Política

Caiado pegará Estado quebrado

Diário da Manhã

Publicado em 18 de outubro de 2018 às 02:21 | Atualizado há 7 anos

Diferente de outros momentos, Estado de Goiás apresenta pior cenário na indústria e varejo. Instituições acumulam dívidas que ultrapassam R$ 20 bilhões. Sob intervenção, hospital mais importante do Estado não tem insumos necessários

O governador eleito Ronal­do Caiado (DEM) terá dois meses para tentar desar­mar uma bomba-relógio deixada para ele e sua equipe: a máquina pública que pegará a partir de janei­ro de 2019 dá sinais de vários defei­tos de multifuncionamento e um de falência múltipla que pode afetar o funcionalismo público e o sistema de saúde, educação e segurança pú­blica. A explosão é iminente.

Nos últimos 30 anos, conforme se observa na comparação com ou­tras épocas e governos, no cenário anunciado principalmente pelas manchetes da imprensa, Caiado pe­gará o pior Estado já deixado para um governante, com um corpo in­chado, dificuldade de arrecadação de tributos diante da crise e desaba­mento das políticas sociais.

Na terça-feira, Ronaldo Caiado deixou claro em sua rede social que pretende cumprir todo o ritual an­tes da posse: indicar uma equipe de transição com técnicos prepa­rados para realizar um diagnóstico imparcial do Estado. Na sequência, o grupo, orientado por Caiado, de­verá adequar o Plano de Governo vencedor ao cenário identificado.

Um dos integrantes do grupo, com certeza, será o deputado esta­dual Lívio Luciano (Podemos), que perdeu a reeleição e tem como car­reira pública a atividade fiscal des­de 1984. Será missionário em um quadro de muitos débitos a pagar.

Por fim, com equipe formada, o novo governo pretende cumprir uma agenda de enfrentamento de crises e prioridades. Que o povo goiano se prepare, pois o cenário encontrado é desolador. Relatórios e ações do Ministério Público do Es­tado de Goiás (MP-GO), Ministé­rio Público do Trabalho, do Tribu­nal de Contas do Estado de Goiás (TCE-GO), investigações criminais realizadas no âmbito da Lava Jato e números do portal Transparência mostram o pior “fim de governo” da história de Goiás.

O cenário é principalmente crí­tico no adimplemento de obriga­ções firmadas com a sociedade civil e servidores: Organizações Sociais (OSs) estão em atraso com repasses, hospitais públicos so­brevivem sem material para cui­dados básicos, ameaças de falta de combustível na Segurança Pública são diárias, parcelamento/atraso de remuneração já é uma realida­de, concursados aguardam serem chamados para trabalhar.

Diante deste quadro, o ges­tor costuma adotar medidas ur­gentes para que a máquina não emperre. Políticos próximos do senador informam ao DM que Caiado tem interesse em ser bas­tante detalhista no “inventário” de como pegará Goiás para não ser injustiçado depois. Por outro lado, trata o problema com espe­rança de que a boa gestão possa mitigar deficiências já sentidas pela população que depende de serviços públicos essenciais.

COMPLIANCE

Conforme Ronaldo Caiado, uma das dire­trizes de seu Plano de Go­verno é adotar um sistema de com­pliance – um conjunto de ações in­tegradas cuja missão é cumprir o princípio da legalidade, além de de­tectar e evitar desvios.

O senador acredita que o contro­le dos órgãos sob o viés da legalidade pode reduzir drasticamente gastos públicos desnecessários, fazendo, desta forma, com que aumentem recursos para investimentos.

Durante entrevistas na cam­panha eleitoral, Caiado disse que detectar os desvios de recursos e a corrupção – que tem motiva­ do várias denúncias – pode ser a ação mais eficaz para dinamizar as ações do Estado. Este será o pri­meiro diferencial do novo governo.

