Conflito entre Congresso e governo adia parecer sobre isenção do Imposto de Renda até R$ 5.000
Redação Diário da Manhã
Publicado em 26 de junho de 2025 às 06:16 | Atualizado há 4 horas
Raphael Di Cunto e Victória Azevedo – Folha Press
O clima beligerante entre o Congresso e o governo Lula (PT) levará ao adiamento no calendário do projeto de lei que isenta de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5.000 mensais, principal aposta do Palácio do Planalto para recuperar a popularidade do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para a eleição de 2026.
O relator do projeto, deputado Arthur Lira (PP-AL), tinha prometido apresentar a primeira versão do seu parecer nesta sexta-feira (27), mas afirmou a interlocutores que não há como divulgar a proposta em meio aos embates entre os parlamentares e o governo. Por enquanto, não há nova data para divulgar o texto.
Nesta quarta (25), a Câmara dos Deputados aprovou, por 383 votos a 98, projeto de decreto legislativo que susta o aumento do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) instituído pelo governo para fechar as contas deste ano e de 2026. A derrubada foi confirmada pelo Senado Federal logo em seguida, em votação simbólica (quando não há contabilização dos votos no painel).
A votação ocorreu com cobranças dos congressistas sobre uma demora no pagamento das emendas parlamentares de 2025 e de anos anteriores. Além disso, há insatisfação com ataques de integrantes do governo à falta de responsabilidade fiscal do Congresso e com a derrubada dos vetos presidenciais que aumentarão a conta de luz.
Há também questionamentos à agenda do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, de ajuste fiscal por meio de aumento das receitas e tributos. A cúpula da Câmara, liderada por Hugo Motta (Republicanos-PB), cobra medidas de corte de gastos e ameaça rejeitar a medida provisória editada para elevar impostos sobre bets, fintechs e grandes empresas.
Já do lado do governo, há um clima de desconfiança com Motta e a base aliada após a votação. Os petistas adotaram discurso de que as medidas buscam combater as injustiças sociais e que deputados e senadores, ao rejeitá-las, defendem os “moradores da cobertura” que não estão pagando impostos. O cenário de conflitos entre os dois Poderes torna improvável a votação do projeto do Imposto de Renda no curto prazo, afirmou Lira a interlocutores.
A intenção é aprovar a proposta, mas isso não ocorrerá enquanto o governo não resolver os problemas com a sua base aliada para não contaminar o debate.
Por isso, na visão do relator, não faz sentido apresentar o parecer agora e deixar a proposta sob ataques, sem previsão de que seja analisada pelo plenário. A divulgação do relatório só deve ocorrer quando o cenário estiver mais favorável para aprovação, tem afirmado.
O ex-presidente da Câmara vem repetindo que a proposta de isentar de Imposto de Renda quem ganha até R$ 5.000 tem amplo apoio no Legislativo, mas o problema é como bancá-la. A sugestão de Lula é criar um imposto mínimo de pessoas com ganhos a partir de R$ 600 mil anuais (o equivalente a R$ 50 mil mensais). A alíquota será progressiva, até atingir o patamar máximo de 10% para quem ganha a partir de R$ 1,2 milhão ao ano.
A medida tem como alvo 141,4 mil contribuintes pessoas físicas de alta renda que hoje recolhem, em média, uma alíquota efetiva de 2,5% sobre seus rendimentos. Trabalhadores em geral pagam, em média, 9% a 11% dos seus ganhos à Receita Federal. Essa proposta enfrenta resistência de partidos como o PP de Lira e de prefeitos, que acusam uma perda bilionária com a retenção do imposto de renda pago por seus servidores e que passaria a ficar isento. O partido do relator sugere outras alternativas, como aumentar a tributação de grandes bancos e elevar a R$ 150 mil o piso para taxação dos ricos.
O calendário de votar o projeto até o recesso parlamentar em meados de julho foi estabelecido, inclusive, com a perspectiva de que uma das compensações seria o aumento da taxação dos bancos -o que exigiria a aprovação pelo Legislativo até setembro, para que entrasse em vigor em janeiro. Essa alternativa, atualmente, teria menos apelo, o que permitiria um cronograma mais longo de discussão. O cenário mais provável hoje é mudar as alíquotas para altas rendas, com uma redução para zerar o impacto fiscal da medida.
Lira tem cobrado o governo sobre um suposto superávit de R$ 12,5 bilhões em dois anos com o imposto e dito que isso não será aceito pelo Congresso. A Fazenda rebate e diz que o dinheiro será usado para devolver aos contribuintes o imposto pago a mais na retenção de investimentos e com a isenção. Ele também reclama que a Receita Federal estaria dificultando a divulgação de informações demandadas pela Câmara -na visão dele, para fazer prevalecer a tese de Haddad para taxação dos rendimentos acima de R$ 50 mil. Por isso, as negociações mais diretas são conduzidas com o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto.
Governistas, por outro lado, afirmam que o adiamento do calendário do projeto do Imposto de Renda é uma forma de Lira manter um trunfo contra o Palácio do Planalto, para continuar a pressionar pelo pagamento de emendas e por compromissos assumidos com ele, e mantém a expectativa de que a proposta seja votada pelo menos na comissão da Câmara até o recesso.