Distorção e silêncio de Tarcísio sobre golpismo de Bolsonaro irão à prova no STF
DM Online
Publicado em 29 de maio de 2025 às 14:10 | Atualizado há 18 horas
Testemunha de defesa de Jair Bolsonaro (PL) no processo sobre a trama golpista, Tarcísio de Freitas (Republicanos) irá depor nesta sexta-feira (30) ao STF (Supremo Tribunal Federal).
O governador bolsonarista será colocado à prova, já que tem repetido a aliados que nunca ouviu o ex-presidente falar em golpe, enquanto distorce e omite fatos ocorridos no período e estava ao lado de Bolsonaro em alguns dos momentos mais agudos de ataques antidemocráticos às instituições.
Tarcísio já afirmou não ter identificado intenção golpista nos ataques de Bolsonaro às urnas eletrônicas, manteve-se em silêncio ao lado do aliado durante parte dessas manifestações e minimizou agressões verbais do ex-presidente ao STF.
Por outro lado, cotado para a disputa presidencial do ano que vem, o governador tenta se equilibrar entre uma relação cordial com ministros do tribunal e a base bolsonarista.
Ao depor na manhã desta sexta-feira, Tarcísio será colocado à prova sobre:
1) sua fidelidade a Bolsonaro, inelegível ao menos até 2030 e réu no processo da trama golpista no qual pode ser condenado a mais de 40 anos de prisão;
2) o silêncio que manteve enquanto ministro do governo federal diante de declarações golpistas do então presidente;
3) distorções que tem exposto para defender Bolsonaro diante de posicionamentos recentes de STF, Polícia Federal e PGR (Procuradoria-Geral da República).
Esse terceiro ponto chama a atenção em razão da impaciência do ministro Alexandre de Moraes diante de algumas testemunhas em depoimentos recentes.
Isso ficou evidente com a insinuação de que o general Marco Antônio Freire Gomes, ex-comandante do Exército, mentia em juízo e chegou ao ápice quando Moraes ameaçou prender o ex-ministro da Defesa Aldo Rebelo por desacato.
Ao defender Bolsonaro diante das investigações da Polícia Federal, Tarcísio já disse que “o presidente respeitou o resultado da eleição”, o que nunca ocorreu, e que a posse de Lula “aconteceu em plena normalidade e respeito à democracia”, o que também é outra distorção diante dos fatos.
Na Presidência, Bolsonaro acumulou uma série de declarações golpistas às claras, provocou crises entre os Poderes, colocou em xeque a realização das eleições de 2022, ameaçou não cumprir decisões do STF e estimulou com mentiras e ilações uma campanha para desacreditar o sistema eleitoral do país.
Após a derrota para Lula, incentivou a criação e a manutenção dos acampamentos golpistas que se alastraram pelo país e deram origem aos ataques do 8 de Janeiro.
Nesse mesmo período, adotou conduta que contribuiu para manter seus apoiadores esperançosos de que permaneceria no poder e, como ele mesmo admitiu publicamente, reuniu-se com militares e assessores próximos para discutir formas de intervir no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e anular as eleições.
A defesa de Bolsonaro nega a participação do ex-presidente nos crimes e argumenta, entre críticas à denúncia da PGR, que não há provas de ligação entre a suposta conspiração iniciada no Palácio do Planalto, em junho de 2021, e os atos de vandalismo de 8 de janeiro de 2023.
Enquanto foi ministro da Infraestrutura, de janeiro de 2019 a março de 2022, Tarcísio frequentava o Planalto. A expectativa de aliados é que ele afirme em depoimento que nunca presenciou conversas sobre golpe de Estado.
Após o indiciamento de Bolsonaro pela PF, no ano passado, o governador publicou nas redes sociais que as acusações contra o ex-presidente integravam “uma narrativa que carece de provas”.
Como ministro, Tarcísio era presença constante nas lives semanais transmitidas por Bolsonaro. Em 26 de agosto de 2021, eles estavam juntos quando o então presidente convocou manifestações em Brasília e em São Paulo para o 7 de Setembro, ocasião em que atacou as urnas e o STF.
O objetivo de Bolsonaro, segundo ele próprio, era pressionar por “eleições limpas”, em defesa do voto impresso. “Não podemos ter eleições sob suspeição. Não podemos”, disse o ex-presidente na transmissão, com Tarcísio sentado em silêncio à sua direita.
“Não pode uma ou duas pessoas, no máximo, estar impondo normas no Brasil, estar impondo uma ditadura no Brasil. Não podemos admitir isso”, afirmou Bolsonaro, numa indireta a Moraes.
No 7 de Setembro, Tarcísio permaneceu ao lado de Bolsonaro no palanque em Brasília e o acompanhou até São Paulo, onde registrou a ida como viagem a trabalho. Durante discurso na avenida Paulista, Bolsonaro intensificou os ataques ao Supremo, pregou desobediência a Moraes e o chamou de “canalha”.
Em maio de 2022, já em pré-campanha ao governo paulista, Tarcísio minimizou o episódio. “No final das contas, nada disso aconteceu. Houve uma situação de acirramento de ânimos e, logo depois, um gesto. Considero que essa questão do 7 de Setembro está superada”, disse.
Mais tarde, durante sabatina Folha/UOL, afirmou que os ataques de Bolsonaro ao STF eram reações defensivas. “Muitas vezes ele se defende, e aí a defesa é considerada um ataque”, disse, acrescentando que “acirramentos na democracia são comuns”.
Agora como governador, Tarcísio busca suavizar a relação entre bolsonaristas e ministros do STF, especialmente com Moraes, principal alvo do grupo.
Os dois já estiveram juntos em diversos eventos e, segundo aliados, mantêm boa relação. Em fevereiro de 2024, na posse do novo presidente do TRE-SP, o governador elogiou publicamente a Justiça Eleitoral alvo frequente de Bolsonaro e seus apoiadores.
“Não vejo por que essa corrente está na mira da Polícia Federal”, declarou Tarcísio na semana anterior ao encontro com Moraes. O ministro é relator da ação na qual o governador foi arrolado como testemunha de defesa de Bolsonaro.
Quando o passaporte do ex-presidente foi apreendido, também em fevereiro de 2024, Tarcísio afirmou não enxergar base para responsabilizá-lo por tentativa de golpe. “Não consigo ver e não é só opinião minha, há muitos juristas divididos nada que traga uma responsabilização para ele. Acho que estão criando muita coisa. Com o tempo, tudo vai ser esclarecido.”
Já no fim de março deste ano, em evento com presidentes dos Tribunais Regionais Eleitorais na sede do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo), Tarcísio declarou que, com as urnas eletrônicas, “o Brasil se tornou de fato uma grande referência”. A fala causou irritação entre seus aliados bolsonaristas.