REFORMA ADMINISTRATIVA

Além do “compliance”, nos úl­timos dias aumentaram rumores de que Caiado faça uma reforma administrativa – quando ocorrem mudanças nos órgãos da adminis­tração direta e nas entidades da or­ganização indireta. O Estado já vem de uma grande e ineficaz reforma administrativa realizada pela atual gestão. Caiado teria interesse em corrigir estes problemas.

Apesar de reduzir drastica­mente o número de pastas, com o ato de fusão de secretarias, a atual gestão aumentou o núme­ro de servidores públicos.

A reforma realizada em 2014 ser­viu mais para confundir do que para economizar recursos públicos. Um exemplo: quem passa de frente para a Secretaria da Agricultura (Seagro), no setor Universitário, sabe que ela não existe mais. Mesmo assim ainda permanece identificada como tal.

O governador eleito tende a fa­zer o inverso: reduzir o número de comissionados e recriar pastas que foram extintas na gestão 2014-2018 – caso das secretarias de Cultura e Agricultura. O senador foi o único na campanha que se comprome­teu em valorizar os dois segmentos com o retorno de uma secretaria que possa atender aos dois segmentos.

A ausência das duas pastas dei­xaram vazios notórios, como na área de literatura e artes plásticas – negligenciadas na formação de no­vos talentos e criação de eventos de destaque – e na agricultura, que pra­ticamente nada fez para cooperati­vas e pequenos agricultores.

 

 Situação do Estado está próxima da falência

A situação do Governo de Goiás é grave: economistas e especialistas em direito financeiro consultados pelo DM sugerem que Ronaldo Caiado possa até mesmo decretar “Estado de calamidade pública no âmbito da ad­ministração financeira”, como ocor­reu no Rio de Janeiro. Tudo depende­rá do quadro encontrado nos órgãos, empresas públicas e contratos aven­çados com entidades privadas.

Após a interdição do Hospital de Urgências de Goiânia (Hugo), ação orientada pelo Ministério Público do Trabalho, o grupo vencedor das elei­ções teve a sinalização mais clara de que a gestão já está travada: faltam mais de 150 itens como insumos e medicamentos para os profissionais da saúde realizarem seus serviços no Hugo – hospital de referência de Goiás desde a década de 1980.

Sem álcool gel, paracetamol, an­tibióticos, jamais o Hugo chegou a tamanha situação calamitosa justa­mente em um ano eleitoral e depois do Estado ter em mãos os recursos da venda de sua maior estatal – a Celg.

Enquanto a imprensa trata de ca­sos isolados, mostrando as correrias em cada órgãos, é na central de ar­recadação – Secretaria da Fazenda – que se identifica os rombos tributá­rios que comprometem 2019.

Pesquisa Industrial Mensal – Pro­dução Física Regional. No estudo “Pesquisa Industrial Mensal – Pro­dução Física Regional” mais recen­te, mostra que a crise afeta, princi­palmente, a indústria goiana: Goiás é o Estado que mais sofreu perdas no ano (-3,6%). Para se ter ideia da situa­ção, no mesmo período, o Amazonas teve alta de 10,9% e Pará 9,2%. Tais dados afetam imediatamente a pro­dutividade e geração de empregos – e, consequentemente, arrecadação de tributos essenciais como o ICMS.

No agronegócio, apenas lamen­tos: conforme a nona estimativa de 2018 para a safra goiana de cereais, leguminosas e oleaginosas, Goiás to­talizou 21,58 milhões de toneladas, 4,8% inferior ao total obtido na safra de 2017 (22,67 milhões de toneladas).

Para quem acha que Goiás não pode piorar mais, um dos segmen­tos essenciais da economia, o setor terciário, sofreu a metástase da falta de empregos – Goiás até aumentou as ocupações formais identificadas pelo Caged, mas aumentou também a informalidade, que não é medida por nenhuma pesquisa e não garante uniformidade de provimentos.

Em julho, conforme levantamen­to do IBGE, Goiás foi o estado com o maior recuo nas vendas no acumu­lado dos últimos 12 meses: -4,8%.

