Vida de goleiro: o outro lado do paraíso ou do inferno
Diário da Manhã
Publicado em 9 de janeiro de 2018 às 01:55 | Atualizado há 7 anosPara ele o erro é uma manifestação do pecado, da falha crucial e do lance que pode mudar a história do jogo. Arqueiro, goleiro, guarda metas, guapo e por tantos outros nomes identificados. Se defender um pênalti vira herói: se levar um gol fácil entra para a galeira dos crucificados. A posição mais ingrata do futebol e o menino quando não tem talento vai ocupar essa posição. Barbosa, Manga, Valdir Peres, Félix, Ado,Taffarel, Dida, Leoneti, Marola, Sorriso, Ronaldo, Rogério Ceni, Leandro Lopes, Wagner Bueno, Júlio César, Veloso, Gilmar são alguns exemplos de quem se consagrou na posição mais ingrata do esporte bretão. Jogar, treinar, ter bons reflexos e pensar na frente do atacante. Sair de soco ou até se ajoelhar para fazer uma grande defesa. Durante 90 minutos ele será olhado, criticado, até elogiado se fizer um milagre entre as traves e o travessão de goleiro, o outro lado do paraíso ou do inferno, dependendo do resultado do jogo ou do lance marcante. Ser goleiro é gostar de sofrer? Talvez não.
Ser goleiro é pular, imaginar, chutar, buscar a melhor colocação e antecipação do lance do futebol. Ele é intocável dentro da pequena área, mas nem por isso é menos cobrado ou lembrado pela torcida. Num gol que tem o tamanho de 7, 32 por 2, 44 metros, ele precisa ter reflexo e capacidade de antevisão do lance. Cada treino mexe com sua condição física e autoestima e jamais poderá ser chamado de frangueiro ou peru, mesmo que seja um homem ecológico e devotado aos animais. Vida de goleiro não é fácil, pois terá de defender mais de 100 bolas nos treinos e ainda se concentrar para ter no jogo o mesmo desempenho os treinos. Se o jogo estiver calmo, ele será apenas um expectador privilegiado; mas se seu time sofrer um bombardeio ele será o mais exigido e cobrado. Vivendo entre o céu e o purgatório o camisa 1 busca motivação para mais uma partida e consegue tirar forças de seu íntimo para entrar em campo e enfrentar a torcida adversária. Se levar um gol de pênalti é normal: mas se defender a cobrança da penalidade poderá virar herói numa final de Libertadores, Copa do Mundo ou amistoso num campinho de terra batida. Vida de goleiro, uma arte e missão, uma vontade de fechar o gol e ser o homem mais feliz do mundo depois de agarrar a amada e procurada bola. Ser goleiro é navegar entre a saudade e maldade, enfrentar rios de águas turbulentas e acordar na margem da esperança. Jogar com os pés, ser atento, ter boa impulsão, reflexo, agilidade e colocação são requisitos especiais para um goleiro. A arte de fechar o gol pode ser copiada, imitada, inspirada, mas cada arqueiro busca ter o seu estilo. É o atleta que se veste melhor e carrega a responsabilidade de segurar o resultado do jogo, tanto pelo lado negativo quanto positivo, pois em suas mãos está a chave do “outro lado do paraíso”. Pela contexto da história nos lembramos dos grandes lances do futebol, como o frango de Valdir Peres na Copa do Mundo de 1982 num jogo contra a União Soviética ou mesmo do momento em que Barbosa foi acusado de falhar no gol do Uruguai na Copa do Mundo de 1950, em pleno Maracanã. Existem vários capítulos para ilustrar essa posição, como o chavão que ficou famoso: “Sai que é, Taffarel!”.
A vida do goleiro é solitária, mas ele precisa ser solidário na vitória ou na derrota, sendo o ponto de equilíbrio do time. Ser goleiro é cruzar as pernas diante do medo e fazer as defesas mais singulares da História do Esporte; mas ele levar “um frango” poderá ficar sozinho na sua tristeza. A arte de fechar as pernas e o gol mexe com o inconsciente coletivo e alguns maldosos até brincam, dizendo que o goleiro é louco ou bicha. Mas ser goleiro é uma missão e determinação em cada bola alçada na área, pois de suas mãos poderá nascer a alegria, a consagração, a tristeza, a luz ou as trevas. Assim também é nossa vida, rodeada de sorrisos e lágrimas, torcendo para que no final o crédito supere o débito. Sorriso operário do homem das luvas, atleta especial, personagem central do concorrido mundo da bola. Talvez a sua maior vingança seja também fazer um gol, qualidade consagrada pelo jogador Rogério Ceni. No capítulo final o goleiro receberá um troféu ou uma vaia, até o próximo jogo. A exemplo do juiz e do médico, o goleiro não pode falhar. Vivendo entre o paraíso e o inferno, para receber ao final de 90 minutos o veredicto de herói ou vilão. Sai que é sua Taffarel, Vanildo, Manga, Marcelo Rangel, Márcio, Marcos, Cássio, Fábio, Muralha, Cléber Guerra, Iuna, Harley, Mazaropi, Renan, Felipe, Diego, Carlos Germano, Zé Rosa, Leandro Lopes, Leão…
(José Carlos Vieira, o Lela, escritor, jornalista, fotógrafo da Secretaria de Esportes de Rio Verde. E-mail lelabalela1@hotmail.com)