa forma, foi sublimada pela excelente qualidade, e, aliado a ela, geração de serviços, impostos e empregos. Utilitária, generosa, na arte culinária, onde alimenta a indústria de muitos produtos nutritivos fazendo substanciosa a mesa do consumidor, ou mesmo, na condição de combustível, usada na fabricação do biodiesel, ademais, o cobiçado farelo, a substanciosa torta, pelo sabor e riqueza proteica, também Rainha, a mais requisitada no balanceamento de rações, para a pecuária leiteira e de corte, de igual modo, nas granjas produtoras de frango, suínos, alimentação de peixes.
Retomando a política que abriu as fronteiras dos cerrados, até então intocáveis, as lavouras mecanizadas, na década de setenta, século XX, cultivo de soja, milho, sorgo algodão, e, mesmo aos cafezais, arroz, feijão irrigado da estirpe do carioca, antes inexistente, mas disponibilizado pela pesquisa – carro chefe de todo desenvolvimento – na fruticultura os melanciais, delicioso melão, laranjais, o avanço espantoso na agricultura, como também na pecuária, maior rebanho do mundo, açodou, despertou a atenção dos EUA, ainda agora, maior produtor de alimentos do planeta. Imagine, a preocupação foi tal que ensejou, uma visita do secretário de estado da agricultura, juntamente, com o então diretor do Banco Mundial, MacNamara, e assessores a visitar o Brasil. A visita, um tanto normal, pois, os recursos financeiros que subsidiou a modernização da agricultura, através da incorporação do cerrado no processo produtivo, foram emprestados pelo Banco, em referência. Entretanto, o que causou intriga, foi eles: Secretário de Estado e Diretor do Banco Mundial, aconselhar o ministro da agricultura, totalmente inculto, na área agrícola, a cortar abruptamente, tais subsídios.
Naquele país, a agricultura atingiu patamar de campeã e vem o sustentado, a bem tempo, por meio de subsídios, ainda, mais generosos do que os que vinham sendo praticados, em nossa agricultura. Enquanto os investimentos no centro-oeste eram muito mais pesados: incorporação de novas fronteiras, desbravamento, cerrado bruto, o deles, EUA, eram, há muito, feitos em terras já cultivadas, há quase um século. As consequências decorrentes da rude mudança nas regras do jogo foram bastante funestas, tanto para os produtores, de fato, como consumidores, quase nada, para especuladores do, então, famoso adubo papel, à espreita, em todo lugar, como raposas, aguardando o momento de abocanhar a presa, no caso, enriquecer sem trabalhar. No lugar da razão, usava o instinto maquiavélico. Esquece propositalmente, por conveniência, que o trabalho ordeiro, honesto, é importante, deveras importante, não apenas por possibilitar mais dinheiro, pois, é ele, um eleito de Deus, trabalhando corretamente, tanto alimenta o organismo, como o espírito. Alimentando o espírito, preenche os espaços vazios da mente. Mente vazia, como alertava minha inesquecível mãe, Maria José, oficina do diabo, enfim, torna-se ele, bálsamo para a vida.
Voltando, a rude mudança da política agrícola, o governo, mal assessorado por seu ministro, douto em economia, porém analfabeto em agricultura, falhou, premiou seu instinto animado pelo adubo papel, punindo os produtores rurais e premiando os especuladores, legando como caldo de cultura, falta de produção de alimentos, o desabastecimento, crise sem precedentes de víveres nos supermercados, levando o governo seguinte, o do muda Brasil, a importação de alimentos, neles, a famosa carne vinda da Rússia, suspeita de estar contaminada pelo desastre atômico de Chernobyl. Toda importação acabou sendo realizada por meio de propina.
Pense bem, já no primeiro governo da abertura democrática, a corrupção endêmica, subvertendo os princípios morais que deveriam ser regra de ouro na república. A crise de abastecimento acelerou a inflação, redistribuindo renda, das classes mais pobres, para as mais abastadas, em especial, banqueiros, agiotas, especuladores. Em virtude da política estrábica, a expansão da agricultura marcou passo, durante toda a década de oitenta, voltando crescer, na seguinte. Embora os reveses de uma política agrícola macabra, macabra, por ter levado miríade de lavouristas a ruina, morte financeira, a soja, graças a sua resistência aos veranicos, palatabilidade, riqueza proteica, preços seguros no mercado internacional subsidiada, pelos insumos modernos, vincou os campos cerrados, tornando-se Rainha do agronegócio brasileiro.
(Josias Luiz Guimarães, veterinário pela UFMG, pós-graduado em filosofia política pela PUC-GO, produtor rural)