Tempo de Quaresma
Redação DM
Publicado em 28 de fevereiro de 2018 às 23:13 | Atualizado há 7 anos
Quaresma é tempo de penitência que se segue aos desmandos do carnaval. São quarenta dias de jejum e de orações, lembrando a longa peregrinação dos judeus que, saídos do Egito, peregrinaram pelo deserto em busca da Terra Prometida. De acordo com a liturgia cristã, a quaresma finda no Domingo da Páscoa quando se celebra a ressurreição do Senhor e – em sentido mais amplo – a vitória da vida sobre a morte.
Eis que nesse tempo de quaresma a sensação é de expectativa: 2018 finalmente começou, mas há incógnitas fervilhando no ar. A melhora relativa da economia não elide o fato de que este é ano de eleições. E o quadro político permanece enevoado.
A começar pelo fato de que o protagonista central da encenação – a das eleições – seria o quase candidato Luiz Inácio Lula da Silva. Pesquisas de opinião indicariam que mais de um terço do eleitorado o elegeria, enquanto outro tanto se absteria de ir às urnas ou votaria em branco. O que asseguraria ao petista a certeza de ser imbatível nas eleições de outubro próximo.
Só que, de duas semanas para cá, Lula recolheu-se aos bastidores, desapareceu; conhecido pela prolixidade e pela oratória claudicante (embora eficiente) calou a boca. Seus arautos anunciaram que ele percorreria o país, divulgando ideias e pregando soluções sobre como nos governar – e, certamente, como recuperar a economia quebrada e os empregos desaparecidos durante o consulado petista. Sem que o ex-presidente nisso tivesse qualquer parcela de responsabilidade, é claro! Mas tal não aconteceu.
Na sequência do acórdão que o condenou em segunda instância por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, diariamente se via o enfurecido quase candidato a verberar contra a injustiça de que fora alvo, a perseguição de que seria vítima, a estrutura viciada dos tribunais brasileiros, dominados pelas forças retrógradas da burguesia. Para diversificadas plateias, vestindo camisetas vermelhas, com o rosto igualmente rubro de indignação, o condenado Luiz Inácio Lula da Silva clamava contra a decisão dos desembargadores gaúchos e até ameaçava puni-los, quando voltasse (?) a assumir o mais alto cargo executivo do País.
De repente – silêncio! Nesse meio tempo, a mídia noticiou gestões que teriam sido feitas junto a um ex-ministro da Corte Suprema, para que assumisse ou colaborasse com a defesa do injustiçado/indignado ex-presidente. Boatos e fofocas circularam no reino da fantasia (e da maledicência) que é a capital federal. Cifras foram divulgadas, sempre na casa dos milhões – e haja milhões!
Certo é, porém, que na nova fase da defesa de Lula a discrição tem prevalecido. Ele submergiu, no melhor estilo dos criminosos que, esquivando-se da luz dos holofotes, esperam amenizar a indignação da sociedade, até que o noticiário sobre outros crimes venha a ocupar as manchetes.
Claro que se há de respeitar o direito de defesa de condenados e réus. Direito que é sagrado e não pode ser negado, nem mesmo em circunstâncias extremas. Entretanto, a pergunta que me verruma a consciência é: de onde vêm os milhões que estariam sendo pagos a bancas de criminalistas famosos, sobretudo no circuito Brasília/São Paulo/ Rio de Janeiro?
Não é segredo para ninguém: o assunto é objeto de reportagens, entrevistas, comentários entre profissionais do ramo. Os comentários são recorrentes sobre os advogados da turma do mensalão e da lava-jato, que seriam regiamente pagos; e toda a gente sabe que tais réus e condenados roubaram dos cofres públicos, apropriaram-se de dinheiro dos contribuintes.
Em assim sendo, recursos de origem ilícita seriam convertidos em salários/honorários de advogados. Na minha crassa ignorância pergunto: a esse passe de mágica dá-se o nome de lavagem de dinheiro? Creio que assim seja, já que milhões estariam sendo “lavados” por clientes e causídicos, quem sabe comportando até uma discreta associação/repartição do numerário entre uns e outros?
Escriba impenitente e ranzinza que sou, não resisto a mais uma pergunta: tendo em vista o direito de defesa da turma do mensalão e do petrolão, por que não designar advogados dativos para tais beneméritos? E – no embalo – por que não circunscrever eventuais penas de prisão domiciliar a residências do tipo “Minha casa, minha vida?”
Concluindo: sem querer ser parcial em relação à “alma mais honesta do Brasil”, deixo em aberto a hipótese de Lula ter optado por um retiro espiritual, para jejuar e orar em consonância com o tempo de quaresma em curso.
(Lena Castello Branco – lenacaste[email protected])