Novo CPC tem limites para ser usado
Redação DM
Publicado em 21 de julho de 2016 às 02:07 | Atualizado há 5 mesesDesembargadora nega eficácia de nova lei processual sobre fatos acontecidos antes da entrada em vigor
A desembargadora Sandra Regina Teodoro Reis proferiu votos em recursos e agravos de instrumentos na esfera cível do Tribunal de Justiça de Goiás disciplinando a aplicação do Novo Código de Processo Civil (NCPC) e delimitando suas aplicações em demandas em andamento. O conflito já era previsto de acontecer em virtude de interpretações distintas por advogados e magistrados de primeira instância e as dúvidas só serão dirimidas em instâncias superiores.
Em um caso concreto o conflito surgiu quando um cliente do Banco Santander propôs uma ação revisional para contestar os juros que o banco lhe cobrava por um contrato de financiamento. Ele alegava também que havia pago mais do que devia e que o banco sempre lhe cobrava juros abusivos. Sem poder provar com documentos que estava sendo lesado o autor pediu a inversão do ônus da prova, ou que o banco fosse obrigado a apresentar extratos bancários e o contrato com as cláusulas abusivas.
A juíza de Anápolis, onde a ação foi proposta negou seguimento da ação sob o fundamento de que ele não juntou documentos e que a petição seria inepta, ou sem efeito prático para a Justiça. A ação foi arquivada sem que o mérito fosse apreciado pela juíza. Isso com base no Novo Código de Processo Civil, cuja redação impõe produção antecipada de provas e indicação de cláusulas que considera abusiva nos contratos a serem julgados.
“O Novo Código de Processo Civil e a Constituição Federal impõem a aplicação do princípio ‘tempus regit actum’, ou o tempo rege o ato. Com isto o novo regramento processual incide sobre os feitos na fase em que se encontram, resguardando-se, entretanto, os atos já praticados, razões pelas quais decido o recurso sob a égide do CPC de 1973”, explicou a desembargadora. Com esse entendimento, a ação proposta pelo cliente do banco deve seguir rumo normal e ser apreciado pela magistrada, inclusive no seu mérito.
Em outro julgamento o mesmo princípio de anterioridade da norma de processo foi considerado válido, porque deve ser regido pelo tempo em que o ato foi praticado. Na comarca de Sanclerlândia uma mulher foi à Justiça contra uma penhora online que bloqueou valores em sua conta bancária por causa de dívida contraída por seu marido junto a uma empresa fornecedora de sementes para pastagens.
O juiz daquela comarca negou pedido da mulher para que fosse desconstituída a penhora de recursos em sua conta corrente e fosse suspensa a execução da sentença na fase em que se encontra para sanar vícios. A autora a ação mostrou que é casada em regime de comunhão universal de bens com o homem que contraiu a dívida e que quando o contrato foi firmado com a firma de sementes de pastagem ela não foi consultada e não deu sua anuência para a celebração desse contrato e com a dívida oriunda desse pacto e que “era imprescindível para a validade da fiança prestada por seu cônjuge”. Ainda que a quantia bloqueada por penhora online seja pequena o mesmo precedente pode ser usado para alcançar patrimônio mais valioso, além do que, por ela não ter autorizado o contrato de fiança o mesmo é nulo.
Disciplina
A decisão da desembargadora concedeu liminar para que a autora da ação tenha liberado os valores bloqueados em sua conta e impede que qualquer novo ato da empresa credora promova bloqueio em qualquer patrimônio dela a té que os embargos de terceiro sejam julgados em seu mérito.
SAIBA MAIS
O Novo Código de Processo Civil foi sancionado pela presidenta Dilma Rousseff em 2015 e entrou em vigor em 17 de março desse ano. Ele traz como pontos altos inovações como o incentivo à conciliação e simplifica as relações processuais entre as partes, visando dar mais rapidez às demandas judiciais. “O espírito do novo código valoriza como nunca a conciliação, a busca do entendimento, o esforço pelo consenso, como formas de resolver pacífica e naturalmente os litígios co soluções negociadas, que satisfaçam da melhor maneira possível as partes envolvidas”, disse Dilma quando da sanção do NCPC. A jurisprudência também é outro ponto forte da nova lei: as decisões tomadas pelos tribunais superiores terão de ser seguidas em instâncias inferiores.
O novo Código de Processo Civil foi sugerido por uma comissão de juristas em 2009 e aprovado pelo Senado no final de 2010. O texto ficou três anos na Câmara, quando foi objeto de mais de 100 audiências públicas e de discussões nos estados. Uma nova versão do CPC foi aprovada pela Câmara em março de 2014 e é o primeiro código de processo civil aprovado durante um regime democrático. O que estava em vigor havia sido implantado durante a ditadura militar instalada em 1964 e o anterior a esse remontava a 1939, período também ditatorial conhecido como “Estado Novo”, durante a Era Vargas.