DÍVIDAS DE PRECATÓRIOS

Caiado herda ainda uma das maiores dívidas de precatórios do Brasil. Se não entrar mais nenhu­ma dívida para o Estado de Goiás quitar, toda a dívida será adim­plida em 95 anos. Os valores to­tais já beiram a casa de R$ 1 bilhão em dívidas diversas que o Esta­do deveria pa­gar. Como a fila anda a passos de tartaruga, muito mor­rem espe­rando o pa­gamento.

Confor­me dados do Tesou­ro Nacio­nal, Goiás apresenta comprometi­mento de suas re­ceitas correntes mui­to elevado, sendo o terceiro estado que mais gasta sua receita com pessoal. Da mes­ma forma, esta dentre as unidades da fede­ração mais endivida­das do país.

Go iás po ss u i atualmente uma dí­vida de cerca de R$ 20 bilhões para os co­fres federais. Em 2006, a dívida era bem me­nor: R$ 11,5 bilhões.

 

 Goiás teve “sorte” em crise de 2014

Para enfrentar a crise que se anun­cia, Ronaldo Caiado (DEM) terá apoio do governo federal, caso o de­putado federal Jair Bolsonaro (PSL) seja eleito. Mas nem de longe terá as facilidades recentes que beneficia­ram as últimas gestões.

Vencendo Bolsonaro ou Fernan­do Haddad (PT), o País que será en­tregue está em situação calamitosa, semelhante ao Estado de Goiás.

No Estado, o governo que ter­mina, por exemplo, contou com recursos da venda da Celg (comer­cializada por R$ 2,1 bilhões, mas que efetivamente devolveu para o Estado menos de R$ 1 bilhão).

Goiás estava em crise nos anos iniciais da década, principalmen­te diante da explosão da Operação Monte Carlo – que afetou a ima­gem do governo e acabou por de­primir as ações de Estado diante da devassa que afetou os goianos.

Em 2014, antes de ser preso, o ex-senador Gim Argelo (PTB), um dos principais defensores do go­verno Dilma Rousseff, narrou ao Diário da Manhã como Goiás dri­blou a crise naqueles anos.

O político lembrou que a ‘bo­lada’ recebida perante a distribui­ção de royaltes do petróleo en­contrado no Pré-Sal beneficiou os Estados não produtores.

Goiás estava na lista, mas recebe­ria poucos milhões. Uma ação políti­ca articulada por ele, narra Gim Arge­lo, ajudou o Estado a receber bilhões a mais do que o estabelecido.

Os recursos do petróleo fo­ram destinados para a Agetop e se transformaram nos programas “Rodovida”, nome fantasia utiliza­do por outros estados para des­crever ações na pavimentação as­fáltica dos municípios.

A malha rodoviária de Goiás es­tava destruída na época. Os recursos foram usados para abrir estradas e refor­mar as rodovias tradicio­nais do Estado.

Naqueles anos, bem diferente de hoje, a apro­vação do Governo de Goiás chegou a 60%–mo­tivados principalmente pela abundância inespe­rada de recursos públicos.

 

RADIOGRAFIA

 

FINANÇAS PÚBLICAS

Goiás tem dívida de cerca de R$ 20 bilhões para os cofres federais, além de uma das máquinas mais inchadas do Brasil.

Dívida de precatórios pode chegar a quase R% 1 bilhão

 

CENÁRIO ECONÔMICO DOS GOIANOS

Estado de Goiás apresenta pior cenário na indústria, agricultura e varejo. Safra goiana de cereais, leguminosas e oleaginosas caiu drasticamente.

Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física Regional diz que Goiás é o estado que mais sofreu perdas no ano: -3,6%

No ano, Goiás foi o estado com o maior recuo nas vendas no acumulado dos últimos 12 meses: -4,8%.

 

SERVIÇOS PÚBLICOS

Sob intervenção, hospital mais importante do estado não tem insumos necessários.

Goianos pagam um dos combustíveis mais caros do país

Parcelamento de pagamentos de servidores é sinal de que metástase chegou no núlco mais importante do estado: o funcionalismo público

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