Tribunais de Contas aproveitam crise para buscar aprimoramento
Redação
Publicado em 23 de novembro de 2017 às 02:45 | Atualizado há 7 anos
Com o tema “Controle Externo, aprimoramento na adversidade”, teve início ontem o 29º Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil, que segue até amanhã. A abertura do encontro, que conta com a participação de 27 tribunais e mais de 500 membros e técnicos, teve presença do vice-governador José Eliton, dos presidentes do TCE-GO, Kennedy Trindade, do TCM-GO, Joaquim de Castro, da Associação dos Tribunais de Contas do Brasil (Atricon), Valdecir Paschoal e outras autoridades.
Ao saudar os presentes, o presidente Kennedy Trindade destacou a oportunidade de compartilhar boas práticas “para alcançar melhor preparo e contribuição efetiva para a melhoria da administração pública em nosso País”. O presidente do TCE-GO referiu-se à crise brasileira como “um prolongado e doloroso inverno. À nossa volta, a mais severa crise econômica da história recente” e suas consequências, como o recrudescimento da violência e escândalos em série que minam a credibilidade das instituições. Diante deste quadro, Kennedy Trindade classificou o tema do evento como instigante e desafiador e cumprimentou a Atricon “pela sensibilidade e coragem de enxergar oportunidade onde tantos só conseguem ver desolação”.
Na mesma linha de pensamento, pronunciaram-se o superintendente do Sebrae-GO, Igor Montenegro, e o ministro-substituto do TCU Marcos Bemquerer. Este último também destacou o centenário da criação dos cargos de ministros e auditores substitutos, a ser comemorado em 2018. Sebastião Helvécio, presidente do Instituto Rui Barbosa, ensejou a necessidade de aprovação das PECs em tramitação no Congresso, visando o fortalecimento do Sistema Nacional de Contas.
Representando o governador Marconi Perillo, o vice-governador José Eliton saudou iniciativas quem buscam soluções para fugir da crise. Por último, o presidente da Atricon, Valdecir Pascoal, criticou recentes decisões do Supremo Tribunal Federal que fragilizaram a atuação do controle externo, como a extinção do TCM do Ceará.
ESCRITOR
Com uma mensagem de preocupação, mas de confiança no futuro do Brasil, o escritor moçambicano Mia Couto proferiu a conferência de abertura do 29º Congresso dos Tribunais de Contas do Brasil, que está sendo realizado na sede do TCE-GO, em Goiânia. Considerado um dos mais influentes escritores de língua portuguesa, Mia citou o símbolo do evento, o ipê, como uma metáfora da própria vida, por sua resistência às adversidades.
Ele elogiou a escolha de um escritor para falar no evento. “Os tribunais de contas já conhecem os seus desafios e os caminhos a trilhar e para isso promovem encontros como este, reforçando o debate interno. E fazem bem ao buscar caminhos ainda mais produtivos, saindo de suas paredes ao incluir na discussão pessoas como eu, que aparentemente não tem nada a ver com o controle. É um investimento para superar a adversidade”.
O moçambicano disse sentir-se brasileiro, dizendo que sua infância foi povoada pelas canções e poemas do país, citando autores nacionais diversos, inclusive a goiana Cora Coralina. Ele ressaltou a influência do Brasil e do que acontece no país para a construção de diferentes identidades ao redor do mundo. “O brasileiro não se dá conta dessa liderança e, com isso desconhece o que se passa nesses países irmãos, inclusive nos da África. Não sabe sequer a África que tem dentro de si”, disse.
Politizado, Mia fez questão de destacar as enormes desigualdades sociais, dificuldades econômicas e discriminação racial e social vivenciadas na atualidade. “Apesar de tudo, o Brasil produz em mim um poder de sedução que só tem uma explicação: os brasileiros”. Para ele, o brasileiro é um ser solidário, com aptidão para construir diálogos, capacidade de transformar tudo em humor e de produzir histórias de vida.
Mia confessou que tem medo quanto ao que está acontecendo no Brasildiantedacriseeconômicaepolítica, citandocomopiorconsequência a divisão das pessoas em polos distintos. “O que era diverso passou a ser antagônico, o que era conversa passou a ser divergência”, constatou.
Sobre a corrupção, ele analisa que “quando ninguém é inocente, deixa-se de ver irregularidades, deixa-se de ver crimes e banaliza-se a corrupção”. Quanto às investigações que estão ocorrendo, o escritor não poupa críticas: “o que era para ser um processo legal virou um espetáculo”.
Mia alertou para o perigo do discurso de que há uma crise apocalíptica, irremediável. “Esse é um caminho para quem incentiva o surgimento de um ‘salvador’ e que preconiza um regime de exceção para dispensar a democracia”.
Mia Couto é o pseudônimo de António Emílio Leite Couto, um dos principais autores de língua portuguesa da atualidade, vencedor de diversos prêmios literários, incluindo o Camões e o Neustadt, considerado o Nobel americano.
O Congresso segue até amanhã, com uma extensa programação técnica e palestra com o historiador Leandro Karnal, na manhã do último dia.