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OPINIÃO

Dança de rua: cultura de resistência

Quando os músicos e dançarinos (negros) que trabalhavam nos cabarés das metrópoles norte-americanas ficaram desempregados e reagiram à crise econômica dos Estados Unidos da América, em 1929, indo para as ruas fazer seus shows; lembrando o primeiro curso de “Dança de Rua”, em Santos-SP (1991), originados da arte jamaicana, hipótese que adoto como mais correta na historiografia do assunto, o Hip Hop, também chamado “Dança de Rua”, no Brasil, é mais um movimento de rebeldia contra as escravidões contemporâneas, oportuna manifestação cultural de resistência do povo negro em nosso País e na diáspora, contra especialmente o racismo e o que lhe é mais característico: a violência e as desigualdades que  dele decorrem, como sejam: racial, econômica, política, cultural e outras.

Há dois tipos de danças de ruas: a vinculada ao Hip Hop e a vinculada às academias e estudos de dança, o famoso street dance, urbanizado e caracterizado como trabalho de coordenação motora com ritmo e musicalidade; ritmo, onde se dá mais atenção aos movimentos fortes e enérgicos executados pelos braços, pernas, acrobacias coreográficas, saltos e saltos mortais; dança com maioria de dançarinos homens, já com espaço para as mulheres; e o uso de músicas que tenham batidas fortes e marcantes, algumas eletrônicas, limitando-se as coreografias.

A Dança de  Rua vinculada ao movimento Hip Hop (Hip do inglês – quadril; Hop – pulo) toma sentido político mais visível em início de sua formação, na periferia das cidades onde nasceu como movimento de resistência incrivelmente renegado e, portanto, discriminado, de onde só recentemente ousa sair para o centro das cidades, local no qual já se populariza, inclusive perante os que não o “enxergavam”. Hoje lota boates e outros “atrativos” bem localizados, sobretudo das grandes cidades, justificando se poder afirmar que a “Dança de Rua” se encontra em plena expansão, no Brasil e pelo mundo afora, nela já participando outros segmentos étnicos, pouco importando a cor da pele. Deixou, pois, de ser somente música popular dos guetos, tantas vezes confundida com mera pichação, iniciativa de “desocupados”.

Forma de expressão e denúncia, a cultura hip hop, para chegar ao interessante  nível em que se encontra, passou por muito sofrimento e incríveis dificuldades, impondo a prática de diversas estratégias políticas, dentre outras, a formação e junção dos seguintes elementos: o rap, significando ritmo e poesia, como expressão-verbal da cultura; o grafite, representando a arte plástica, expressa por desenhos coloridos feitos por grafiteiros, nas ruas das cidades espalhadas pelo mundo; e o break dance, representando a dança, assim se juntando os três elementos que compõem a cultura hip hop, termo que alguns dizem ter sido criado em meados de 1968 por Afrika Bambaataa, considerado hoje padrinho dessa cultura hip hop, inspirado em dois movimentos cíclicos, ou seja, um deles estava na forma pela qual se transmitia a cultura dos guetos americanos, a outra estava justamente na forma de dançar popular na época, que era saltar (hop) movimentando os quadris (hip), não se podendo esquecer, em  hipótese alguma, que aos elementos descritos juntaram-se outros, formando um verdadeiro glossário de termos dessa intrigante cultura, dentre outros, o MC, significando, o cérebro; e o DJ, a alma, essência e raiz.

Quer dizer: toda a secular violência sofrida pelos negros, em todos os lugares, inclusive da globalização neoliberal, recebeu como resposta diferentes manifestações artísticas, ditas “de rua”, representadas pelos passos da dança que faz pensar, a magia da música que comove, a força política da poesia que liberta e o sagrado ofício da pintura que encanta e dignifica a vida. Os negros têm consciência da passagem do tempo: resistem, competem e combatem o racismo fazendo Arte.

(Martiniano J. Silva é escritor, advogado, membro do Movimento Negro  Unificado (MNU), da Academia Goiana de Letras e Mineirense de Letras e Artes, do Instituto Histórico e Geográfico de Goiás e União Brasileira de Escritores de Goiás. É mestre em História Social pela UFG.  ([email protected]))

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