Lula avalia veto a trecho de projeto que pode reduzir transparência sobre salários no Judiciário
DM Redação
Publicado em 4 de maio de 2025 às 08:40 | Atualizado há 23 horas
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) analisa a possibilidade de vetar trechos do Projeto de Lei 4.015/2023, aprovado em abril pelo Senado, que têm sido alvo de críticas por supostamente comprometerem a transparência na divulgação de salários de membros do Judiciário e do Ministério Público. Entidades civis especializadas em fiscalização da administração pública alertam para o risco de retrocesso na publicidade de dados remuneratórios.
O projeto original reconhece como atividade de risco permanente as funções exercidas por agentes públicos do sistema de Justiça e estabelece punições mais severas para crimes cometidos contra esses profissionais. No entanto, dois artigos acrescentados posteriormente – prática legislativa conhecida como “jabuti” – propõem alterações na Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), o que, segundo especialistas, pode dificultar o acesso público a informações sobre remunerações.
De acordo com o texto aprovado, o tratamento de dados pessoais de integrantes do Poder Judiciário, do Ministério Público, da Defensoria Pública e de oficiais de Justiça deve considerar “o risco inerente ao desempenho de suas atribuições”. A proposta também determina que “qualquer vazamento ou acesso não autorizado” seja tratado com urgência.
“Quando se insere essa proposta na própria LGPD, sem definir, de fato, o que seria esse risco ou em que consiste um vazamento, escancara-se uma grande porta para que sejam retirados do ar os dados de remuneração”, afirmou Marina Atoji, diretora de programas da ONG Transparência Brasil.
A organização é uma das 12 entidades que assinaram ofício enviado à Presidência da República pedindo o veto dos dispositivos que alteram a LGPD. O prazo para sanção presidencial se encerra na próxima quinta-feira (8). Caso não haja manifestação até essa data, o projeto será sancionado tacitamente, ou seja, transformado em lei na íntegra de forma automática.
As entidades signatárias do ofício destacam que a proposta pode abrir espaço para o uso indevido da LGPD em meio a críticas sobre os chamados supersalários no Judiciário. Reportagem da Folha de S.Paulo revelou que, em 2024, a remuneração média de magistrados do Tribunal de Justiça de São Paulo alcançou R$ 75 mil mensais, valor acima do teto constitucional de R$ 37,6 mil, em razão de adicionais e benefícios extras.
Em resposta, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) negou que o projeto contenha qualquer tentativa de limitar o controle social sobre os vencimentos dos magistrados. A entidade argumenta que a proposta visa proteger dados sensíveis, que, segundo afirma, não devem ser divulgados sem critérios adequados.
A presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Katia Brembatti, considera que a possível aprovação representa um retrocesso em relação à transparência conquistada com a criação dos portais públicos de acesso à informação.
“A afirmação de ameaça à segurança também era usada antes, e nada disso se confirmou. Isso serviu como uma espécie de barreira por muitos anos. A partir dos portais de transparência, foram feitas centenas de reportagens, além das ações de órgãos de controle. Esse jabuti é uma involução, é voltar aos mesmos argumentos de antes”, declarou.
Segundo as organizações, o governo federal ainda não respondeu oficialmente ao pedido de veto. Entretanto, a Controladoria-Geral da União (CGU) emitiu nesta semana uma nota técnica recomendando à Casa Civil que vete os artigos que alteram a LGPD. A Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) já havia se posicionado contrariamente ao dispositivo durante a tramitação do projeto.
Procuradas pela reportagem, a CGU e a Casa Civil não comentaram a nota técnica nem o possível veto presidencial.
O ofício em favor do veto foi assinado pelas seguintes entidades: Associação Fiquem Sabendo, Open Knowledge Brasil, Transparência Brasil, Abraji, Fórum de Direito de Acesso a Informações Públicas, Plataforma Justa, República.org, Movimento Pessoas à Frente, Associação Livres, Centro de Liderança Pública (CLP), Transparência Internacional Brasil e Instituto OPS.